1. O ENA 2015 foi um sucesso (veja cobertura nesta edição), mas merece destaque o painel das agências, no qual quatro presidentes fizeram suas apresentações: Gal Barradas (BETC), Sergio Amado (Ogilvy), Hugo Rodrigues (Publicis) e José Eustachio (Talent).
Com discursos diferentes nas palavras, mas procurando atingir o mesmo sentido, discorreram sobre a necessidade de uma maior integração entre anunciantes e agências, o que já foi um ponto forte nessa relação, tendo porém se distanciado desse ideal de uns tempos a esta parte.
As mudanças ocorridas na atividade como um todo contribuíram para o estressamento de alguns conflitos, e o que hoje se percebe é o desejo de uma retomada para melhor entendimento entre partes que não são e não devem ser antagônicas, mas sim parceiras de um grandioso processo nas diversas etapas do marketing, que é a realização efetiva da comunicação de quem fabrica ou presta serviços, com quem revende ou, mais ainda, com quem consome.
Interessante nesse painel foi o cuidado com que os palestrantes abordaram o tema, sem, porém, fugirem do assunto. Ao contrário, procuraram defender suas razões e lembrar que as agências são contratadas pelos anunciantes para ajudá-los nessa difícil tarefa de melhor compreender os mercados em que atuam, não devendo se limitar apenas à criação de mensagens publicitárias através das mais variadas formas de plataformas existentes.
Para quem faz jornal há 50 anos como nós, encantou sobremodo o viés com que Sergio Amado se manifestou, chamando a atenção dos anunciantes para a sua condição de cassado pela ditadura militar, o que o fez lutar ainda mais pela volta das franquias democráticas ao Brasil.
A partir desse fato, Amado lembrou a necessidade de os anunciantes entenderem que as suas verbas não objetivam apenas pagar pelos serviços de comunicação comercial de todos os envolvidos nesse processo. Está implícita – e essa é uma verdade irrefutável, mas pouco percebida nos dias que correm – a defesa não apenas do negócio de cada um, mas também de um todo chamado livre iniciativa, sem o qual tudo se transformará para pior, como a própria História é testemunha.
Amado foi aplaudido em pé por algumas centenas dos muitos representantes de anunciantes presentes ao ENA.
2. Quem acompanhou e prossegue acompanhando pela mídia as manifestações ocorridas no encontro do PT em Salvador neste fim de semana, entende cada vez menos como é possível a uma legenda que se iniciou progressista, propondo-se como plataforma principal a luta contra a ditadura militar e seu pensamento retrógrado, andar tão velozmente para trás ao encontro dos ideais e práticas de 1917, que tiveram todo o tempo do mundo para maturar, acabando, porém, em naufrágio diante dos avanços democráticos que o planeta também passou a experimentar no mesmo século e de forma mais acentuada a partir da derrocada nazista em 1945.
Há muito atraso nos “avanços” alardeados em Salvador, que se repetem sem fim, sem apresentar nenhuma novidade. Aliás, uma destas – perdoe-nos o leitor a ironia – foi a defesa da volta da CPMF, que todo brasileiro não suporta sequer ouvir falar.
Se governar é “distribuir” tributos, sob o disfarce (ou desfaçatez) de que contribuirão lá adiante para a chegada da felicidade geral, basta examinarmos a nossa própria história econômica, sem a necessidade de rebuscarmos histórias de outros países, deparando-nos ao fim e ao cabo com a última página dessas grosseiras mistificações.
O balanço final é sempre o mesmo: pobres mais pobres e em maior número e ricos mais ricos em qualquer número que se queira imaginar.
3. O fim da atual crise é uma incógnita: os mais otimistas acham que estamos próximos dele, os mais ou menos, que ainda vai durar um pouco mais e os pessimistas chegam a falar que só em 2017 (!) respiraremos melhor.
Enquanto isso, na atividade publicitária, vê-se um esforço ingente das agências e da mídia geral, em busca de anunciantes “submersos”, que deixaram essa condição lá atrás e estão sendo convidados a voltar, provavelmente em condições mais vantajosas que antes do início deste seco temporal que se abateu sobre o país.
Repare o leitor como a mídia tradicional, tanto em print como a eletrônica, tem trazido à tona empresas que muitos imaginavam extintas…
4. Tornando mais palatável todo o amargo texto acima, simplesmente uma fotografia da realidade brasileira atual, onde o que mais se ouve e vê é o que não faz sentido algum, salva de palmas para a exposição do Masp iniciada na última sexta (12), contendo 102 desenhos feitos por pacientes do Hospital Psiquiátrico do Juquery e que fazem parte da coleção do Museu desde 1974, por doação do Dr. Osório César.
Interessante observar, entre outros tantos atributos, o grau de criatividade nos trabalhos expostos, levando-nos a crer que muitos dos seus autores estiveram indevidamente confinados nas colônias do Juquery, enquanto doidos varridos prosseguiam aqui fora ocupando altos cargos em busca de um país pior.
Do ponto de vista institucional, até que conseguiram. A nação brasileira tem 202 milhões de habitantes, situando-se entre a sétima e a oitava economia do mundo (há divergências), mas na rabeira da humanidade quanto aos itens mais necessários à nossa própria sobrevivência.
Com certa frequência, o Brasil dá-nos a impressão de realmente darmos um passo à frente e dois atrás.
5. No mundo da publicidade, uma notícia reveladora da nossa contradição: o Brasil manteve a posição (que tem sido tradicional nos últimos anos) de segundo país com maior número de inscrições no Cannes Lions, só abaixo dos Estados Unidos.
Quem cobre e frequenta a propaganda brasileira como nós, só tem ouvido queixas nos últimos tempos, com cortes de verbas generalizados pelos anunciantes, retração das programações de mídia, incansáveis negociações sobre preços e prazos e assim por diante, revelando no conjunto uma situação de enormes dificuldades decorrentes de uma economia já recessiva, embora não admitida oficialmente (lembre-se o leitor do que já nos diziam avós e pais: o Brasil é o país do faz de conta).
Diante desse quadro nada favorável da comunicação do marketing, causa no mínimo surpresa o segundo lugar em inscrições em Cannes.
Pode ser que a razão seja otimista: vitórias em Cannes costumam significar novos e bons negócios.
Não deixa de ser verdade, corroborada pelos fatos.
6. Nizan Guanaes, que na sua coluna quinzenal (terça sim, terça não) na Folha, tem sido um incorrigível otimista em relação ao nosso país, fará palestra nesta segunda (15), à tarde, no Palácio das Convenções do Anhembi (Auditório 9).
Ele abordará o tema “O destino São Paulo por cima da crise”.
A conferir.
*Diretor-presidente da Editora Referência, que edita o jornal propmark e as revistas Propaganda e Marketing