Managing director da Comscore para o mercado brasileiro, o executivo Eduardo Carneiro explica que a empresa tem como core business a medição de audiência digital. Mensalmente, 1,9 bilhão de interações nas redes sociais e sites em 70 países são analisadas. Nas suas palavras, o negócio é moeda corrente para compra e venda de mídia baseada “em metodologia única e global” que consegue observar e comparar tendências. Criada em 1999 e com capital aberto desde 2006, a Comscore tem faturamento de US$ 400 milhões. Confira a seguir a entrevista.
Poderia explicar as tecnologias que dão suporte ao serviço da Comscore?
Temos ferramentas para a validação da qualidade de entrega de campanhas de mídia; representamos soluções de social media e temos estudos adhoc (jornada de compra, branded content, brand lift etc.).
Há similaridade entre a apuração digital e a analógica?
Sim, especialmente quando a comparação é com TV. Usamos painéis com usuários que formam uma amostra à qual conhecemos muito bem e cujo número é extrapolado para a população brasileira. Temos meeters instados em desktops e laptops de um universo de 50 mil painelistas no Brasil. Para smartphones e tablets são 16 mil painelistas. Esses dois painéis a Comscore chama de Audiência Total Deduplicada, que significa que a interação foi feita em dois modais. Isso é importante para que seja contabilizado apenas um acesso. Essa é a diferença com analytics, que olha da porteira para dentro. A Comscore olha para fora. Além do painel, temos como instrumentos complementares tags e SDKs (Software Develepment Kit) que, quando instaladas nos sites e aplicativos, garantem a audiência que está sendo capturada da melhor forma possível e, muitas vezes, calibram o número do painel. E por mais que o painel seja estatiscamente muito seguro, em alguns eventos ele pode não representar a variável de queda ou de elevação da audiência.
A Comscore vai migrar para além da oferta dos números?
Existe a necessidade do mercado de uma entrega mais consultiva. A necessidade muda e o dado por si só já precisa ser combinado com análises para gerar insights capazes de explicar melhor as tendências de audiência.
E como o Brasil é visto no universo da Comscore?
É muito relevante e representa mais de 50% dos negócios realizados na América Latina. As grandes empresas globais têm sede na região. O crescimento da audiência é natural com a plataforma mobile.
E o movimento mobile only?
Cresce. São pessoas que migraram do desktop para utilizar 100% do mundo digital por meio de smartphones e tablets. Ou são pessoas que não tinham acesso à internet por nenhum mecanismo. Portanto, são completamente nativas do mobile. Ou mobile only.
Com esse cenário, a amostra mobile pode ser ampliada?
Ela vem crescendo, mas há indicação de estabilização. Porque o crescimento mobile é natural e reflete a maturidade do país. A Alemanha já tem essa linha estável há alguns anos. Então, não há crescimento da audiência. Quando a comparação é feita com a Índia e Indonésia, que o mundo mobile está transformando esses países, a linha deles é mais alta. A linha brasileira está se aproximando da maturidade, o que nos leva a crer que há queda constante de usuários de desktops e laptops. Estatisticamente, a amostra de 16 mil pessoas no mobile é segura e não precisa crescer. A amostra de desktops e laptops é maior porque ela permite, por enquanto, ter maior profundidade de dados do que no mobile.
O que é mais relevante?
Ainda é a mídia: agências de publicidade e publishers. Em 2019 houve crescimento em anunciantes, vertical que não era forte na empresa. Eles estão interessados nos dados da Comscore para acompanhar a movimentação da concorrência e tirar insights para os seus esforços digitais. Mídia continua sendo muito importante, mas há novas áreas buscando os serviços da Comscore. Aqui no Brasil nem tanto, mas nos Estados Unidos os analistas de mercado dos bancos são usuários dos dados capturados pelo sistema da empresa. Porque a Comscore direciona o mercado. Esses agentes têm interesse em fornecedores com metodologias transparentes de mensuração.
Qual é o aproveitamento dos anunciantes?
Em marketing intelligence, sobretudo na visualização do comportamento digital dos concorrentes. Por exemplo, observar quem investe mais em mobile em comparação com seus esforços. Ou fazer benchmark com números dos Estados Unidos para compreender como no seu mercado está se direcionando as tendências. Também poder usar essa informação para fazer planejamento de mídia. E, dependendo do perfil do cliente, como aqueles que produzem conteúdo dentro de casa, entender melhor os interesses da sua audiência e a dos seus rivais de negócios. Além de produzir conteúdos mais adequados para esses perfis; analisar intenção de compra; e canais que são tradicionalmente ligados à mídia, mas que agregam valor comportamental, inovação e desenvolvimento de produto.
Como é feita a atualização da população digital do país?
Por meio de duas pesquisas anuais. Temos variados tipos de uso dos dados. Estamos vendendo dados crus do painel da Comscore. Isso significa que o cliente não precisa comprar o acesso à plataforma para ter acesso às informações. Se alguém está montando um sistema interno de compreensão de audiência com determinada particularidade, fora do padrão do mercado, ele pode adquirir o dado cru para gerar outro tipo de dado.
Essa ferramenta é proprietária?
Sim. É o Return Level Data, que é a capacidade de abertura do painel da Comscore. Ou o cofre onde são guardados todos os segredos da empresa. Com isso, a marca pode escolher qual dado é mais pertinente à sua demanda. O dado que a Comscore trabalha é o processado, que é o mais forte. Mas, ao abrir o cofre e permitir que outros mergulhem de cabeça nesse arsenal, que é algo que ninguém está habilitado a fazer no mercado, geramos diferenciação. São poucos clientes potenciais para o Return Level Data, mas que dão valor tremendo. O dado cru faz parte do escopo de interesse das agências e publishers. Os anunciantes ainda não estão preparados para algo tão grande. Mas eles estão contratando cientistas de dados para terem esses skils internamente para controlar essa informação.
Como é essa pescaria?
Convidamos pessoas para participar do painel da Comscore. Mas elas podem fazer opt- -out no seu momento. Se quiserem participar, ativam o meeter. Na verdade, não estamos olhando dados delicados da amostra, mas as suas visitas, seções, mídias entregues e o tempo dedicado à navegação. O painelista tem seu comportamento analisado durante três meses versus o questionário que respondeu. O sistema pode analisar os perfis de até cinco pessoas que usam um computador e separar o perfil de uso de cada uma delas. Normalmente o painelista fica por um ou dois anos. E, se começa a mudar muito o perfil, é substituído por outro usuário.
Qual é programa de redirecionamento em andamento?
Já está implantada nos Estados Unidos e estamos trazendo para o Brasil a integração de plataformas de DSP à compra programática com os dados da Comscore. Também estamos trabalhando em novas plataformas. Quando se fala em streaming – e não tem assunto mais quente no momento -, é necessário medir as TVs e telas conectadas. O OTT permite que a audiência assista à programação em mobile, tablet etc. Outra novidade é como mensurar o valor de branded content criado pelas agências e anunciantes.
A Comscore usa cookies?
Não. Esse é um ponto superdelicado e a empresa, por ter insistido na metodologia tradicional de painel, é algo excelente considerando as regras de privacidade.
Nesse caso, como a Comscore está se adequando à Lei Geral de Proteção de Dados, que entra em vigor este ano no Brasil?
Já enfrentamos essa situação nos vários mercados em que atuamos. A Comscore já é 100% compatível na Europa. E bem avançada para as regras da Califórnia, nos EUA, e da China. A ideia é trazer tudo que foi construído lá fora para o Brasil. Claro, validando com o time legal. Esse business é muito delicado. Caso não fosse assim, a Comscore não existiria.
Quais são os policies já utilizados?
Por exemplo, a Comscore não mensura nada em mobile de pessoas abaixo dos 18 anos. E isso ocorre globalmente há 10 anos. Não importa se a regra é mais frouxa em algum lugar. Esse comportamento faz parte da metodologia. E da cultura. Por esta razão, a Comscore está confortável em relação à LGPD. Também a empresa não abre nenhum dado sensível ou identificável do painel.
Qual é o investimento em digital no Brasil?
Cerca de R$ 20 bilhões em 2020. Usamos a métrica AdSpend do IAB. Mas há desafios como games e podcast. No caso dos games, a Comscore trabalha com várias multinacionais do ramo. Uma marca pode interromper o jogo para veicular sua publicidade, que é mais fácil, mas a evolução é que as marcas estejam presentes durante a utilização.
E o áudio com o fenômeno global dos podcasts?
É um potencial maravilhoso que a Comscore já vem estudando há mais de um ano. Nos Estados Unidos, está em desenvolvimento uma métrica de mensuração desses dados. Ainda é cedo para que essa oferta seja feita e talvez só ocorra depois de 2020. O podcast não é apenas ao vivo. Muitos usuários fazem download. O mundo mobile é complexo, disruptivo e desafiador.