A transformação é um estado constante. Com a mudança de hábitos da população, agências e marcas analisam as melhores formas de produzir uma maior interação com seus clientes nas plataformas em que atuam. Nesta entrevista, João Livi, CEO da agência Talent Marcel, que este ano conquistou contas como AC Camargo, Odontoprev, Oreo (digital) e Itubaína (Heineken Brasil), analisa essas mudanças no comportamento do consumidor, revela se o digital colocou em xeque a criatividade e fala como enxerga a movimentação das consultorias no mercado.

Em outubro de 2018, a Talent comemorou três anos da associação com a Marcel. Que balanço você faz desta trajetória?
Crescemos bastante neste período. Subimos muito no ranking das agências e temos um jeito de fazer, metodologia e uma operação bastante influenciada pela Marcel e por outros fatores importantes como o comportamento do consumidor. Aliás, as pessoas adoram a complexidade, e tudo o que a gente faz é pautado em como as pessoas estão exercendo as suas motivações. Estamos muito bem posicionados dentro do Grupo Publicis, como uma agência brasileira de planejamento e criação. Realizamos um trabalho extremamente consistente, que poderia estar em qualquer lugar do mundo, se aquele fosse um contexto brasileiro. Não é qualquer um que vem para cá e consegue falar a língua do brasileiro. O que procuramos fazer todos os dias é ser contemporâneo em termos de como as pessoas estão exercendo as suas motivações.

Na época do anúncio a agência buscava uma maior internacionalização e modernização do modelo de gestão. Isso aconteceu?
Essa é a nossa procura e ruptura diária. Nunca vamos dizer que terminou, pois continuamos trabalhando. Nunca vamos deixar de ser Talent e nos preocupar mais com o júri de Cannes do que com os quase 210 milhões de brasileiros, por exemplo, essa é a nossa crença. O mercado consumidor brasileiro é material de trabalho suficiente e já nos ocupa totalmente. Não trocamos isso para agradar meia dúzia de publicitários em outro país e com outra cultura. Porém, mesmo assim, vamos para Cannes e trazemos os nossos Leões. Não é o nosso foco, mas a gente gosta de ter o trabalho reconhecido. Temos um espaço no grupo, que não é aquele de uma enorme rede multinacional com 80 escritórios, mas temos o nosso espaço. A Talent e a Marcel, juntas, são dois expoentes de uma cultura de mais planejamento, interação, ousadia e criatividade. As outras sedes da Marcel, que são um pouco menores, também entram na mesma narrativa. Neste sentido, somos internacionais, pois temos um jeito único de fazer, que é eficiente, produtivo, que deixa o cliente satisfeito, diverte, educa e vende para a sociedade brasileira. Não faço questão que a Talent seja a melhor agência da Inglaterra, pois isso não faz sentido. Eu quero que ela seja uma grande, importante e essencial agência no Brasil.

Você citou mudanças no comportamento do consumidor, como analisa essas transformações?
Não dá mais para fazer piada de sogra na publicidade. As pessoas mudaram e o gosto mudou. A beleza é que tudo é dinâmico e todo dia encontramos novas oportunidades. Os dados e microdados são superimportantes para a jornada, mas precisamos entender quais são as pequenas revoluções que estão sendo realizadas no mundo e no Brasil. Muitos consumidores, mais conservadores e sem tanto acesso a tecnologia, ouvem muito que eles precisam mudar, mas ele não vai mudar. E não tem problema. Observe a quantidade de mudanças de parâmetros que ocorreram nestes últimos seis meses com as eleições e vão continuar nos próximos seis meses. É radical. Muito provavelmente, algumas marcas vão mudar de assunto, sem deixar de ser quem elas são, mas vão mudar o discurso. Por que elas são venais? Não. Porque elas estão em um outro mindset. Estes dados de como as pessoas estão pensando, que sonhos e medos elas têm, é a coisa mais importante para conhecer. Há um mundo real que desafia o politicamente correto e a modernidade. Isso se chama contemporaneidade. Ser moderno e contemporâneo são duas coisas completamente diferentes.

O digital colocou em xeque a criatividade?
Em alguns momentos sim, pois há uma adaptação de como ser criativo. Ao mesmo tempo, analiso que a tecnologia é o futuro, mas, por outro lado, a mensagem é dos primórdios da propaganda. Quando uma marca tem uma plataforma de atuação, não um roteiro ou uma campanha, ela precisa ser digital, mobile, mas, antes de tudo, ela precisa ser interativa. Ela precisa ser acessada pelas pessoas e gerar uma conversa. Então, você precisa criar um ecossistema de comunicação que permita interação, e isso inclui o OOH, que também é mobile, que também é cartaz, as redes sociais, os mecanismos de busca e as mídias de massa, como TV, rádio, cinema e jornal impresso. Nossa encomenda diária com o departamento de interatividade da Talent é de como os consumidores vão interagir com essas marcas. A interatividade é uma coisa que inclui todos estes fatores.

Com um mercado em constante transformação, como fazer a diferença? Onde a agência busca inspiração?
Buscamos nos jovens. Atualmente temos uma equipe na agência muito mais jovem do que tínhamos há três anos. É inegável que pessoas que vivam uma geração diferente da nossa tragam gostos, olhares e critérios diferentes. Você não consegue enxergar um mundo diferente daquele que você está acostumado se você não for confrontado todos os dias por pessoas que pensem diferente de você. E também temos muito cuidado com os modismos.

Como você enxerga a movimentação das consultorias neste mercado?
As consultorias são uma indústria tão maior do que a publicidade que me pergunto o que eles estão fazendo aqui. Eles estão atrás, basicamente, de um pool de dinheiro que a publicidade tem no mundo inteiro. Mas o nosso trabalho é o de ficar com a barriga no balcão, de suar todos os dias, não é uma teoria. É uma prática, um negócio complicado. Estamos sempre resolvendo problemas. É uma vida dura, porém, deliciosa, interessante e sem rotina. Há toda uma parte artesanal, tecnológica e mecânica. No Brasil, as consultorias estão tendo abordagens diferentes e algumas muito interessadas na criatividade, porém, como forma de credibilizar a sua oferta que seria de mídia, de aproveitamento, de produtividade e rentabilidade de investimento. Não tenho nada contra isso. O mercado não diz não para ninguém. Neste negócio, 60% de energia, interesse e tempo é gasto em fazer planejamento, criar e, para nós, é a coisa mais importante do mundo. Mas como é para eles? Um departamento no canto da sala. Tem de ver, pois isso ainda não está sintetizado. Algumas provocações aumentam a nossa eficiência.

Estamos a dois meses do fim do ano, que balanço a agência faz de 2018?
Apesar de um ano atrapalhado por Eleição, Copa do Mundo e greve dos caminhoneiros, foi um bom ano. Por incrível que pareça aquela greve de alguns dias causou um enorme estrago, uma coisa que não imaginávamos. Conquistamos algumas contas e foi um ano de bons projetos, prêmios e de um bom planejamento para o ano que vem.

Quais são as perspectivas para 2019?
Tentando não abordar o resultado das eleições, que não vem ao caso, esperamos começar o ano com muita esperança, estabilidade e com a promessa de algumas mudanças estruturais importantes. Acredito que os empresários estão sedentos por um pouco de mudança, liberalidade e ajuda. E vão fazer de tudo para transformar esse momento político em um momento econômico interessante com a volta de alguns investimentos. Para o nosso mercado, acredito que a perspectiva é boa. Um ano de plantar e preparar coisas legais em vez de ter medo. Precisamos ter esperança e planos. Sou otimista e, óbvio, tenho medo que esse governo não consiga existir, mas estou confiante.