Para alguns, o app pode ganhar território no Brasil; para outros, o Koo não deverá ter 'vida longa'

A polêmica do suposto fim do Twitter movimentou o mercado nas últimas semanas, após Elon Musk adquirir a rede do passarinho azul, e uma série de trapalhadas têm levado os usuários a temerem o apagão da rede social. E muito espertamente a rede indiana Koo atacou e espalhou sua jovem ave amarela pelo mundo, provocando ainda mais agitação. Não só pela novidade, como também pelo engraçado – para os brasileiros – nome, gerando milhares de memes.

Mas será que é apenas uma onda passageira?

Para Flávio Santos, CEO e fundador da MField, todo grande movimento nas redes sociais surge a partir de uma ação polêmica ou questionável. E o boom do Koo não foi diferente. “Após uma série de anúncios do novo dono do Twitter sobre as mudanças na plataforma, os usuários rapidamente buscaram criar um motim para evidenciar a morte do Twitter e a procura de uma nova rede democrática que atendesse às suas expectativas”, descreve.

Segundo ele, o Koo já é uma rede social consolidada na Índia, mas para performar no Brasil ainda precisa de muita evolução, porque o comportamento dos usuários brasileiros nas redes é atípico e diferente da população de todo o mundo. “O time de developer da plataforma prontamente se colocou à disposição para fazer ajustes que atendessem ao Brasil, mas é necessário entender se teremos audiência e penetração, para aí, sim, traçar uma projeção de engajamento futuro”, analisa.

Ele fala que enxerga o copo meio cheio quando o assunto é nome polêmico. Para ele, a rede social só se popularizou no país exatamente pelo nome aparentemente “feio”. “Foi o duplo sentido que fez a viralização de memes, o interesse das pessoas em conhecer o ‘app de nome estranho’, o engajamento orgânico dos influenciadores em fazer piadas e experimentar o novo, isso fez com que todos as timelines recebessem uma enxurrada de postagens. Com o nome na boca do povo, o resultado foi o cadastro de milhões de pessoas em poucas horas”.

O executivo da MField dá algumas dicas de como as marcas podem tirar proveito de tais oportunidades. Segundo ele, na economia da influência, timing é tudo. Santos disse que viu na semana passada uma publicidade com um corretor no Koo para a Espaçolaser (veja matéria na próxima página) que foi genial e chamou a atenção dele. “Em oportunidades assim, a marca tem de criar um conteúdo pontual e avulso para entrar na conversa, surfar o hype e engajar na comunidade viral”, avalia.

Santos analisa também a situação do Twitter. Ele acha que uma nova liderança implica em uma série de mudanças de tecnologia, gestão, funcionalidades e do objetivo daquele canal de comunicação. “Acredito que o Twitter ainda vai passar por muitas atualizações e toda mudança gera estranheza e argumentações da base. Mas estamos longe do fim do microblog.

A chegada do Koo só nos faz ter certeza que a creator economy está girando e não devemos ficar presos a uma plataforma exclusiva”, afirma.

Já Eder Redder, diretor nacional de conteúdo da Artplan e head do Artplan.influ, disse que o Koo teve sorte, porque, se não fosse o trocadilho do nome no Brasil, talvez não ganhasse a atenção que ganhou. “Apesar da oportunidade, à primeira vista, não me parece uma rede social que conquistará um público cativo. O timing coincidiu com o momento em que as pessoas procuram por um substituto para o Twitter”, declara.

Segundo ele, o que faz uma rede social conquistar e manter o público é a usabilidade. É alguma experiência diferenciada, oferecida pela rede. E, apesar de falarem de uma possível substituição ao Twitter, não parece, para Redder, que esta rede oferece uma experiência similar. “Acredito que seja algo passageiro, até porque já houve um problema de invasão de perfil, mostrando fragilidade. Entendo que seja mais uma brincadeira do que uma nova tendência”.

Na avaliação dele, hoje, é interessante deixar o nome Koo. “Mais para frente,
se de fato a rede pegar no Brasil, eu trocaria o nome, se fosse o CEO, porque a brincadeira vai ser eterna e o nome será maior do que o próprio objetivo da ferramenta. Mas essa conjectura é dentro de um cenário positivo, se a rede social der certo. O que eu não acredito. Porém, diante deste boom de popularidade, o Koo está certo de não mexer no nome de imediato”, afirma.

Brincadeira
Mas surfar na onda e aproveitar o time é outra coisa para o executivo da Artplan. “Em relação a isso, eu sempre falo que é preciso analisar a pertinência da rede social, sobre entrar nessa história. Pelo posicionamento da marca, cabe uma brincadeira desse tipo? Se for para brincar, tem de ser conforme a moda que já pegou, ou seja, o trocadilho”. Porém, conforme ele, se a marca não faz esse tipo de trocadilho, e “só porque o outro está falando eu vou arrumar algum jeito de falar”, o executivo acha que não cola. Outra coisa que ele acha importante é sobre a pertinência que, quando a brincadeira é só pela brincadeira – sem achar qual a conexão com o produto ou serviço –, a construção é voltada ao meme e não à marca. “O legal é brincar quando há conexão entre marca/meme e, principalmente, se faz sentindo com o público”, esclarece.

Luciano Mathias: “Koo não entrega tanto assim” (Divulgação)

Redder acha que ainda é cedo para falar em performance criativa porque não teve volume de uso para entender exatamente como o Koo funciona. “A plataforma nunca é exatamente aquilo que a rede se propõe a fazer. O público sempre dá novos significados”, afirma, lembrando que o TikTok é um exemplo. “Os idealizadores não esperavam que as pessoas usariam a plataforma para conteúdo de ensinamento, de How to Do, e ela começasse a substituir o YouTube. Creio que eles pensaram muito mais na criação de uma plataforma de entretenimento”. Segundo ele, ao analisar o cenário atual, o TikTok se transforma a cada dia e o seu público é quem dá essas novas usabilidades. “Temos de esperar e ver se vai pegar; sentir se terá movimentos de publicação para entender como, de fato, poderá ser usada depois do hype”, comenta.

Para o executivo da Artplan, o frisson causado em torno da chegada de um aplicativo novo funciona bem para marcas que costumam ser pioneiras, que têm dinheiro para fazer ação em tudo quanto é lugar. “Como foi o ClubHouse, por exemplo, em que muita gente já queria estudar a ferramenta, saber como era, abrindo perfil, preparando e, no final, não vingou. Depois disso, o Twitter criou o Spaces, ofereceu uma usabilidade parecida e aquilo que parecia ser uma nova rede social, que iria tomar conta, não vingou. Neste caso, ter um pouco de cautela não é ruim”, aconselha.

A situação do Twitter, para ele, é uma incógnita, porque ainda não começou a ter os impactos de mexidas de algoritmo, de aumento de publicidade, de como o conteúdo vai se comportar a partir da diminuição de filtros. “O que eu acho que acontece, imediatamente, é a saída de grandes anunciantes, por conta da nova administração, ou algum possível conflito, como com as montadoras de automóveis, por exemplo. O fato é que as pessoas ainda não encontraram um substituto para o Twitter, que proporcione o mesmo tipo de experiência para uma conversa rápida, real time, fluida, da forma que a rede do passarinho faz”.

Brechas
Já Natália Oliveira, gerente de estratégia e criação da MAP Brasil, diz não acreditar que a onda provocada pelo Koo seja passageira, mas que possa vir a ser uma rede social alternativa. “Tudo depende da forma que ela será investida daqui para frente, saber aproveitar as oportunidades que os brasileiros estão criando por aqui vai determinar o seu tempo de vida no nosso dia a dia”. Segundo ela, o que eles têm provado até agora é que se aproveitaram das brechas, são uma startup jovem, com menos de três anos, porém muito próspera. “Esse clima de brincadeira e piadas pode criar uma atmosfera mais leve neste formato miniblog. Além disso, há um movimento ativista por parte de uma parcela dos usuários do Twitter que não compactua com novos posicionamentos e ideais da plataforma”, diz.

Sobre o nome ser uma boa estratégia ou não, ela afirma que sem dúvida a melhor estratégia para manter o nome foi perguntar aos usuários se eles gostariam da mudança e sugerir outras opções, porém o “estilo quinta série” funciona muito bem no Brasil, pois os brasileiros são “os reis dos memes e não seria diferente com o Koo”.

“Não à toa nos tornamos o segundo país que mais acessa a plataforma, contabilizando 2 milhões de usuários em menos de cinco dias, e isso já está estabelecido, não tem motivos para mudar de nome”, avalia.

Para Natália, é fácil se identificar com os indianos, pois eles amam o Brasil e até torcem pelos brasileiros na Copa, agora muito mais. “O que os criadores do Koo estão fazendo é olhar para atender a demanda dos brasileiros, e vale como referência. O próprio user do Koo no Twitter foi modificado para KooForBrazil, ou seja, há um olhar e um cuidado para essa forte pequena comunidade. As marcas devem ser rápidas, porém estratégicas em apresentar uma linguagem que não perca a essência e a verdade já estabelecidas em sua comunicação, sabendo que lá vão encontrar um público muito mais descontraído e disposto a interagir”. A sugestão que ela faz para as marcas é que estar mais próximo do público exige uma linguagem nativa, é quase parte do ritual brincar com o nome da plataforma. “A dica é não perder a sua essência e verdade enquanto marca, e abrir conversas em seus respectivos territórios”.

Sobre a situação do Twitter, ela também acha que é cedo para especulações. Mas, segundo ela, o que especialistas e ex-funcionários da rede contam é que a plataforma vem perdendo profissionais importantes e operando com equipes muito reduzidas. Isso, no longo prazo, pode apresentar falhas, fazendo com que a plataforma perca credibilidade. “Os últimos acontecimentos apontam essa instabilidade, além das demissões em massa, projeto hardcore, testes irresponsáveis e a propagação de fake news. No dia 21, os próprios usuários já anunciavam o ‘fim’ por meio da #RipTwitter como um dos assuntos mais comentados.

Vinicius Machado, CEO e fundador da Sotaq Creators, lembra que essa rede social já estava presente na web há um tempo, porém ela ganhou relevância no Brasil após a queda da credibilidade e de questões do Twitter em relação a Elon Musk. “Por conta disso, é muito imprevisível o futuro do Koo. Deve depender diretamente de como os líderes do Koo vão tratar dessa explosão de popularidade. Eles têm a oportunidade na mão, teremos de observar como vão aproveitá-la”, explica. Para ele o nome Koo foi um dos combustíveis para o ‘hype’ da rede social. Ele impulsionou inicialmente e pode, sim, ajudar a mantê-lo presente no imaginário das pessoas.

Machado ainda avalia que talvez não seja o momento de as marcas estarem presentes no Koo, principalmente por causa da sua instabilidade. “Porém, pensando em uma estratégia de curto prazo, pode ser a saída para aproveitar a popularidade explosiva do novo rival do Twitter”.

Ele acha que a força dos conteúdos do Koo é a mesma do Twitter. “Criatividade para se tornar viral. A principal dica para ganhar relevância nessa rede social seria espelhar o que faz sucesso no Twitter de uma forma criativa e inovadora, também não vale copiar exatamente o que já é sucesso na rede do pássaro azul”, declara.

Luiz Zapatero, atendimento premium da Banca Digital, acha que o burburinho em torno do Koo é passageiro. “O Twitter não vai acabar, e as pessoas não vão migrar para uma nova plataforma tão rápido assim por um período duradouro. Acho que é algo como um novo ClubeHouse, com burburinho efêmero”, analisa. Para ele, o nome Koo no Brasil foi um ótimo trocadilho para os bons memes que surgiram. E, por isso, não vê a necessidade de uma mudança, devido ao sucesso.

Henriques Rojas: “Falem bem ou mal, mas falem de mim” (Divulgação)

“Perderia um pouco a identidade”, acredita. Segundo ele, o conteúdo inteligente e de qualidade permanecerá sempre em evidência. “Alguns perfis já cresceram bastante na rede social devido à expertise de criação, e isso é ótimo. Talvez seja um bom momento para os criadores de conteúdo usarem a plataforma para crescer ainda mais com a Copa”.

Engajados
Henrique Rojas, sócio e CSO da Peppery, não tem dúvida que Koo é uma moda passageira. Não só porque os brasileiros que estão no Twitter são muito engajados na plataforma, mas também porque o Koo vem crescendo muito mais em cima dos memes do que da plataforma em si – que abriga diversos usuários de extrema-direita e está envolvida em um sério imbróglio por proteger o governo indiano. “Essas questões são, em parte, muito semelhantes às críticas feitas à ‘política de liberdade’ do novo Twitter.

O nome para ele reflete a velha máxima: “Falem bem ou falem mal, mas falem de mim”. “O fato de o nome trazer consigo um duplo sentido que estimula a quinta série que habita dentro de todos nós faz com que o awareness orgânico da plataforma seja enorme. Logo, pensando em uma marca que até outro dia era totalmente desconhecida dos brasileiros, manter o nome faz todo o sentido”.

Pensando somente no conteúdo e na forma que se consome a rede social hoje,  para ele, surfar nessa onda parece uma boa estratégia, até porque nomes como Felipe Neto, Bruno Gagliasso, Claudia Leitte, Fernanda Paes Leme e mais 2 milhões de brasileiros já estão navegando na plataforma do pintinho amarelinho.
Toni Fernandes, sócio e líder criativo da monkey-land, encurta o assunto e vai logo ao ponto: “O Koo nasceu como uma resposta ao Twitter e às medidas adotadas pelo Elon Musk”, diz, acrescentando: “Virou assunto no próprio Twitter, Trend Topic, meme e atraiu algumas personalidades, como Felipe Neto. Mas, apesar de todo o burburinho e trabalho do pessoal do Koo, que virou a noite para a plataforma ter a sua versão em português, o Koo parece ser o ClubHouse da vez”, comenta. O nome, para Fernandes, é ótimo. “É uma rede social que já vem com um meme pronto. O humor e a capacidade de tirar sarro de si mesmo têm tudo a ver com o Brasil”, lembra.

As marcas, para ele, deveriam correr atrás de todos os assuntos. “Fazer parte da conversa é importante, mas elas têm de fazer sentido para aquela marca. Fazer só por fazer não vai ajudar na construção de nada relevante”, fala Fernandes sobre a ida dos anunciantes para a nova rede social.

Vilma Morais: “O Koo pode, sim, conquistar seu espaço” (Divulgação)

Vilma Morais, diretora-geral de mídia da R/GA, resgata a trajetória do Koo e lembra que a rede social indiana surgiu em março de 2020 e se tornou popular na Índia em 2021. Cresceu à custa de turbulências geradas entre o Twitter e o governo indiano – de início o objetivo era alcançar indianos que não falavam inglês. Porém, segundo a própria plataforma, o Koo já alcançou mais de 100 países e soma mais de 50 milhões de downloads. Desde o início, Koo foi alternativa para os insatisfeitos com o Twitter, independentemente do motivo. “Por aqui, o motivo foi por conta do boato do fim do Twitter devido às medidas pouco ortodoxas do novo proprietário, Elon Musk. E por ter funções bem semelhantes ao Twitter, como publicar textos com até 500 caracteres e poder compartilhar fotos, vídeos e enquetes – até o símbolo é uma ave também, só que amarela –, o Koo pode, sim, conquistar o seu espaço no ringue das redes sociais”.

O nome da plataforma, para ela, já é a maior façanha da empresa entre o público brasileiro e conquistou vários usuários do passarinho azul devido ao seu nome sugestivo. “Não é novidade que uma das ações mais populares nas redes sociais brasileiras sejam os memes. O Koo já virou domínio público e seu alcance orgânico cresce a cada dia”, exemplifica.

Luciano Mathias, CCO da Trio, também lembra do ClubHouse. Na época do lançamento, foi um hype gigantesco em cima da plataforma, hoje em dia quase ninguém mais fala sobre a rede, apesar de alguns entusiastas ainda participarem de algumas salas. “Não sei ao certo se será passageiro, mas acredito que o Twitter seja muito forte para perder toda a audiência, mesmo com os haters do Elon Musk deixando a plataforma”, menciona, acrescentando: “O Koo é interessante, mas não entrega tanta coisa inovadora assim, um recurso aqui, outro ali. É mais um concorrente da mesma coisa, assim como o Kwai, que vem tentando desbancar o TikTok, e o Instagram com o YouTube, utilizando de ferramentas semelhantes. Se a plataforma indiana desenvolver aplicações mais inovadoras e interessantes, tem grandes chances de se consolidar”.

Para ele, as redes sociais têm uma necessidade “memética” de se desenvolverem. “Hoje, quando temos moedas digitais e NFTs de memes, valem uma certa quantia de compra. Acredito que a estratégia fale a linguagem da internet, e o nome acabou virando motivo de piadas de forma natural. Se os memes são de bom tom e nada preconceituosos com ninguém, a estratégia me parece alinhada com os tempos atuais”, afirma Luciano.

(Crédito: camilo jimenez on Unsplash)