Vocês me desculpem, mas eu nunca na minha vida conheci alguém que realmente não gostasse de aparecer. Gente que jura de pés unidos que o que gosta mesmo é ficar no seu canto eu conheço muitas. Pessoas que garantem preferir o anonimato do que os holofotes, que se dizem observadoras da humanidade e cujo maior prazer é viver sem serem notadas eu encontro dúzias. Mas sinceridade na afirmação que detesta merecer atenções e serem reconhecidas – desculpem – até agora não notei. Toda vez que alguém se aproxima de mim e vem com a velha história de que adora atuar nos bastidores, que abomina quando lhe dão créditos em determinadas vitórias, eu tenho a mais absoluta certeza que estou diante de um ressentido. Alguém que preferiu fingir indiferença por não conseguir o que mais as pessoas gostam na vida: a admiração, o reconhecimento, o prestígio. E, me permitam: o aplauso.

Não estou, evidentemente, dando força à atitude de convidado de festa de cervejaria ou operadora de telefonia, disputando na porrada a atenção. Ir peladona pode ser muito chato e transformar a ida a uma festa um martírio. Estou apenas negando a sinceridade de quem afirma que não ser notado é melhor do que ser reconhecido. A escolha consciente por não ser ninguém. É mais ou menos como a história do “come quieto”, personagem lendária que insiste em sobreviver na imaginação das pessoas. O “come quieto” seria aquele sujeito que consegue as melhores mulheres e se faz de tonto. Um sujeito com aparência, elegância e conversa de babaca, mas que é o terror do mulherio. Geralmente quem me vem com essa história tem pinta, voz e atitudes de babaca. Ou seja: na divulgação da lenda do “come quieto” existe a intenção de mandar um recado: “eu posso ser um ‘come quieto’ e você não percebeu”.

Infelizmente, assino e dou fé na declaração de que o grande comedor é, no fundo, um exibicionista. A maior parte do prazer é exatamente a divulgação de seus feitos. Até porque a grande maioria das mulheres tem a mais absoluta curiosidade sobre os grandes namoradores. Aliás, no inevitável e delicioso processo de feminilização do mundo, figuras como a “come quieta” já estão aparecendo. Infelizmente é o outro lado se manifestando. A “come quieta” não passa da mocreia espalhando a hipótese de ser uma verdadeira máquina de prazer. Daqui a pouco a gente poderá juntar o “come quieto” com a “come quieta” e criar um casal de felizes boquirrotos. Permitam-me dar um conselho para os mais novos: nunca acreditem no cara que diz não querer aparecer, dada a oportunidade, se permitam aparecer no lugar deles. Vocês ganharão um inimigo. Ganharão um dedo indicador permanente apontado com a acusação de que se trata de um ego inchado. Diante de quem não gosta de aparecer só há um antídoto: botá-lo logo no centro da roda, valorizar seu talento e sua imensurável modéstia. Agora deixa eu mudar um pouco de assunto. O livro do Luis Fernando Veríssimo sobre o Internacional de Porto Alegre. Estou enfurecido.

O livro, que faz parte de uma coleção sobre todos os times de futebol do Brasil, era para ser só isso. A história de um clube de futebol. Seus leitores deveriam ser, na sua maioria, os torcedores dos clubes biografados. Pois a história do Internacional contada pelo Veríssimo é um dos mais perfeitos retratos sobre a relação dos brasileiros com o futebol. Uma biografia de uma paixão. Estou enfurecido. Pelo talento de Luis Fernando Veríssimo, que consegue escrever com a profundidade dos grandes filósofos. Eu, de vez em quando, me considero cronista, acho que sei escrever e fico orgulhoso de uma ou outra besteira literária que cometo. Ao ler o livro do Veríssimo fui acometido de uma sincera depressão. E, já que se tratava de um livro sobre futebol, me deu vontade de pendurar as chuteiras. O que me consola é que, tanto na literatura como no futebol, há lugar para Pelés e Melecas, Ademires da Guia e Bolachas. Assim como existem os Luises Fernandos Veríssimos, Zuenires Venturas em contraposição com os Lulas Vieiras e os…

Lula Vieira é publicitário, diretor da Mesa Consultoria de Comunicação, radialista, escritor, editor e professor (lulavieira@grupomesa.com.br)