Um homem — era aquela noite amiga/Noite cristã, berço no Nazareno/Ao relembrar os dias de pequeno/E a viva dança, e a lépida cantiga… Quis transportar ao verso doce e ameno/As sensações da sua idade antiga/Naquela mesma velha noite amiga/Noite cristã, berço do Nazareno… Escolheu o soneto… A folha branca/Pede-lhe a inspiração; mas, frouxa e manca/A pena não acode ao gesto seu… E, em vão lutando contra o metro adverso/Só lhe saiu este pequeno verso: “Mudaria o Natal ou mudei eu?”

Se Machado, que é Machado, quando se viu diante da obrigação de escrever sobre o Natal, viu-se tomado por total ausência de inspiração, imagine o que sofre quem não possui um único fio de seu talento.

Machado, ao menos, fez um soneto, retratando o desespero de quem se descobre impotente diante da folha branca. O que dizer que ainda não tenha sido dito sobre as sensações da “noite amiga”? Que nova ideia, que pensamento original pode surgir 2017 anos depois do primeiro Natal?

Tudo já foi escrito, cantado, musicado e pintado desde as mais piegas canções natalinas às imortais obras dos mestres de todas as artes. Milhões de anúncios, incontáveis jingles, bilhões de mensagens já foram criados para desejar um Feliz Natal.

Então, por que não mudar de assunto e esquecer a data? Simplesmente porque é impossível. Pelo menos para mim, incorrigível sentimentalóide, que gosto de Natais e de festas.

Como fingir que nada está ocorrendo e contar uma história antiga, sem data, e fazer a suprema desfeita de não desejar a você, leitor fiel, uma belíssima, divertida e amiga noite de Natal?

Mudando um pouco de assunto, me permita recomendar três livros para dar de presente ou comprar para ler durante os feriados de fim de ano. Eu já li e comprei vários para oferecer para amigos, inclusive para o “amigo oculto” da empresa e da família.

O primeiro deles é o Livro de Jô – Uma autobiografia desautorizada. Uma delícia. Com humor, inteligência e sensibilidade, Jô Soares fala de sua vida, da infância ao começo da carreira. O resto ficou para a segunda parte, a ser lançada no ano que vem.

Ao contrário da grande maioria das autobiografias (ou mesmo das biografias autorizadas), Jô não pinta um retrato retocado de si mesmo, criando um ser inexistente de retidão e seriedade, cercado de uma família exemplar. Suas histórias envolvem e divertem, mas refletem também ricas vidas humanas, com suas grandezas e contradições. O outro livro, Jingle é a Alma do Negócio, de Fábio Barbosa Dias, é uma pesquisa bastante cuidadosa da história do jingle no Brasil e a biografia dos maiores criadores.

Acompanha um CD com mais de 150 jingles que fizeram história. Eu sempre pensei escrever um livro sobre jingles. Foi bom que não o fiz. Tenho certeza de que me sentiria humilhado pela qualidade do trabalho do Fábio, que não conheço, mas invejo. Finalmente, vale a pena ler a autobiografia da Wanderléa, Foi Assim. Além de ser gostoso de ler, é um retrato muito preciso de um momento importante de nossa música.

Com uma sinceridade muito rara nesse tipo de obra, Wanderléa conta seus amores e suas tristezas, não tendo o menor pudor em revelar segredos de sua vida particular, muito mais para mostrar que todos nós precisamos aprender a superar preconceitos, dores e tragédias pessoais. Livro daqueles que ficam difíceis de parar de ler. Para completar, o que você está achando das mensagens de Natal que recebe pela internet.

Eu fico triste em constatar que a grande maioria não passa de baboseiras. Ou, vai ver, eu mudei.

Lula Vieira é publicitário, diretor da Mesa Consultoria de Comunicação, radialista, escritor, editor e professor (lulavieira@grupomesa.com.br)