O Brasil é o maior mercado  da Avon. Dos seis milhões de revendedoras, 1,5 milhão delas estão no país, que divide com a Inglaterra o status de sede internacional da empresa de cosmética e beleza. O mercado brasileiro é o terceiro em escala mundial do segmento. Nesta entrevista, a executiva Danielle Bibas, head global de comunicação, marketing e conteúdo da marca, explica que os desafios são enfatizar o empoderamento feminino, estabelecer diálogo com os millennials e avançar no ambiente digital, principalmente pelo WhatsApp.

 

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Qual é a essência da Avon pelo viés mercadológico?

O empoderamento feminino, simples assim. Fazemos isso há 131 anos. Nos últimos 18 meses temos observado que muitas marcas estão dando destaque a esse tema, mas a Avon realmente faz. Porque oferecemos uma alternativa para as mulheres terem uma fonte de renda, afinal essa é uma das bases para se falar em empoderamento.

A questão do empoderamento também está relacionada à beleza?

Tem o vetor financeiro, que é o lado de ser representante e vender Avon, além do impacto que tem na família e na comunidade. Mas tem o lado da beleza que agrega autoestima, confiança própria e de se sentir bem com ela mesma. Sim, a beleza é um instrumento de empoderamento feminino.

Quais os resultados que a Avon contabiliza com esse posicionamento?

Costumo dizer que reposicionamos a companhia voltando às origens. Esse processo começou em 2015. De lá para cá estamos falando no Brasil de beleza que faz sentido. Tivemos um aumento de recall da marca significativo em vários países, inclusive no mercado brasileiro, sem aumentar significativamente o budget de mídia. Temos mostrado muita diversidade na forma de falar de padrões de beleza diferentes, sermos inclusivos e de não dar espaço para os estereótipos. Fugimos do padrão de mulher alta, loira, branca, olho azul e de cabelo liso. Com esse posicionamento, elevamos nosso share no Brasil nas quatro categorias que atuamos: cosméticos, fragrâncias, cuidado com a pele e com corpo.

Como a comunicação ajuda na compreensão dessa postura?

É o principal meio para falar de empoderamento com o público de um modo geral. Hoje, principalmente os millennials, todos buscam os propósitos das marcas. Não é só uma marca que vai querer vender uma cerveja, um batom ou um xampu. A questão é: por que eu me identifico e quero comprar uma marca? A resposta é que os valores da marca precisam estar alinhados com as pessoas. A comunicação entra nesse ângulo. Sim, temos de falar sobre o novo creme da linha Renew, que tem uma nova tecnologia e vai ajudar a consumidora a ficar com um rosto lindo, mas tem a marca por trás. Nesse caso, isso envolve os seus valores.

A Avon trabalha prioritariamente a marca ou prefere destacar as suas linhas?

Essa é uma das principais discussões internas da empresa e dentro do nosso canal de distribuição. Diferentemente das companhias de varejo, como a Unilever e a P&G, que trabalham as suas submarcas, quem trabalha com canal de venda direta, caso da Avon, é importante destacar a marca-mãe e toda a sua ligação com o empoderamento feminino que ela agrega aos produtos. No início de 2017 lançamos a Mark, focada em um público millennial e mais trend, mas o que essa linha vai trazer além dos benefícios de maquiagem? A Avon dá o suporte.

O que é necessário para atrair a geração millennial, que traz novos padrões de consumo e para o capitalismo?

Ninguém se apodera dos millennials. Essa geração tem uma lealdade às marcas muito mais baixa do que a anterior, a Y. Eles também querem experimentar e ver tudo. É uma geração focada em propósito e valor. Para conversar com esse público e tê-lo como cliente, é preciso ter um discurso de identificação com a marca.

É a era do design thinking permanente?

Sim. O produto não pode decepcionar; a razão pela qual o consumidor vê valor é através da marca. O produto entrega apenas benefícios funcionais.

Quais os pontos de contato da Avon com essa geração disruptiva?

Através dos meios de comunicação. Temos um percentual global de 28% dos investimentos em mídia destinados às mídias sociais. Este ano vamos fechar, se tudo correr conforme o planejado, em 35%. E chegar no ano de 2018 a 40% para atingir esse target, volume que é muito alto na nossa indústria. Mas é uma escolha que fizemos, primeiro porque é um canal de mídia. Onde é que vamos conversar com os millennials? Muita gente afirma que esse público não vê televisão, mas isso não é verdade. Eles veem o conteúdo da TV em outras telas e em outros horários. O segundo ponto é como atrair. Debater a diversidade é um bom caminho. Muita gente se sente excluída da comunicação por não se ver dentro das peças. A população negra no Brasil é maioria, mas quantas mulheres negras são protagonistas nos comerciais?

Por isso a Avon lançou Karol Conka?

Ela é a spoken person da Mark. Ela é negra e grande. De novo, não são os padrões de beleza estereotipados do passado. Aquela coisa de angels da Victoria Secret, com 1,85m e manequim 38, ficou muito velha.

Qual é a agenda da Avon para empoderamento feminino?

Temos duas causas globais que apoiamos: câncer de mama e violência doméstica. Infelizmente, a mulher ainda é muito maltratada no Brasil, que é o quinto país em femicídio do mundo e isso ocorre em todas as classes sociais. Nesse contexto, vamos patrocinar times de futebol feminino nos dez principais mercados da Avon. O primeiro é o Liverpool Ladies. Estamos definindo qual será o time brasileiro até o fim deste ano. Praticar esporte faz parte do bem-estar da mulher. Quando olhamos para a desigualdade de patrocínios, projeção e muitas outras coisas entre times masculinos e femininos é brutal. Na época da Copa do Mundo no Brasil foi feito um side by side da Marta com o Neymar e a diferença salarial é realmente muito grande. Claro, estamos conscientes da importância dos esportes masculinos para a audiência da TV, mas resolvemos apostar. O time Brasil da Avon está negociando com algumas equipes. Neste ano compramos cota de patrocínio no canal GNT, que tem programas que são voltados à mulher. Há sempre uma adequação das mensagens aos canais.

Como a Avon lida com os clichês no ambiente da comunicação?

Com o crescimento da importância do Google e do Facebook, a mídia, as agências e a indústria da comunicação como um todo estão passando por muitas mudanças. Estamos no meio do redemoinho. Como vai ser construída a grade, o que entra e o que não entra, até mesmo sobre remuneração de mídia às agências. A Rede Globo demorou para acordar. Acho que vai mudar para melhor.

Como vê a publicidade como instrumento de interação com os consumidores?

Existe um grande deságio para as agências e para os anunciantes. Porque a pulverização de canais é muito maior. Cada vez mais as pessoas têm menos paciência para assistir publicidade. Há 15 anos surgiu nos Estados Unidos o Tivo, que permitia bloquear publicidade e assistir à programação no horário adequado à agenda das pessoas. Com a internet e o Facebook, 85% dos vídeos são assistidos sem som. Cada vez mais a barra está ficando alta. Se não pegarmos nos primeiros três ou quatro segundos, a pessoa vai embora e não interessa o que foi dito.

Como comprar o tempo do consumidor?

Ou a mensagem é muito relevante para tocar emocionalmente o consumidor ou é algo muito diferente. A necessidade de diferenciação é muito grande.

Como o passado inspira a Avon do presente?

Primeiro, os relacionamentos humanos. No nosso caso isso é muito relevante porque o modelo de negócios está evoluindo para o ambiente mobile, que vai ser feito através da tecnologia. É uma pessoa dizendo para outra que está usando um creme, por exemplo. O que vale é a recomendação, que passou a ser o ROI número um em qualquer planejamento de marketing. Sem baias e sem alguém que foi pago para falar do assunto. O modelo da revendedora é esse, mas vamos tratar o relacionamento pessoal com tecnologia. Esse contato direto também é off, que é uma entrega fundamental. Costumamos dizer que a Avon foi a primeira grande rede social do mundo offline. A empresa poderia ter feito essa mudança de chave para o online mais cedo.

Quantas revendedoras a Avon tem globalmente?

São seis milhões. Tem revendedoras que atendem a 300 clientes e outras que têm quatro, no universo familiar. Muitas delas se tornam empreendedoras, abrem lojas, têm estoque, um negócio.

É um canal de comunicação b2b muito poderoso. Como contempla digital, tradicional e marketing direto?

Obviamente, o canal com as distribuidoras mais tradicionais envolve reuniões e e-mails, mas a nova geração usa o WhatsApp. Não só para elas se comunicarem com suas clientes para avisar as novidades, mas também para a Avon mandar campanhas de incentivo, lançamentos, vídeos, fotos e comerciais. O canal número um de comunicação é o WhatsApp.

Quantas campanhas são formalizadas por ano?

Varia de país para país, mas na América Latina são 19. O ciclo é de que a cada três semanas a Avon tem uma campanha nova. Com novos catálogos, prioridades, ofertas e incentivos.

Quantos catálogos são impressos?

A Avon é maior publicação do mundo. São mais de 700 milhões de exemplares publicados na nossa revista/catálogo.

E o Brasil? Qual é o share?

No caso dos catálogos temos cerca de 25% do volume. É o país que mais vende Avon. No item revendedora, temos 1,5 milhão do volume total de seis milhões.