Entidades do mercado refletem sobre a ausência e a formação de novos ícones e a força criativa diante da padronização de processos
Dados do relatório ‘Marketing trends 2025’, da Kantar, mostram que 31% dos brasileiros se incomodam com anúncios gerados por IA, e 60% demonstram preocupação com conteúdos falsos criados por ferramentas generativas. Mas o receio não é exclusivo do consumidor. Segundo o relatório ‘The state of creativity 2025’, produzido pela Lions e divulgado pelo Estadão, a confiança criativa do próprio mercado está abalada. A análise, realizada entre novembro de 2024 e janeiro de 2025 com mais de mil profissionais de marketing e criativos, revela que os dois principais bloqueios para a criatividade atual são a dificuldade em gerar insights de alta qualidade e a baixa agilidade cultural.
O estudo mostra que apenas 13% das empresas se consideram abertas ao risco criativo, enquanto 29% se dizem altamente avessas. Além disso, 51% das empresas afirmam que seus insights são fracos demais para sustentar ideias criativas ousadas, e apenas 13% os classificam como fortes. Entre os obstáculos mais citados estão a falta de clareza sobre o que constitui um bom insight, o tempo limitado para aprofundar análises e a baixa priorização do processo dentro das estruturas.
Esse tipo de resultado revela um limite claro da tecnologia e aponta para a urgência de preservar o valor do olhar humano, além de ser um acalento para aqueles profissionais que temem por suas funções. Entretanto, apesar de ter um criativo como piloto, a inteligência artificial inegavelmente se tornou onipresente na publicidade, nos mais diversos setores. De dados a insights, essa automação de tarefas e o uso massivo de tecnologia impõem à publicidade um novo tipo de desafio: como continuar surpreendendo em meio a tanto conteúdo padronizado? E mais: como é o trabalho dos criativos na era dos algoritmos?
Ao celebrar seus 60 anos de cobertura sobre o mercado, o propmark propôs uma reflexão coletiva sobre o futuro da propaganda. Representantes de entidades do setor refletem que a automação trouxe agilidade e volume, mas é no diferencial criativo que se mantém o futuro da profissão.
“Quando usamos a IA apenas para gerar volume, sem curadoria ou propósito, caímos na armadilha da padronização e da superficialidade. No live marketing, isso é ainda mais crítico porque lidamos com o fator humano — e conexão não se automatiza”, diz Heloísa Santana, presidente da Ampro (Associação de Marketing Promocional).

Sandra Martinelli, CEO da ABA (Associação Brasileira de Anunciantes), reforça que, mesmo que seja um desafio, o papel dos profissionais é reinterpretar a tecnologia com olhar estratégico, e incentivar a capacitação. A entidade, inclusive, lançou o ‘Guia ABA sobre impactos da inteligência artificial generativa na publicidade’.
“Capacitar as equipes para usar a IA de forma complementar — e não como substituta — é o nosso maior desafio. A IA pode até otimizar processos, mas é o ser humano que garante diversidade, ética, intuição e emoção nas campanhas. O olhar humano sempre será indispensável.”
Fernando Cesário, CMO da ESPM, complementa a reflexão alertando que essa exigência criativa não é um desafio apenas técnico, mas também pedagógico, pois “a tecnologia, por si só, não interpreta contextos, não entende as nuances do mercado e não toma decisões estratégicas. Por isso, o diferencial competitivo das empresas está na capacidade dos profissionais de traduzir dados em insights, alinhar inovação com necessidades do negócio e adaptar soluções tecnológicas aos desafios da sociedade”.
A ausência de nomes como Washington Olivetto (falecido em outubro de 2024) e Nizan Guanaes provoca um vazio simbólico, como aponta Marianna Souza, presidente da Apro (Associação Brasileira da Produção de Obras Audiovisuais) e gerente-executiva da FilmBrazil.
“O mercado está passando por transformações profundas, e as grandes referências de hoje nem sempre estão dentro das agências. Podem estar em produtoras, big techs ou até em influenciadores. Por anos, a publicidade esteve centralizada nas agências, mas esse cenário está mudando.”
*A imagem no topo é assinada por Carlos Lunetta, diretor-executivo de criação da Oliver: “A ideia é mostrar muitas telas, em cada uma o mesmo Washington Olivetto pasteurizado pelo filtro Ghibli do ChatGPT. Commodity é quando tudo dá na mesma, e o filtro simboliza a pasteurização da criatividade; a sumidade da propaganda pasteurizada pelo filtro e replicado ad infinitum.”
Leia a matéria completa na edição do propmark de 26 de maio de 2025