Em tempos em que a comunicação flui por meio de inúmeros formatos e de facilidade no acesso à informação nunca vista antes, a indústria da mídia passa por verdadeira revolução no que diz respeito à produção e disseminação de conteúdos. Esse movimento traz muitas vantagens, mas, assim como tudo, tem seu preço. E à medida que caminhos nebulosos são seguidos o custo para a sociedade pode ser alto demais.

Estamos em um momento no qual aprendemos a conviver com as informações 24 horas por dia e sete dias por semana em nossas vidas. Temos o impacto da televisão tradicional, rádio, jornal impresso, revista, mídia externa, internet e mídia out of home (OOH). Além disso, hoje, somos capazes de criar, curtir e compartilhar todo tipo de opinião ou ideia de forma instantânea com o uso das redes sociais. Todo mundo virou um veículo de comunicação. Nesse contexto, as possibilidades se abriram para a indústria da mídia e a sociedade, porém, devemos estar atentos às consequências dessa revolução.

Para os anunciantes, que até pouco tempo surfavam na onda das redes sociais, a experiência tem ensinado que nem tudo que brilha é ouro para a publicidade. Foi o caso recente das grandes marcas globais como Volkswagen, Toyota, Tesco, McDonald’s, L’Oreal, AT&T e Johnson & Johnson, que se uniram ao movimento ‘Stop Hate For Profit’ (“pare de dar lucro ao ódio”, em tradução livre). Elas exigiram que o Facebook seja “menos complacente” com mensagens de ódios publicadas na plataforma. Sem dúvida ações como essa trazem queda real nos investimentos no meio e abala a reputação da empresa perante seus anunciantes, algo ainda mais delicado.

Isso também mostra que a credibilidade ainda é um dos principais ativo das marcas junto ao público e associá-las a conteúdos discriminatórios e de qualidade duvidosa pode trazer mais problemas do que novos clientes ou seguidores. Vale reforçar que o Facebook gera 98% de sua receita por meio de anúncios.

Falando em investimentos, a TV aberta continua liderando, com 55%. A internet recebe 22,4% e, em seguida, vem a mídia exterior movimentando 9,4% do total de investimentos, segundo dados do primeiro semestre de 2020 divulgados pelo Cenp (Conselho Executivo das Normas-Padrão), entidade que reúne os principais anunciantes, veículos de comunicação e agências de publicidade do País.

Um detalhe a ser levado em consideração é que a pandemia da Covid-19 faz as marcas controlarem ainda mais seus investimentos. No primeiro semestre deste ano, os gastos com publicidade no Brasil chegaram a R$ 5,7 bilhões. Comparados ao mesmo período de 2019, os números totais sofreram queda de 30% – no ano passado, o investimento em publicidade no período havia sido de R$ 8,2 bilhões, segundo o Cenp.

Ameaças das fake newsCom tantas informações incertas e de fontes duvidosas, chegamos a um ponto de estarmos todos expostos e a mercê de interesses escusos, que em nada se comprometem com valores republicanos da transparência e da verdade. As conhecidas fake news representam ameaça real à democracia, além de constituírem verdadeiro desserviço à população, sem que as gigantes da tecnologia consigam inibir sua propagação.

Ironicamente, nesse momento no qual os brasileiros mais precisam de informação e conteúdos de qualidade para decidir o futuro do País nas eleições, assistimos a uma triste desvalorização da grande mídia e dos verdadeiros profissionais de comunicação por parte da administração pública. Por razões políticas e de share, os gestores distribuem seus investimentos em publicidade sem adotar o princípio da meritocracia para distinguir veículos tradicionais e outros que pouco ou nada agregam ao público.

O acesso à informação é um direito do povo e, por muito tempo, jornais, revistas, TV e rádio cumpriram com essa missão, investindo em equipamentos, boas práticas e profissionais para fazer da qualidade seu principal diferencial para a audiência e os anunciantes.

Os representantes da administração pública, pelas responsabilidades assumidas em manter a população informada com transparência e eficácia, deveriam representar a principal força para evitar esse retrocesso e proteger o valor que a informação tem para a democracia.

Caso contrário, corremos o risco de viver em um mundo como os dos livros de fantasia: repleto de informações, mas alienado da realidade.

Marcello Lopes é CEO da Cálix Propaganda