Comecei a minha carreira de publicitário em 1975. Para você ter uma ideia de como faz tempo, o telefone celular só seria lançado em São Paulo em 1991, 16 anos depois. Apesar de tantos anos passados, tenho muito vívidas na mente, imagens da época.
Fui parar em propaganda por acaso. Ou melhor, por descaso. Sonhava em ser jornalista, tinha verdadeiro fascínio pelos meios de comunicação, principalmente os jornais e as rádios.
Quando crianças, meu irmão e eu, mantínhamos uma emissora doméstica, cuja única ouvinte era a minha avó. Recortávamos os anúncios dos jornais e os líamos, entre uma música e outra, tocada numa rádio de verdade.
E dos mesmos jornais, extraíamos as notícias a que narrávamos com solenidade. Era tamanha a paixão, que cumpríamos um expediente diário, obedecendo a uma programação regular, listada a lápis numa folha de sulfite e colada na parede.
Em compensação, eu ia mal nos estudos. Inclusive, em português. Só graças à redação, alcançava a média necessária para não repetir de ano. Era péssimo em gramática. Coisa que só foi piorando com o tempo, e que cobrou o seu preço nos vestibulares.
Não consegui ingressar na faculdade de jornalismo da Federal, nem da PUC, em Porto Alegre. Fui embora para o Rio. Dividia meu tempo entre o emprego e a retomada dos estudos num curso noturno.
Não durou muito, mas o suficiente para que eu lançasse um jornal, a que nomeei Argumento, impresso em mimeógrafo a álcool. Foi nesse jornal que publiquei o meu texto mais difícil.
Por falta de tempo, tive de escrever o artigo diretamente na matriz que iria rodar no mimeógrafo, ou seja, sem ver o que estava datilografando e sem chance de errar. Deu certo. Confesso, não conheci desafio maior na profissão de redator.
Embora leitor ávido, pressenti que me faltava cultura para o jornalismo. Mas não era só isso: a vocação para a indisciplina e a rebeldia contra o formalismo, me tiravam a necessária humildade para um aprendizado dedicado e, oficialmente, reconhecido.
Foi, aliás, o que me levou para uma espécie de marginalidade chamada propaganda. Qualquer um podia trabalhar em propaganda, não exigia formação alguma.
Se tinha talento para vender, ia para o atendimento; se tinha talento para desenhar, ia para a direção de arte; se tinha talento para escrever, ia para a redação.
O meu primo, Paulo Tiaraju Vieira Aquino, que também não tinha formação universitária, que era admirador dos meus escritos, havia se tornado diretor de criação de uma agência, e me chamou para um estágio.
Foi, então, que descobri que havia como sobreviver escrevendo, sem ser jornalista. E, incrível, de um jeito bem mais fácil. Além de os temas a serem tratados serem rasos, ainda se tinha o direito de chegar tarde, trabalhar de sandálias, vestindo andrajos, deixar o cabelo crescer, ter chiliques...
De manhã, abria o jornal e lá estava, ocupando duas páginas inteiras, alguma coisa escrita por mim. Alguma coisa que era comentada, elogiada e premiada.
Era incrível! 50 anos passados, tudo isso deve estar parecendo um delírio. Concordo, nem eu tenho mais certeza de que foi assim mesmo.
Stalimir Vieira é diretor da Base de Marketing
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