De repente as pessoas se deram conta da fragilidade de supostas conquistas e, analistas de ocasião, dispararam as maiores barbaridades. Numa tóxica mistura de alhos com bugalhos. Como o espaço é limitado, serei o mais conciso possível.

1 – A quebra da Americanas tem tudo a ver com a cultura garantia de ser. De enfiar a faca nos fornecedores até quase estrebucharem. Começou décadas atrás quando o trio elétrico – Lemann, Sicupira e Telles – foi obrigando seus fornecedores a engolirem 30,60,90,120,180 dias para pagarem pelos serviços prestados. No começo, apenas na Ambev. Aí decidiram adotar a mesma política na Americanas, confundido suppliers – fornecedores, com partners, parceiros. Os sellers são parceiros nos marketplaces, e não fornecedores, e assim, o despautério passou a ser maior. Só tamanha ganância não consegue perceber que esfaquear parceiros é fazer sangrar todo o negócio. Cometer suicídio! Mas, não se pode negar que o modelo garantia de ser deu certo até o final do ano passado. Converteram-se nos três maiores bilionários do Brasil, mesmo com tropeções pelo caminho, como o que aconteceu no banco, onde depois de perdas substanciais dos investimentos de alguns clientes famosos passaram a sofrer ameaças; do que aconteceu nos Estados Unidos na gestão da Heinz, e o que agora se sabe vinha acontecendo na Americanas há muitos anos.

2 – Não obstante tudo isso, nada justifica o fascínio que o trio exercia nas autoridades do mercado, nos analistas e fiscais da CVM e da B3, dos analistas e gestores dos principais bancos e fintechs do país. Mas não é de surpreender porque essa galera é louca para se deixar fascinar e fazer-se enganar com “mágicos”. Que o diga o agora falecido “Bernie” Madoff...

3 – Existe uma crise muito maior que não tem nada a ver com o modelo garantia de ser. E essa é grave, vai continuar, e provavelmente grandes organizações do varejo supostamente indestrutíveis irão derretendo de forma rápida e permanente. Algumas conseguirão sobreviver, mas, a maior parte, parte... Estou me referindo a algumas grandes empresas brasileiras, e ícones globais, muito especialmente 25 cadeias de varejo nos Estados Unidos como Macy’s, Frys Eletronics, Stock & Fields, Stage, Francesca, Starbucks, Godiva, Justice, Carter’s, American Eagle, Banana Republic, Fossil, Express, Paper Source, Michaels, Bloomingdale’s, Guitar Center, Century 21, Nordstrom, Kroger, e muitas outras mais... E os culpados, ou a causa maior, somos... Nós!

Nós, consumidores, que diante das possibilidades e facilidades do tsunami tecnológico e das novas e múltiplas formas de comprar, seguimos testando, experimentando e mudando hábitos, preferências e comportamentos de compra quase 24/24. Apenas isso. Crise estrutural. Ainda que fortemente soprada e acelerada pela pandemia.

Sim, muitas dessas empresas, correram para o e-commerce, converteram-se em marketplaces, despontaram na aparência vitoriosa, mas era apenas uma bolha que demorou um pouco mais para eclodir. Esqueceram-se de uma das mais importantes lições de nosso adorado mestre e mentor Peter Drucker, criador da administração moderna e de sua ideologia, o marketing. “Jamais, em hipótese alguma, colocar os novos gadgets e tecnologia, nas velhas molduras que temos em nossas cabeças. Primeiro jogar a velha moldura fora”. O que cá entre nós, mais que difícil, é quase uma impossibilidade. Muito especialmente nas organizações comerciais com 50 ou mais anos. E deu no que deu.

É isso, amigos. Todas teriam que atravessar a ponte. Deveriam proceder como os anjos recomendaram a Ló e sua mulher e filhas. Ló e as filhas obedeceram. A mulher olhou para trás e virou estátua de sal. Apenas isso. Pela incapacidade absoluta de não olharem para trás as estátuas de sal do comércio analógico vão se multiplicando...

Francisco Alberto Madia de Souza é consultor de marketing
famadia@madiamm.com.br