Independentemente da linguagem, o propósito da arte urbana é promover uma aproximação que produza significados ao público, que interage e participa da proposta do artista. Vale ressaltar que essas manifestações artísticas ainda são uma prática social, uma apropriação estética do espaço urbano que pode promover mudanças sociais, interligar e modelar a construção coletiva de uma cidade.
Espaços de interesse coletivo atuam como a principal ferramenta de expressão artística desse movimento, pois eles preservam as histórias do passado.
A série Muro das Memórias, do muralista Eduardo Kobra, cria um ambiente de reflexão e promove uma mensagem importante sobre a preservação do nosso patrimônio histórico. Um outro exemplo é a empena cega, que fica no prédio em frente ao Mercado Municipal de São Paulo, feita pelo artista Mundano. O mural é uma releitura da emblemática obra Operários, de Tarsila do Amaral, e foi pintado com lama tóxica que ainda não foi retirada de Brumadinho. A pintura, de 800 metros quadrados, é uma forma de lembrar e pedir justiça todos os dias.
Em tempos de tantas incertezas, catástrofes naturais, mudanças climáticas, crises sanitárias e atentados aos direitos humanos é o momento em que a arte floresce trazendo esses diálogos ao público e nos faz refletir sobre nosso papel neste cenário. Espaços de interesse social capazes de resgatar memórias negligenciadas, de conscientização, compreensão e manifestação passam a desempenhar um papel ainda mais importante para o futuro de nossa sociedade.
De acordo com um estudo divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) no fim de 2019 e dados contidos no extenso painel lançado em 2020 pelo Observatório Itaú Cultural a respeito do panorama econômico dos setores cultural e criativo brasileiros, fica comprovada a rentabilidade da cultura, demonstrando que existem 5 milhões de pessoas no país que vivem de arte.
A street art e o grafitti são manifestações artísticas que ganham vida nos espaços públicos. A produção é materializada em muros e paredes que compõem o ambiente das cidades através de técnicas diversas, como o uso de sprays, tinta acrílica, colagens, stencil, e por aí vai.
Os artistas urbanos expressam narrativas das cidades, questões diversas que atravessam a realidade social, propondo críticas e reflexões por meio das formas, cores e traços variados. Junto a outras expressões artísticas, a street art ganhou força também por fazer parte da cultura popular do hip hop, que traduz as vivências das ruas por meio da arte. Um dos primeiros trabalhos de desenhos escritos em muros na capital paulista foi do icônico artista Alex Vallauri. A obra intitulada como Boca de Alfinete evidenciou a censura da ditadura militar demonstrando o poder e a importância da arte urbana como ferramenta de comunicação e transformação do ambiente público.
É incrível pensar que, nas ruas de São Paulo, há desde obras consagradas de Burle Marx e Tomie Ohtake e também trabalhos fantásticos de artistas que continuam na ativa escrevendo seus nomes na história, como Os Gêmeos, Speto e tantos outros talentosíssimos artistas que temos vivos e ativos no nosso país.
Para mim, é surpreendente observar um mural e tentar entender os motivos e as mensagens por trás das obras que vemos nas ruas. Isto faz com que eu me sinta mais próximo do espírito da criatividade e, por tabela, dos artistas que foram os autores das respectivas artes. Esta experiência foi um dos motivos que me levaram a trabalhar com esta área. Todo o diálogo urbano fez com que eu construísse dentro de mim a necessidade de, não só tentar compreender este movimento, mas também ser um agente para que esta movimentação cresça cada dia mais.
Rafael de Farias Araújo é head de produção da Dionisio.Ag,