Assistindo à coletiva do técnico Abel Ferreira, após a derrota para o Botafogo, temi pelo futuro do futebol. Dizia ele, candidamente, mais ou menos o seguinte: as equipes ganham títulos e deixam de ganhar títulos, o que não desmente nem desmerece os títulos que já ganharam.
Ou seja, ao longo da história dos clubes e dos técnicos e jogadores, há fases melhores e fases piores e isso acontece com todos.
E deu o exemplo do técnico Guardiola, que terá perdido quatro ou cinco jogos seguidos, e nem por isso se pode dizer que se tornou um mau técnico.
Se esse estado de consciência se disseminar entre torcedores, não haverá mais motivo para vibração ou sofrimento, sequer para torcer. Torcer é, em essência, uma atitude emocional, praticamente irracional.
Se pensarmos um pouquinho, deixaremos de torcer. Porque torcer pressupõe formar uma opinião sobre o que está acontecendo com o nosso time em determinado momento, extravasarmos nossa frustração com um mau resultado, o que inclui criticar jogadores, o técnico e a própria diretoria do clube, não importa quantas conquistas tenham obtido anteriormente.
No momento em que qualquer resultado passe a ser “natural”, por obedecer à dinâmica da existência, a efervescência que envolve o futebol perde todo o sentido. Afinal, ao aceitar-se a “naturalização” dos fracassos, o mesmo deverá valer para as conquistas.
O mesmo Abel, numa coletiva, após vencer uma final, deveria dizer “não vamos nos iludir, hoje ganhamos, mas amanhã poderemos perder, essa vitória não torna sem efeito os jogos que perdemos ou as goleadas que tomamos, nem faz de mim um técnico diferente daquele que sofreu derrotas”. Soaria absurdo.
O que mantém o futebol como entretenimento, paixão e negócio é a irracionalidade, é a avaliação do experimentado no momento, é a sujeição das emoções ao presente, acima de tudo.
O mesmo herói aclamado em coro no estádio poderá vir a ser chamado de burro um dia. Abel, por seus méritos, construiu uma bela reputação, e soube valer-se dela para criar uma aura de vencedor, com grandes benefícios para seu marketing.
Talvez, por isso, os revezes lhe custem, algumas vezes, mais caro do que a outros treinadores, de trajetória e postura mais modestas.
E ele sinta uma enorme dificuldade em acolher críticas particulares, que eventualmente venham a denunciar suas limitações.
Daí, a necessidade de jogar as perdas para a conta do destino ou da estatística ou da natureza. Um discurso que me pareceu completamente destoante com a realidade do futebol.
Aliás, o meu objetivo aqui não foi escrever sobre futebol, mas sobre comunicação, pertinência de argumentação e poder de convencimento.
Não me parece convincente que, em qualquer circunstância que envolva emotividade, a fatalidade das alternâncias promovidas pelo tempo seja uma boa justificativa para fazer aceitar confortavelmente uma perda. Isso vale para o futebol e para quase tudo na vida. Inclusive a morte. Nada mais natural do que ela, mesmo assim, quase sempre “inaceitável”.
Stalimir Vieira é diretor da Base de Marketing
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