Eis que a sua agência saiu do papel. Agora você é um CNPJ. Os primeiros trabalhos começam a sair para a rua. Geralmente são projetos que as agências grandes não querem fazer e você entra nessas brechas para mostrar o talento. Parece até que você vai ser capaz de, junto com os sócios, colocar na rua todas as campanhas sem precisar de muita gente. Nada pode parar vocês. Mas vem a primeira arrebentação: crescer ou não?
As arrebentações são momentos em que você, náufrago na ilha abandonada, se pergunta se consegue passar pelas primeiras ondas para escapar dali ou se entrega ao destino e toma sol na praia. Tanta gente melhor já tentou abrir uma agência independente e precisou fechar. Tantos nomes de rua se arriscaram na mesma aventura. Muitas dúvidas no processo. Claro que não vai dar certo. Mas vai dando e você vai fazendo. Vem uma concorrência e daí sua agência ganha um cliente. Precisa de estrutura para entregar o dia a dia.
Então, você começa num coworking, mas durante poucos meses, pois, se você quiser crescer e ter contas recorrentes, vai precisar estar em algum lugar. Você aluga algo simples e funcional, mas bem localizado. Cresce um pouquinho e daí vem a segunda arrebentação: contratações. Uma pessoa é igual a uma família. Uma família é uma entidade sagrada. E não contrata apenas uma pessoa, mas várias. Você passou uma arrebentação importante. Decide ser agência em vez de um freelancer profissional. Estabelece processos. Entrega mais. Estrutura outras áreas além de criação e estratégia. Agora entrega mídia e dados. E para isso precisa de ferramentas. Você já comprou ferramentas, dashboards, licenças de softwares? Com as contas a pagar aumentando, precisa de mais faturamento. Entra em algumas concorrências.Perde umas e ganha outras. Fecha um outro contrato. Aciona freelas. Logo vocês estão em 20 pessoas. 30 pessoas. Perde uma das contas. Ganha alguns prêmios. Sua agência rompe a barreira da irrelevância. Ganhar prêmios onde todo mundo ganha todo ano é fácil e difícil. Fazer isso em sua agência, enquanto muita gente melhor que você tentou e falhou, é arrebentação. Mais uma. E outra, ainda mais com trabalhos do dia a dia que vão para a rua. Clientes chamam você para apresentações. Sua sede é cool, mas só tem uma casa de banho. Apenas 110 m2, a sede inteira. Cabem 35 pessoas sentadas e uma sala de reunião. Os clientes vêm, mas ainda não fecham. E se for pequena demais para minha conta? – ponderam. Você entende que não existe estabilidade nos negócios. Apenas duas direções para uma empresa: ou você está crescendo ou indo na direção oposta. Entendo bem quem prefere ser consultoria ou boutique. Decidir ser agência e competir com as melhores do mercado (globo) é uma arrebentação que poucos avançam.
“Vamos mudar de sede”. Já somos 40 pessoas dedicadas aos nossos clientes. Você liga para antigos contatos de grandes posições de temporadas passadas e episódios iniciais da série de sua vida e apresenta sua empresa, que começa a ser mais conhecida. E precisa gastar em mais ferramentas: Taskrow, Ibope, ADsolution. E o imposto é presumido quando seria melhor sendo real. Ou vice-versa. Já fez as contas de quanto custam essas ferramentas? Com elas você vai precisar de mais clientes para equilibrar seu custo. Atender o cliente mantendo seu critério criativo. Criar cultura. E lá vem outra onda.
O tempo passa e você toma uns caldos de Nazaré. Cresce mais. Agora são 80 pessoas e áreas completamente estruturadas. Os clientes estão vindo. A sede é bonita e barata, mas a turma não quer frequentar. Preferem ficar em casa online. Você é jogado para trás enquanto seus calções vão para o calcanhar devido à violência da onda. Daí engole o choro com sal, puxa o fôlego, sobe o calção e se joga para ultrapassar o próximo desafio. Quando nota, são 130 pessoas e você tirando o que não sabia que tinha, para colocar onde nem imaginava que funcionasse. Agora sua empresa está entre as 30 maiores do país, mas o mar ainda está revolto e Tom Hanks nos ensina que depois da arrebentação, às vezes, só sobra uma bola de vôlei para conversar. Eu sei, é apenas publicidade, mas eu adoro.
Flavio Waiteman é sócio e CCO da Tech&Soul
flavio.waiteman@techandsoul.com.br