Pessoas comuns, a famosa frase “gente como a gente” e os lugares simples, onde eu considero “o meu lugar”, são literalmente a vida como ela é. Tudo o que os meus olhos conseguem ver são a base para o que minha cabeça sempre está desenhando. Eu sou uma diretora e uma criativa que cria com tudo que eu entro em contato, por isso costumo dizer que minha cabeça está sempre em movimento de criação.
Não tenho grandes teorias para contar o que me inspira, pois eu sou uma pessoa fissurada no simples. Quando eu paro para reparar nas matriarcas do meu bairro, nos domingos de sol nas periferias, no caos no coração do centro da cidade, recebendo milhares de pessoas de outras partes e nas conversas de filas de espera, eu vejo o que me inspira.
Galerias de arte, por exemplo, são excelentes lugares os quais contribuem para uma parcela da minha inspiração, principalmente, quando ali estão artistas negros e periféricos, pois acredito que quase todo artista consome outras artes para poder enriquecer a si e suas obras. Mas, curiosamente, eu já criava projetos, roteiros e imaginava filmes quando adolescente, apenas vendo as coisas como elas eram no dia a dia.
E pessoas emblemáticas e grandes obras me inspiram? Claro que sim! Tenho grandes referências desde meu filme preferido como ‘La Haine’, as estrelas da literatura Machado de Assis, uma música do MC Hariel, a cineasta Adélia Sampaio, o diretor criativo Virgil Abloh, Spike Lee e muito mais.
No entanto, quando reflito no que é o coração da minha inspiração, penso que é exatamente o que eu vi na obra de Carolina Maria de Jesus ou percebi na exposição da Melissa Oliveira (fotógrafa do Dendê), que é arte se manifestando do simples, do visceral, ou seja, da vida em movimento. Elas não precisavam de uma validação da Academia de Letras ou do MAM para ser uma excelente escritora e fotógrafa, elas apenas criaram. E por isso, o que eu acredito que me fascina é o simples, a vida como ela realmente é. Pura e usual!
Eu costumo dizer que se meus olhos fossem uma câmera, eu teria um filme por semana. Por enquanto, acho que só minha cabeça funciona como um HD quase sempre muito quente de tanto pensar e por causa dessas tais inspirações aí: as coisas como elas são. Recentemente, eu tive a inspiração de um curta após passar 20 minutos na feira do rolo do meu bairro, e em 2019 uma iluminação para fazer meu primeiro longa que estou trabalhando sobre uma situação recorrente a periféricos. Veja só, eu comecei no audiovisual em 2014, fotografando o baile funk porque esse movimento mexe comigo. Afinal, é sobre gente como eu nos lugares em que pertenço.
Eu sou uma criativa em busca das expressões e suas singularidades e caso me raptem uma ideia, eu tenho milhões de outras possibilidades. E, para recomeçar um sonho, vou sem medo, pois minhas inspirações são infinitas e em constante movimento.
Fernanda Souza ‘Correrua’ é diretora de cena da DLKTSN