A tecnologia moderna oferece soluções atraentes como computação em nuvem, inteligência artificial (IA) e internet das coisas (IoT), que podem parecer inofensivas. Contudo, por trás dessa aparência de inovação, esconde-se uma operação “invisível” com um impacto ambiental significativo, que pode posicionar as gigantes da tecnologia, conhecidas como big techs, entre os setores mais poluidores nas próximas décadas. Um exemplo disso é a operação dos chatbots de IA, amplamente celebrados, que acarretam riscos ambientais substanciais.
Esses sistemas exigem a modelagem e processamento de imensos volumes de dados para aprimorar suas respostas, o que demanda investimentos massivos em infraestrutura e hardware, incluindo chips semicondutores avançados e plataformas de nuvem para processamento e armazenamento de dados. A computação em nuvem, por sua vez, depende de uma vasta rede de centros de dados para armazenar e processar informações. Esses centros são conhecidos pelo alto consumo de energia e água, para resfriamento dos servidores, e constante atualização dos equipamentos. Com poucos grandes players dominando o mercado de nuvem, como Amazon, Microsoft e Google, a competição para atrair usuários e maximizar lucros torna-se feroz e implacável, com consequências significativas para o meio ambiente. De acordo com o Financial Times, em 2022, a Microsoft aumentou seu consumo de água em 34%, o Google em 22% e a Meta em 3%, em decorrência ao crescente uso de data centers.
A disputa pela liderança em IA é particularmente intensa. Empresas que investem centenas de milhões de dólares em treinamento de IA forçam seus concorrentes a gastar ainda mais ou a abandonar a competição. Contudo, além do custo financeiro, essa corrida deve ser avaliada pelo seu intenso consumo de energia, água e pela geração de resíduos eletrônicos.
Segundo a Agência Internacional de Energia, o consumo de eletricidade pelos data centers pode dobrar até 2026, atingindo 1.000 TWh (terawatts-hora), o equivalente ao consumo de energia do Japão. A empresa SemiAnalysis prevê que, até 2030, a IA fará com que os data centers consumam 4,5% da geração global de energia, em comparação com apenas 1% antes da revolução da IA. Além disso, o uso de água pelos data centers é expressivo, com previsões indicando que a IA pode consumir até 6,6 bilhões de metros cúbicos de água até 2027, quase dois terços do consumo anual da Inglaterra.
Sasha Luccioni, pesquisadora em IA ética e sustentável na Hugging Face, defende uma discussão mais ampla sobre o impacto ambiental da IA. “Se você quer salvar o planeta com a IA, também deve considerar sua pegada ambiental”, afirma Luccioni. “Não faz sentido queimar uma floresta e depois usar a IA para rastrear o desmatamento”.
Para o usuário comum, o impacto ambiental da IA, da IoT e da computação em nuvem é invisível. É mais fácil perceber o dano ambiental causado por carros ou pelo lixo doméstico do que o impacto da tecnologia digital. Um estudo da Universidade do Colorado Riverside e da Universidade do Texas em Arlington revelou que uma conversa de 20 a 50 perguntas com um chatbot de IA pode consumir o equivalente a uma garrafa de água de 500 ml. Embora essa quantidade pareça pequena, a pegada hídrica total é significativa, considerando o número global de usuários de ferramentas como o ChatGPT.
O lado oculto da vida online, em um mercado dominado por grandes corporações, é o risco crescente de greenwashing. O impacto ambiental desse setor lucrativo e necessário demanda uma atenção urgente de reguladores, governos e da sociedade civil.
Ricardo Esturaro é escritor, administrador de empresas e especialista em marketing, estratégia e sustentabilidade