No evento de abertura de Cannes Lions, o VP de Marketing da Apple explicou sobre as inovações que foram feitas e que a criatividade humana é a principal arma contra os algoritmos no painel 'Human after all'.
A diferença de como poderíamos melhorar a vida humana com a tecnologia 20 anos atrás e hoje é brutal. Temos meios e ferramentas muito mais ativos para transformar acessibilidade em cases de sucesso - como a Apple trouxe de exemplo com seus novos AirPods que também são aparelhos auditivos agora.
De nada adianta a criatividade e a tecnologia, se não temos o toque do sentimento, da paixão e da angústia que identifica as necessidades que a gente tem como ser humano para supri-las. E a Apple usa justamente a IA para potencializar essas novas descobertas de necessidade e efetividade.
Enquanto isso, um pouco mais afastado dos palcos principais, aconteceu uma conversa um pouco mais específica sobre IA aplicada em frameworks de marketing digital. Ainda vemos pouco sobre DTC creative strategy em Cannes, mas aos poucos estamos representando cada vez mais as conversas dos bastidores e fundadores de empresas que faturam de dez a cem milhões de dólares por mês.
Na casa chamada Darkroom, Max Satter (CEO da Unveild) liderou o painel sobre AI no E-commerce com Rishabh Jain, CEO da FERMÀT, Robert Sieh, CEO da Reach Faster, e Josh Bowen, CEO da Sotto - empresas do ecossistema DTC internacional.
Formada principalmente por startups, esse ecossistema tem equipes mais enxutas e tomadas de decisões muito mais aceleradas, logo, implementar a inteligência artificial nos processos é muito mais fácil.
Um dos tópicos mais fomentados é acerca da implementação de IA nos processos de creative strategy, que envolve pesquisa, roteirização, produção e gestão de anúncios online para estratégias de growth.
O primeiro lugar que a inteligência artificial toca nesse processo é a parte de pesquisa, potencializando como profissionais de marketing encontram informações relevantes para suas audiências e utilizá-las em anúncios. O uso de prompts para avaliar pesquisas de formulários ou entrevistas em profundidade e clusterizar e semantizar as informações para a tomada de decisão criativa, é o passo número um para otimizar a roda criativa dessas equipes.
Logo depois vem a produção de conteúdo. Antes, um processo que envolvia enviar produtos para um criador, esperar a entrega e a gravação, hoje pode ser gerado em poucos minutos através de fotos do produto. De imagem para vídeos. De um criador para reprodução em massa de avatares segurando produtos que nunca usaram, mas que você não precisa mais solicitar e rodar todos os vídeos a cada novo roteiro e briefings, uma vez com os materiais base do criador ou do executivo, você reproduz seu áudio, vídeo e materiais em escala. E isso, é claro, inicia toda uma nova discussão sobre contratos de direitos autorais e relacionamento entre marcas e criadores.
O mais complexo, e ainda possivelmente mais impactante, é a criação de agentes de análise e tomada de decisões, que são alimentados pelo processo de pensamento do estrategista e reproduz as possíveis alavancas de crescimento e peças para interação.
Cada vez mais copywriters e estrategistas estão perdendo esse posto operacional para a IA, mas ganhando novas frentes na parte de relacionamento com o cliente, contato com o consumidor final e tendo mais recursos para investir em pesquisa de entendimento do usuário.
E por mais que aos poucos a IA venha se implementando em todas as etapas desse processo, ainda é preciso um orquestrador. Profissionais da equipe que leiam os insights, tomem as decisões e garantam que os times de criação e pós-produção estejam alinhados e entreguem os materiais finais para o de performance ou de marca.
A inteligência artificial no processo criativo é um dos principais caminhos para fazer com que os times de growth e performance conversem cada vez mais e estejam alinhados nas estratégias de crescimento.
É interessante enxergar a diferença de aplicação entre empresas mais robustas e empresas mais ágeis - onde as camadas de tomada de decisão acontecem de forma que muitas vezes, atropelam as consequências morais, mas com uma capacidade de implementação invejável.
O que está acontecendo por trás dos palcos?
Enquanto os profissionais de marketing aproveitam a tecnologia para otimizar os seus processos, desde criadores de conteúdo até usuários comuns da internet encontram novas oportunidades de monetização.
Por exemplo, não é novidade que existem perfis nas redes sociais digitais que falam sobre distintos assuntos que não necessariamente possuem uma imagem de pessoa por trás, certo? Produzem conteúdo de memes, vídeos e cortes de outros formatos. Com a inteligência artificial como ferramenta, agora essa produção consegue ser feita em escala.
Somando a isso, com a popularização de plataformas de shop commerce e gestão de afiliados como TikTok Shop, que aumentam a possibilidade de monetização direta do conteúdo por venda e comissão, milhares e milhares de contas são criadas com conteúdo sendo publicado em massa para alimentar um algoritmo mecânico, gerar atenção, e por fim, vendas para produtos afiliados - uma vez que as visualizações em massa com o link de produto levando direto pro checkout se traduzem em vendas, por mais que não tenham a mesma força de uma comunidade.
No lado dos creators, enquanto o trabalho de um criador e um influenciador que têm relacionamento com uma comunidade e podem colocar discussões em circulação com sua influência continuam a salvo, os criadores UGC e demais áreas da produção de conteúdo que oferecem assets de mídia já estão sendo diretamente afetados.
Marcas estão criando deep fakes e multiplicando os vídeos e áudios dos criadores de conteúdo, sem sua permissão. E pior, plataformas como Hey Gen, ArcAds e Creatify estão possibilitando a geração de personagens artificiais dando depoimentos e fazendo reviews sobre um produto que nunca usaram, minando o relacionamento de confiança com consumidores.
Eu vivo uma eterna batalha entre estar na vanguarda das plataformas e ferramentas de marketing e o meu lugar de educador, que precisa comunicar e implementar essas inovações, mas ainda assim, trazer o impacto social que cada uma delas abarca. Afinal, a tecnologia avançava muito mais rápido do que a regulamentação.
Danilo Nunes é professor, pesquisador e sócio-responsável pela frente de Creative Strategy da Thruster