O centro da produção audiovisual mundial está em transformação. Hollywood, historicamente a “meca” do cinema e das grandes séries, vê seu protagonismo ameaçado por um fator decisivo: o dinheiro. Não o volume de recursos disponíveis, que continua imenso, mas, sim, onde ele é melhor aproveitado. Cada vez mais produções têm sido levadas para locais que oferecem algo valioso, como incentivos fiscais robustos, infraestrutura moderna e um ambiente regulatório mais leve.
Hoje, países como Canadá, Reino Unido, Austrália e Hungria disputam as grandes produções com vantagens competitivas bem definidas: reembolsos fiscais de até 40%, subsídios regionais, bônus por contratação local e facilidade de licenciamento. Nos Estados Unidos, estados como Geórgia, Novo México e Nova York atraem estúdios com programas que devolvem até 30% dos custos. O impacto disso é visível. Só em 2023, a Geórgia recebeu mais de 390 produções audiovisuais, gerando US$4,1 bilhões em retorno para a economia local.
O Brasil, embora fora dos grandes rankings de destino para produções internacionais, tem avançado em iniciativas semelhantes, ainda que de forma tímida e irregular. Leis como a Lei do Audiovisual (Lei 8.685/93) e os mecanismos de renúncia fiscal via Artigo 1º-A possibilitam que empresas privadas invistam em projetos audiovisuais com abatimento de até 100% do valor investido no Imposto de Renda. Além disso, estados como Rio de Janeiro, Pernambuco, Bahia e São Paulo possuem fundos e editais regionais que complementam esse ecossistema com aportes públicos ou mistos.
Produções internacionais já exploraram esse cenário. O longa-metragem "Rio", da Blue Sky Studios, utilizou parcerias locais e benefícios indiretos de marketing para ambientar a narrativa na cidade maravilhosa. Mais recentemente, a coprodução internacional “Marighella”, dirigida por Wagner Moura, também utilizou recursos públicos viabilizados por meio de editais e leis de incentivo. Séries como “Coisa Mais Linda” (Netflix) e “Dom” (Amazon Prime Video) são exemplos de como o Brasil pode aliar talento local, narrativa global e captação estruturada para atrair olhares estrangeiros.
O problema? A instabilidade. A ausência de uma política nacional consistente de atração de filmagens, como um programa federal permanente de cash rebate, impede que o Brasil entre de vez na rota das grandes produções. Enquanto isso, países latino-americanos como Colômbia, República Dominicana e Uruguai vêm colhendo frutos ao adotar justamente essa estratégia. A Colômbia, por exemplo, lançou um sistema de reembolso de até 40% para gastos com produção no país, e viu um aumento de 300% na chegada de produções internacionais nos últimos cinco anos.
Hollywood é hoje uma ideia romantizada, infelizmente. Tudo muda, e estamos vendo ela deixar de ser nosso grande polo produtor para ser lembrado apenas como o berço do nosso cinema. Essa mudança profunda oferece ao Brasil, e a agentes estratégicos como a Brada, uma janela real de oportunidade. Ao se posicionar como facilitadora de produções, seja oferecendo serviços, infraestrutura, know-how, seja atuando como ponte entre investidores e produtoras, empresas brasileiras podem ocupar um espaço ainda subutilizado. O talento técnico existe. As paisagens são incomparáveis. O apelo cultural é forte. O que falta, de fato, é o ambiente.
Cabe ao setor público criar um programa nacional de incentivo direto à produção estrangeira no país, nos moldes do que fazem concorrentes globais. E ao setor privado, se articular para oferecer soluções completas, do planejamento à entrega, que respondam aos anseios de um mercado em transformação.
O Brasil tem o que o mundo procura, diversidade cultural, cenários únicos, mão de obra qualificada e criatividade abundante. Com os incentivos certos, pode não apenas atrair investimentos externos, mas fortalecer toda uma cadeia produtiva nacional, que vai muito além do cinema e alcança turismo, tecnologia, educação e imagem internacional.
Vanessa Pires é CEO da Brada