Se eu tivesse de escolher uma nova profissão, seria conversadeira. Sim, você leu certo: conversadeira. E antes que você pense que é só uma forma de dizer que gosto de falar muito, deixa eu explicar. A palavra “conversar” vem do latim conversare, que significava conviver, estar junto, relacionar-se. Com o tempo, passou a significar também trocar palavras e dialogar.
E é exatamente isso que me move: apoiar a criação de espaços de conversa que conectem pessoas. Nada me inspira mais do que ver, aos poucos, as empresas começando a entender a importância de abrir espaço para o diálogo — um espaço vivo de inteligência coletiva, onde as pessoas possam não apenas falar, mas ouvir e se transformar juntas.
E não estou falando aqui das conversas formais sobre metas, projetos ou resultados.Falo daquelas conversas que tocam dilemas, inquietações e desafios humanos, que todos vivemos em nossos papéis profissionais — especialmente os que envolvem relações de trabalho. Há mais de 30 anos atuando com seleção, coaching e mentoria de executivos, comecei a perceber, especialmente nos últimos dez anos, algo recorrente: as pessoas estavam infelizes. Não com o que faziam, mas com o ambiente em que faziam. Ambientes frios, hierárquicos, competitivos — onde as relações eram superficiais, os silos imperavam, e a criatividade era sufocada por metas individuais.
Fiquei intrigada. Porque entendi que esse modelo empobrece não só o clima organizacional, mas as possibilidades de inovação. Afinal, o novo raramente nasce da cabeça de um único gênio. Ele emerge do encontro — quando pessoas abandonam julgamentos e se abrem, com curiosidade, para ouvir o outro. Foi aí que decidi me aprofundar. Aos 60 anos, voltei a estudar. Foram três anos de especialização em práticas de colaboração e diálogo.Enquanto eu estudava, o mundo do trabalho mudava — e rápido. Empresas começaram (ou foram forçadas) a repensar suas culturas: passaram a buscar ambientes mais saudáveis, emocional e socialmente, e lideranças menos baseadas em comando e controle. O que precisamos agora são líderes que escutam, têm genuíno interesse pelo que os outros pensam, aceitam o erro como parte da jornada e estimulam o pensar diferente, criando ambientes de confiança e colaboração.
Foi nesse contexto que decidimos, na nossa consultoria, reestruturar os programas
de desenvolvimento de pessoas e equipes. Deixamos de lado os modelos tradicionais — onde um especialista fala e a plateia escuta — e criamos a abordagem que batizamos de COMversas. Nas COMversas, os participantes são convidados a trazer seus dilemas e inquietações — aquelas que não estamos habituados a compartilhar no ambiente corporativo e a aprender dos modos de ser e fazer dos demais e, é claro, assim, ampliam seu repertório e visão de mundo.
E sabe qual é o ingrediente-chave nesse processo? A curiosidade. A curiosidade é o antídoto do julgamento precoce. É ela que nos permite ouvir o que é diferente, o que nos causa estranhamento, sem querer rotular ou rebater logo de cara. Aliás, deixa eu corrigir uma coisa aqui: Essa história de que a curiosidade matou o gato é uma das maiores fake news da história.
A expressão original, lá no século 16, era “Care killed the cat” – ou seja, “a preocupação matou o gato”. A forma atual só surgiu no século 19, já distorcida. E agora, no século 21, vamos combinar: aquela máxima de “cada um no seu quadrado” já não serve mais. O novo só surge quando estamos juntos — misturando nossos saberes, nossas dores, nossos talentos. É nas COMversas que isso acontece.
Jacqueline Resch é consultora em recursos humanos e conselheira da ABRH-RJ