O Brasil é grande. Tem extensão de continente e realidades regionais bem particulares. Poucos são os brasileiros que conhecem de norte a sul e de leste a oeste o país onde vivem. Afinal, não é tarefa fácil circular por vastos 8,5 milhões de quilômetros quadrados. Algo inatingível até mesmo para a Caravana Rolidei, celebrizada no filme Bye Bye Brasil que o criativo Cacá Diegues lançou em 1979.

Nas telas, a trupe liderada por José Wilker e Betty Faria rodou mais de 8 mil quilômetros por estradas precárias e rotas improváveis, desvendando um Brasil de rincões esquecidos e que ainda estava acordando para a modernidade. Bem, felizmente para as áreas comerciais dos veículos de comunicação estabelecidos no país aquela realidade não é mais a mesma. Mas surgiram naturalmente novos desafios.

O primeiro deles é entender que muito mais bocas disputam cada mordida na pizza do anunciante. Constatação que, de tão óbvia, nem sempre é lembrada. Nos tempos em que a Caravana Rolidei cruzava as estradas esburacadas das regiões mais inóspitas do país, e por pelo menos nos 20 anos seguintes, canais de televisão, emissoras de rádio, jornais e revistas se refestelavam nas verbas de publicidade liberadas pelas grandes empresas. Revistas semanais chegavam a circular com até 200 páginas e 800 mil exemplares impressos a cada edição, o Estadão dos domingos era um jornal gorducho por conta das centenas de anunciantes, as emissoras de rádio tinham verbas para coberturas por todo o planeta e as (poucas) redes de televisão nadavam no mar da opulência irrigado pelas façanhas das áreas comerciais. Mas a era das grandes fatias dessa pizza acabou.

O ecossistema formado pela mídia tradicional ganhou novos players desde o final da década de 90. Primeiro foram os canais a cabo. A Pay TV rapidamente se multiplicou, com ampla oferta nos segmentos notícias, esportes, filmes e seriados, o que acirrou a disputa por anunciantes interessados no público A/B. Mais tarde, vieram os veículos de mídia indoor e os digitais, de rápida proliferação e irresistível sedução. E de uma década para cá, o streaming mudou hábitos de forma implacável.

Na nova realidade, a pergunta óbvia é a seguinte: o ônibus do mercado publicitário tem assentos para todos os interessados? A resposta mais sensata diante dessa dúvida é “depende!”. É fato que grandes bancos, redes de varejos ou fabricantes de automóveis continuam gastando bastante para expor suas marcas. Só que o rateio das verbas de marketing contempla muito mais bocas. Logo, todo mundo come menos. Então, o regime indesejado será cada vez mais a realidade para todos os glutões do mercado de comunicação? É claro que não.

Um laboratório farmacêutico instalado em Tocantins quer vender seus remédios para consumidores de todo o país e não apenas em seu estado. Imensos grupos varejistas que nasceram em cidades do interior do Paraná, Santa Catarina ou em municípios de estados do Nordeste estão agora se instalando nas capitais. Mas as equipes comerciais dos veículos de comunicação estão captando esses movimentos? Quais foram as campanhas de mídia produzidas por Enauta e PetroRecôncavo, duas petroleiras juniores que lucram alguns bilhões cada? E quem anda veiculando anúncios dos gigantescos projetos de hidrogênio verde, energia eólica ou de produção de gás no Rio de Janeiro?

Outro dia assisti em emissora do interior de São Paulo a uma entrevista do executivo principal da construtora Pacaembu, com projetos em 50 cidades! Nunca vi nada deles em veículos nacionais. Não faz muito tempo o jornal O Estado de São Paulo publicou reportagem que exibia uma arte batizada de “Clube do Bilhão”. O trabalho tratava de grupos varejistas tão bilionários quanto pouco conhecidos e praticamente anônimos nos grandes veículos. Mas quem é que está negociando ações de mídias com eles?

Ano passado, vi em Lisboa táxis rodando com anúncios sobre o turismo em Maceió. Um golaço da capital alagoana, pouco reproduzido nos nossos veículos mais tradicionais. Não há desculpa que justifique o descuido em relação aos novos players de uma economia que viceja em polos distantes do eixo Rio-São Paulo e das maiores metrópoles. O mercado oferece cada vez mais ferramentas que ajudam a mapear onde e quem está gerando dinheiro novo.

Com mais tecnologia, criatividade e, sobretudo, disposição é bem possível buscar o dinheiro de quem cresceu ainda sem aparecer. Mas para tanto, é preciso sair da zona de acomodação da busca pelas agências e anunciantes de sempre. A velha Caravana Rolidei pode ser a inspiração. Como ela, rodar e redescobrir o Brasil para farejar novos públicos e oportunidades pode ser o caminho.

Fábio Piperno é jornalista e comentarista da Jovem Pan