Os produtos e serviços voltados para a população negra têm crescido no Brasil e a pauta racial está cada vez mais em destaque na comunicação das empresas. Há um movimento de conscientização crescente impulsionado por diversos fatores, como a pressão da sociedade civil, a compreensão de que a diversidade é um ativo estratégico para os negócios, e o potencial mercadológico da população negra, que movimenta R$ 1,46 trilhão anualmente, com características e preferências de consumo específicas.

Mas, apesar do avanço da agenda racial, ainda há muitos desafios a serem superados na abordagem sobre o tema. Um dos principais obstáculos é a complexidade de tratar questões raciais e a obrigação de explicar o que deveria ser óbvio. Mesmo com boas intenções, estereótipos são reproduzidos nas mais variadas formas com a utilização de linguagem inadequada. De acordo com pesquisa realizada em 2020 pela Potências (in)visíveis, Box1824 e Indique Uma Preta, 58% das mulheres ouvidas já escutaram piadas relacionadas a cor, cabelo ou aparência, 49% já se sentiram desqualificadas profissionalmente, mesmo tendo toda formação necessária para ocupar tal espaço, 37% tiveram a opinião ou ideia silenciada - enquanto o posicionamento de pessoas brancas era ouvido e valorizado, e 44% já se sentiu constrangida com alguma piada.

A Escola de Marketing Antirracista (EMA), iniciativa da Unilever Brasil, é mais um passo no compromisso contínuo da companhia com a agenda racial. A ação pioneira tem o objetivo de formar o seu time de marketing e ampliar a visão e percepção sobre o “Brasil real”, considerando que hoje mais de 50% da população do país se autodeclara negra. O programa tem uma abordagem inédita, que revisa toda a cadeia do marketing sob a ótica antirracista, e compreende desde a valorização das negritudes, antropologia do consumo, semiótica, pesquisa e desenvolvimento de produtos, relacionamento com comunidades até a comunicação nos pontos de venda. Desenvolvida e liderada por um squad multidisciplinar de profissionais Unilever, em parceria com a Indique Uma Preta e a Oliver Press, o objetivo de EMA é impactar de forma positiva o mercado e a sociedade como um todo. Durante oito meses, entre março e novembro deste ano, cerca de 350 funcionários da Unilever, da estagiária à CMO de cuidados com a casa, Giovanna Bressane Gomes, frequentaram as mais de 40 horas de aula da EMA. Dentre os mais de 30 profissionais envolvidos no curso, havia professores de grandes universidades do Brasil, além de nomes relevantes na agenda racial brasileira, como Luana Génot, fundadora do ID_BR; Felipe Silva, fundador da Agência Gana; Fernanda Ribeiro, CEO da conta Black; Thais Bernardes, fundadora e CEO da Notícia Preta; e a atriz Taís Araújo.

A partir da EMA, queremos ampliar o repertório sobre questões raciais e de ancestralidade africana no marketing do Brasil. A companhia entende a responsabilidade e a urgência de estar em sintonia com as demandas da sociedade, uma vez que está presente em 100% dos lares brasileiros. A intenção é usar a força das mais de 30 marcas – entre elas Dove, Rexona, OMO, CIF e Hellmann’s –, para promover uma comunicação cada vez mais diversa, relevante e autêntica em toda a cadeia do marketing e transformar o mercado. A formatura da primeira turma está prevista para os próximos dias, mas a EMA já vem influenciando em ações concretas nas quatro divisões de negócios da Unilever – Beleza & Bem-Estar, Cuidados com a Casa e Roupas, Nutrição e Cuidados Pessoais – por meio do desenvolvimento de campanhas com maior diversidade de vozes e representatividade, além de um olhar cuidadoso para o impacto das mensagens nas diversas audiências.

É o caso do Tudo Pra Creator, iniciativa que vem atuando como uma aceleradora na formação de micro e nanoinfluenciadores de beleza. Por meio de uma plataforma digital de estudos e gratuita, mais de 10 mil pessoas da comunidade negra vêm buscando se profissionalizar na produção de conteúdo. À frente do projeto, a unidade de negócio de Beleza e Bem-Estar da Unilever chegou a anunciar que, desde julho de 2024, 100% das campanhas das marcas Dove, Seda, Tresemmé e Clear passaram a incluir, em diferentes frentes, criadores pretos e pardos participantes do Tudo Pra Creator. A comunicação inclusiva é um eixo transversal entre as áreas de comunicação e diversidade, e uma ferramenta poderosa para desafiar as narrativas racistas e promover uma mudança de mentalidade.

No entanto, é uma iniciativa que transcende a correção política e histórica ou um valor a ser defendido. Estamos falando de um mercado composto por 114,8 milhões de pessoas negras comprando anualmente – mais que toda a classe A, segundo dados do Movimento Black Money. A educação antirracista ainda se mostra essencial na construção de uma sociedade mais justa, mas a EMA também evidencia a necessidade de uma estratégia empresarial vital, urgente, legítima e intencional. Estes são os maiores legados na cabeça e na jornada dos marketeiros da Unilever, um imperativo de mercado que impulsiona a inovação, já que estar às margens desta conversa é perder muito mais do que oportunidade e relevância.

Luana Pereira é gerente de marketing global de Dove