Na premiação mais tradicional e criteriosa do mundo da publicidade, o aparecimento desse novo braço significa que a tendência das agências independentes em todo o mundo começa a se consolidar como um movimento e uma opção real para as grandes marcas. E agora a coisa muda. É a valorização do ser independente. O que existe hoje é uma festa de Golias onde de vez em quando se destaca um Davi. A Tech&Soul já foi top 3 de agências independentes de Cannes em 2019. Agora, a proposta parece ser outra. Surge um pensamento de mercado para as indies.
Se prêmio não fosse bom, não existiria cerimônia do Oscar. O bom senso criou o Sundance Festival e não podemos esquecer que sempre teremos o Festival de Cinema de Veneza para o diferente. Mas tudo é indústria e na publicidade pode ser assim também. Para uma agência independente, o prêmio tem sido, antes de tudo, um selo de qualidade que envolve originalidade, entrega e craft. Ou seja, “a sua agência gigante tem e eu também tenho. Vamos falar de trabalho? Quero a sua conta”.
A tendência de valorização das agências independentes começa a se solidificar. O primeiro festival de agências independentes que conheci foi o Small Agency of the year, da Ad Age, que a Tech&Soul ganhou três vezes. A primeira, em 2020, como Agência Internacional, ao lado da Uncommon de Londres. A segunda, em 2021, como Agência de Experience, junto com a Mischief NY, e este ano com Prata em Campanha do Ano para a revista Unquiet, também junto com a mais nova leva de independentes. O festival ocorreu na cidade de Toronto e o clima era mais de camaradagem e de troca de experiências, bem diferente do “resta um” atual.
Colocar a atenção nas indies é voltar a focar em criatividade e tirar o foco do financeiro. Significa apostar em senioridade, em craft, em técnica e em criatividade com resultados. É menos sobre o uso de dados como a única resposta e mais como uma das ferramentas úteis para que a comunicação aconteça com emoção.
E por que o festival precisa ser diferente? Porque fundar uma agência do zero, com investimento próprio e ir crescendo, campanha após campanha, lhe dá centenas de histórias profissionais e pessoais interessantes. É ser criativo e empreendedor ao mesmo tempo. Isso é ser indie. Desenvolver talentos e ter faro para contratá-los antes mesmo de estarem maduros, é ser indie. Sair do ensaio da garagem para o Madison Square Garden sem perder a afinação e o repertório próprio, é ser indie.
A responsabilidade em tocar um negócio e cuidar das pessoas nos dá traquejo de empreendedor tarimbado. Tem dono. Alguém se responsabiliza. Um festival para as agências independentes precisa saber tudo isso. E o que mais gostei é que o júri vai ser feito por profissionais de agências independentes. Afinal, são elas que têm apenas o trabalho do dia a dia para inscrever, já que cada inscrição é um esforço financeiro enorme. Esse novo olhar das premiações como Ad Age e The One Show mostra um lugar diferente, uma nova oportunidade, que caminha na contramão da operação financeira que o negócio da criatividade se transformou.
A criatividade precisa ser corajosa, rebelde, mas profundamente técnica. Precisa dizer não. Ser esquisita. A atenção é quase o santo graal da modernidade e o foco não pode ser o próprio negócio da agência. Precisa ser o negócio do cliente. É difícil, mas só as independentes podem se dar ao luxo de ser assim.
Também tenho defendido muito para as agências independentes esses novos “selos de qualidade” como Lürzer’s Archive, Cresta, New York Festival, PhenX, além das editorias e escolhas em sites onde todos acessam referências, como Adforum, GoldenDrum, Art&Communication, Shots etc. O The One Show Indies foi anunciado como uma rebeldia. Envelheceu automaticamente o mainstream. É a categoria Davi, dentro do mundo dominado por Golias. E o anúncio diz claramente isso. “The One Show Indie foi elaborado para agências independentes que criam trabalhos poderosos sem depender de orçamentos ou políticas corporativas”. Após a Advertising Age e o The One Show apontarem o caminho, resta aos donos das grandes marcas e CMOs olharem esse movimento como uma tendência e não como uma aposta. E convidarem cada vez mais agências independentes para suas contas. Afinal, quem quer um Golias na sala?
Flavio Waiteman é sócio e CCO da Tech&Soul
flavio.waiteman@techandsoul.com.br