Sou do tempo em que ganhar a conta de uma, bem não vou dizer de que segmento para não identificar ninguém em particular, mas, enfim, sou do tempo em que pegar certas contas era a glória da criação. Mesmo em agências grandes, lamentávamos, muitas vezes, que as marcas concorrentes daquele setor eram poucas, e já estavam distribuídas em outras agências.

Quem é de criação sabe muito bem que a conta de uma, não posso falar, não quero criar constrangimento, era uma delícia de trabalhar porque os briefings desse tipo de negócio nos davam asas à imaginação, permitia que a gente viajasse nas ideias.

Lembro bem da ocasião em que a DPZ ganhou a conta de uma multinacional do segmento. Foi uma festa. O que gerava de títulos inteligentes e roteiros brilhantemente criativos, era uma maravilha.

Mais tarde, ganharia outra, brasileira, em que os profissionais da agência tiveram a oportunidade de demonstrar todos os seus talentos, tanto no desenvolvimento das campanhas, como no desenho da logo e de toda a programação visual do produto, trabalhos premiadíssimos.

A W, ainda GGK, herdou uma dessas contas e fez história com anúncios antológicos, que ajudaram muito a impulsionar o início da agência.

Mesmo na minha pequena agência, tive a sorte de trabalhar para uma empresa pequena do ramo e, com ela, consegui ganhar vários prêmios e até a proeza de ser finalista em Cannes.

Ou seja, são contas a que ansiávamos trabalhar um dia, nos realizarmos profissionalmente e sermos felizes de verdade, trabalhando para elas. Por isso, me incomoda tanto que, hoje, uma conquista desse significado não repercuta seu potencial criativo no resultado do trabalho; me choca que a chance de brilhar se perca na opacidade de uma proposta insossa.

Não aceito que o comercial da campanha de uma, não vou falar, não quero prejudicar ninguém, seja apenas um amontoado de cenas absolutamente lugares-comuns (ainda que bonitos).

Não posso concordar que o jingle da campanha de uma, me contenho e não revelo, tenha uma letra tão ingênua e previsível, parece que feita para se livrar do job. Juro que fico até com raiva de saber que muita gente hoje não consiga identificar a pepita valiosa que tem na mão, quando recebe a tarefa de criar para uma, deixa pra lá, não importa revelar.

É impressionante o que anda faltando de tesão nos nossos criativos para lidar, talvez, com a mídia convencional. É impressionante o quanto se perdeu a percepção do significado de uma veiculação em horário nobre da tevê.

Lembro que varávamos noites para não deixar escapar a chance de termos como palco um intervalo comercial de grande audiência, e ali expormos, orgulhosos, toda a majestade do nosso talento.

É triste ver como tudo virou mera burocracia, sem vida, sem arte, sem desejo.

A ponto de dispormos da glória de ganhar a conta de uma, isso mesmo, queridas leitoras e queridos leitores, a conta de uma, uma tremenda conta de uma, uma fantástica conta de uma, e venhamos a cometer o desperdício de, na hora de criar, simplesmente ligarmos o piloto automático.

Stalimir Vieira é diretor da Base de Marketing
stalimircom@gmail.com