Para não ser preso por vadiagem, aceitei que me contratassem, remotamente, como redator de mídia digital. A grana não é nenhum espetáculo, mas está pagando o meu exílio à beira-mar, na Enseada da Pinheira, em Santa Catarina.

É a minha estreia no digital. Como não tenho de planejar nada, porque o job é apenas transformar num texto razoavelmente inteligente alguma ideia pensada por outrem, estou me saindo bastante bem.

Achei que o fato de o meu chefe sentir necessidade de sempre fazer algum ajuste em mais da metade do que escrevo seria algo negativo, mas descobri que não.

Segundo ele, os pequenos ajustes se dão por eu ainda não estar familiarizado na prática desse padrão de linguagem, e, portanto, sou passível de cometer erros na forma.

Longe de incomodar, isso me deixa bastante confortável, por compreender, enfim, que o que a mídia digital quer de mim é o que eu tenho e ela não.

Ou seja, embora meu chefe tenha de fazer correções em grande parte dos títulos e textos, ele não faz questão nenhuma de que eu tente me corrigir sozinho naquilo em que ele é melhor do que eu. Faz todo sentido.

O fato é que a uma redatora ou a um redator cabe, em primeiro lugar, se utilizar de sua bagagem de conteúdo para recriar a formulação de uma ideia, a partir de insights particulares ou originais. A solução que vale ouro é aquela que talento e experiência somados fazem brotar. Sendo suficientemente boa, sobreviverá às adaptações que cada meio exigir dela. Sempre vale lembrar que na mídia convencional, um bom conceito já servia para comercial de TV, spot de rádio, anúncio de revista ou jornal, outdoor etc., cada um no seu formato.

Sempre me saí melhor na mídia impressa do que na chamada mídia eletrônica, mas o conceito que havia criado ia bem em ambas. Um pouco antes de me afastar do cotidiano das agências, acompanhei o trabalho de gente dedicada ao meio digital.

Observando com atenção, me pareceu que os profissionais do ramo operam de maneira, digamos, semiautomática, quero crer que premidos por ter de dar conta da tarefa de redigir em escala industrial.

Diante de tamanha pressão produtiva, é natural que se desenvolvam técnicas que contribuam com soluções rápidas, baseadas em modelos testados.

São códigos de redação que, num instante, situam o leitor sobre o que está sendo anunciado e em que categoria promocional deve ser percebido o anúncio. Porque ali não se está construindo nada paulatinamente, mas promovendo estímulos a respostas imediatas.

Na mídia digital, o processo criativo não deve se ocupar com propostas que exijam tempo e disposição para qualquer exigência de decifração. Daí, provavelmente, tamanha recorrência a padrões nas mensagens e uma certa restrição de vocabulário.

O grande desafio para um redator veterano, estreante no digital, é não se meter de pato a ganso e aceitar que não deve tentar “imitar” um profissional forjado nessa linguagem. Deve, sim, oferecer matéria-prima de qualidade, para ser usada in natura ou no preparo de alguma peça. Para mim, que me sinto desobrigado de vender o que não tenho para vender, está sendo tranquilo. Melhor ainda: está sendo divertido. Será que é porque é remoto?

Stalimir Vieira é diretor da Base de Marketing
stalimircom@gmail.com