De cada 100 agências de publicidade brasileiras, 85 têm CEOs homens. O dado consta do relatório“Publicidade Inclusiva”, produzido pelo Observatório da Diversidade na Propaganda (ODP). Tamanha desigualdade se reflete nas próprias campanhas: as mulheres participam de boa parte, 88%, mas geralmente no papel de esposas, mães ou avós. Aparecem muito mais em ações que se passam na cozinha do que em ações ambientadas no trabalho.
Em apenas 3,6% dos casos são retratadas como atletas, em 3,4% como pesquisadoras das áreas de ciência, tecnologia, engenharia e matemática, e apenas em 2,5% dos casos como donas de empresas, segundo um levantamentorealizado pelo movimento SeeHer em parceria com a Ipsos.
O empreendedorismo feminino em propaganda é, portanto, uma fronteira a ser explorada. Por isso mesmo, quando mulheres rompem essa bolha, esse exemplo precisa ser exaltado.
Trajetória pessoal
Após muitos anos como profissional de agência, me permiti engravidar. Aos dois meses de licença maternidade, fui demitida. O choque foi indescritível. Não conseguia acreditar em tamanho desrespeito, tamanho preconceito. Nesse momento só conseguia olhar para trás pra tentar entender um por quê: sempre trabalhei com aquela máxima de “vestir a camisa”, de “pensar como dona”. E me dei conta de que, se eu conseguia fazer isso para alguém, o que me impediria de fazer por mim? A vida que estava crescendo em mim abriu um horizonte gigantesco à minha frente.
Foi quando surgiu a oportunidade de uma sociedade. De criar um negócio novo e colocar em prática todas as minhas crenças.
E se empreender não é para os fracos, empreender no mercado de Live Marketing é ainda mais desafiador.
Dos inúmeros desafios que se mostraram logo no início, um dos que mais me afetou foi o fato de ter que garantir a minha sustentabilidade financeira. Um novo negócio precisa de capital, de conexões fortes e uma certa dose de camaradagem. Nós tínhamos muito conhecimento, muita vontade, algumas conexões e pouco capital.
Então, como eu havia acabado um mestrado, ao mesmo tempo do início da agência, fui convidada para ministrar aulas em duas universidades.
Era o que eu precisava para garantir uma fonte de renda paralela mas, na verdade, foi muito mais. Essa experiência me mostrou o que eu gostaria de imprimir verdadeiramente no meu negócio: conhecimento, embasamento, estratégia.
O mercado de Live Marketing, comparado ao da Propaganda, era ainda muito novo
e um tanto empírico. E a experiência como professora, e ainda mais como estudiosa, me ajudou a desenvolver uma das fortalezas da minha agência hoje: as pesquisas proprietárias para entendimento do comportamento dos consumidores dentro do mercado de Live Marketing. As pesquisas foram o grande impulsionador do nosso negócio. Com elas conseguimos criar um diferencial nas nossas propostas e projetos.
E, talvez, um dos maiores desafios para um empreendedor seja criar um diferencial para o seu negócio. Neste quesito, agradeço por ter me deparado com tantas dificuldades, porque foram elas as propulsoras para as conquistas a partir deste momento da minha vida.
Mudança de mentalidade
Uma reflexão que eu sempre faço é que “não precisa mais ser tão difícil”. A minha experiência de vida reforçou meu compromisso em trabalhar por um mercado mais igualitário, inovador e aberto a todas as vozes.
Ainda enfrentamos barreiras estruturais e culturais, como preconceito e estereótipos de gênero e, por isso, acredito que precisamos celebrar as conquistas femininas. A presença das mulheres é crescente, ainda que continue sendo menor em cargos de alta gestão. E por isso precisamos de mais modelos e mentoras para as novas gerações.
Superar essas barreiras exige uma mudança de mentalidade do mercado e iniciativas de apoio à liderança feminina, como programas de mentoria, inclusão de mulheres em eventos de liderança e redes de apoio para mulheres empreendedoras são essenciais.
Minhas expectativas e esperanças giram em torno de um futuro mais inclusivo, diversificado e equilibrado, em que mulheres possam prosperar e liderar com confiança e autenticidade. Vejo a esperança nas opiniões das minhas filhas adolescentes sobre terem uma mãe empreendedora. Elas reconhecem o esforço, a dedicação e a paixão que coloco no trabalho. Ver uma mãe em um papel de liderança pode ajudar a nova geração a entender o valor da força pessoal.
Minha esperança é que as futuras empreendedoras não apenas conquistem espaço, mas também transformem o mercado publicitário em um ambiente mais humano, inclusivo e transformador. Que cada barreira enfrentada pelas gerações anteriores se torne um incentivo e inspiração para que elas avancem com confiança e tragam uma nova era de liderança.
Conexões que movem
Ao longo da minha jornada, tive conquistas que me orgulham e, uma delas, é fazer parte como conselheira da Associação de Marketing Promocional (AMPRO) e do GAN – Grupo de Atendimento e Negócios.
Estas atividades tiveram uma influência decisiva em minha perspectiva sobre o mercado e o papel das mulheres nele.
A Ampro e o GAN, através do trabalho de conscientização sobre temas importantes do mercado, me mostraram que um empreendedor não vive sozinho, que conexões movem a vida e as trocas com outros colegas são vitais para um negócio eficiente e eficaz.
Eu vejo mais mulheres assumindo posições de liderança e se colocando de uma forma diferente diante do mercado de Live Marketing.
Isso fortaleceu minha convicção de que as mulheres têm um papel essencial na transformação deste mercado: trazer ações mais colaborativas e sensíveis tanto para o contexto do negócio quanto para o contexto social.
E isso me inspira.
Denise Medolla é sócia-fundadora da Casa 96