A propaganda brasileira é tida como uma das três melhores do mundo, historicamente, e também neste momento. O critério desta afirmação é a nossa participação em festivais internacionais, principalmente o Cannes Lions, onde sempre ficamos entre os três países melhor colocados e em 2025 fomos destaque com ‘O Ano do Brasil em Cannes’, ou seja, o país criativo homenageado desta edição. Fomos o primeiro país homenageado. Também consideramos, como uma verdade, que a nossa propaganda não está nos melhores dias e que, portanto, somos uma das três melhores em festivais, mas no dia a dia, na propaganda de verdade, não somos mais a elite que já fomos.

Assim, parecido com o que sentimos em relação à seleção brasileira masculina de futebol. Eu concordo que nossa posição é diferente se compararmos nosso desempenho nos festivais com o dia a dia real das agências e o que temos colocado nas ruas e no digital.  Mas, na verdade, nós somos ainda melhores na propaganda propaganda, aquela que vai ao ar em todo o país, seja para marcas nacionais ou regionais, pequenos e médios anunciantes, varejos, marcas que disputam mercado com multinacionais enormes e conseguem chegar ao consumidor com humor, emoção, oportunidade.

Veja o exemplo da Cajuína São Geraldo, uma marca de refrigerante de caju do Ceará que está sempre inventando coisas legais em sua comunicação. Não deve ser fácil acordar todo dia de manhã para enfrentar as grandes marcas deste  segmento, mas eles atropelam e vão, com coragem e muito humor, ocupando espaços e ajudando o Brasil a ter, de verdade, a melhor propaganda do mundo. Para não ficar só nos exemplos de marcas pequenas, veja o que a Fiat tem feito nas redes sociais nos últimos anos, e também na TV. Sim, na TV aberta, que muitos previram que morreria de morte matada pelo digital e está aí fazendo e acontecendo. A oportunidade do gol interrompido é propaganda da melhor qualidade em qualquer lugar ou veículo de comunicação.

Poderia passar o dia dando exemplos de marcas de todos os tamanhos que têm feito uma comunicação fora da curva, com humor, contexto, emoção e capacidade de virar assunto. Veja também a mídia out of home brasileira no dia a dia, espalhada pelo país, quanta coisa engraçada e criativa a gente vê. Claro que também tem muito entulho, mas, de novo, em todas as profissões, em qualquer lugar, a maior parte é entulho. A questão é que, se você pegar o nosso melhor da propaganda de marcas grandes, médias e pequenas, internacionais, nacionais e regionais, você vai ver publicitários sempre querendo e tentando fazer o melhor, convencer clientes a aprovar o mais criativo para vender mais e construir marcas.

O livro lançado pelo brilhante Luis Lara, ‘A alma brasileira do negócio’, fala desta origem da publicidade brasileira, sempre baseada no humor, na emoção e no fato de que os brasileiros amam boa propaganda. Ideias que geram repercussão, viram assunto e, sonho de todo publicitário, tornam-se cultura popular. Talvez o Brasil seja o único país do mundo que reúne publicitários e consumidores tão apaixonados por boa propaganda, e esse deve ser o nosso segredo. O legal é ver que nosso potencial é ainda maior, que já fomos ainda melhores do que somos hoje, mas vejo a qualidade crescendo de volta, a importância do trabalho criativo aumentando também e a tecnologia sendo substituída pela criatividade nas conversas de eventos, jantares e almoços de família. Outro caso incrível é o último capítulo de ‘Vale Tudo’. Ele mostra que uma ótima novela tem o poder arrebatador de sempre e que a propaganda sabe explorar um momento como esse de maneira muito ousada e criativa.

O capítulo final da novela foi nosso Super Bowl, e tomara que seja a primeira de muitas. Assim como a novela, a despedida do William Bonner do ‘JN’ teve oportunidades que repercutiram para marcas como Amstel, Nubank e Café Pilão, que criaram campanhas especialmente para a ocasião. Falei isso tudo, mas queria chegar na verdade em algo que tenho pensado bastante ultimamente: somos a melhor propaganda do mundo, sem dúvida, mesmo não atingindo todo o nosso potencial. Se 90% das agências não inscrevem campanhas em Cannes, muitas por falta de verba, e mesmo assim já somos a terceira potência em festivais internacionais, imagina se aumentássemos essa participação.

O desafio é continuar subindo o sarrafo do dia a dia e aumentando a diferença da nossa comunicação para todas as outras do planeta. Afinal, se tem um mercado onde não temos complexo de vira-latas e estamos acostumados a brilhar no mundo todo, é na propaganda. Não é à toa que toda boa agência no mundo tem pelo menos um brasileiro na equipe. Então fica combinado: pelo critério dos festivais, estamos no top três, mas pela vida real, somos sem dúvida a melhor propaganda do planeta.

Gustavo Bastos é sócio e CCO da Onzevinteum