Na semana em que é lembrada a data da Consciência Negra, o PROPMARK traz um especial focado no assunto, mais precisamente na publicidade. Foram ouvidos profissionais do mercado com a intenção de descobrir por que ainda poucos pretos protagonizam campanhas publicitárias. A principal conclusão da apuração é que o problema é estrutural e a solução está na inclusão de negros em todas atividades e escalões.
Renato Meirelles, presidente do Instituto Locomotiva, por exemplo, acredita que a baixa aparição da população preta nos comerciais e mensagens publicitárias é porque as posições de poder e influência em espaços corporativos ainda são, em sua maioria, ocupadas por pessoas brancas. “Se o Brasil fosse uma empresa, 81,4% dos cargos de alta liderança seriam ocupados por homens brancos; se considerarmos homens e mulheres brancos, esse número aumenta para 94,2%”, relata ele, lembrando ainda que estamos falando de um país em que 56% da população se autodeclara negra, considerando pretos e pardos - os dados são do último censo do IBGE.
Meirelles fala também que não é só nas campanhas publicitárias que os negros são esquecidos, mas também nas novelas, nos filmes, nos livros, na cultura e no imaginário. Por sorte, a situação não chega a ser tão crítica, uma vez que, hoje, para ele, tanto publicitários como anunciantes estão sendo desafiados pelo próprio mercado a perceber a diversidade da sociedade e criar campanhas representativas dela. “O consumidor quer se ver no conteúdo e nos produtos que consome, e essa tendência não vai desaparecer”, declara.
Dados confirmam o que diz o executivo. Em junho deste ano, foi apresentado ao mercado estudo feito pela iO Diversidade em parceria com o Instituto Locomotiva e, pasmem, 80% dos brasileiros reconhecem que o Brasil é um país preconceituoso em relação à população negra. E mais: 77% acreditam que é papel das marcas e das empresas apoiar pautas ligadas à igualdade racial. Além disso, 79% estão atentos ao que se chama de “cumprir tabela”, e acreditam que muitas marcas se aproveitam do combate ao preconceito apenas para fazer propaganda, mas não têm ações concretas para mudar a realidade.
“O consumidor já se posiciona. Cabe às empresas enxergar esses desdobramentos, e agir para transformar essa realidade”, comenta Meirelles. Outro detalhe importante de se observar é que, quando pessoas negras aparecem em peças publicitárias, têm sempre o mesmo biotipo, o mesmo corte de cabelo, o mesmo formato de rosto e até o mesmo tipo físico. É o estereótipo falando mais alto, o que deixa mais claro ainda a limitação do uso de pretos na publicidade.
A maioria dos tipos negros claramente não está representada em comerciais de TV, por exemplo. E quando chegam às telas nos intervalos da programação os atores negros escolhidos, além do mesmo biotipo, muitas vezes são bem parecidos com brancos.
No meio dessa história toda, as agências de publicidade estão atentas ao movimento e já têm programas de inclusão não só de negros, mas também de outras etnias e comunidades. Cintia Pessoa, diretora de recursos humanos da Publicis Brasil, sugere que o mercado publicitário traga mais diversidade para os projetos e não compactue com o racismo, acreditando que o primeiro passo é fazer o censo da empresa, para então definir metas e trabalhar com objetivos. “É menos media training sobre diversidade e mais ações intencionais focadas na inclusão. E
incluir dá trabalho, mas é recompensador, principalmente falando de publicidade, que conversa com milhares de pessoas todos os dias. Ideias boas só nascem a partir de pessoas com vivências distintas trabalhando juntas”, fala.
Beatriz Lopes, diretora de arte júnior da WMcCann, concorda que no Brasil o racismo é estrutural e mesmo no século 21, com acesso à informação e a tantas pautas e conteúdo, o brasileiro ainda comete crime de racismo e muitos o invisibilizam, o que dificulta o avanço e a abertura de diálogos mais profundos na pauta de diversidade. Ela fala também que os anunciantes e marcas ainda não avançaram no ponto de vista da representatividade e da inserção de pessoas negras, e devem sofrer duros impactos, uma vez que a sociedade hoje está cada vez mais ativista e comprometida a consumir marcas que estejam se posicionando em busca da representatividade.
Armando Ferrentini é publisher do PROPMARK