É natural que a tecnologia tenha se transformado em uma ferramenta de trabalho fundamental para os criativos. Afinal, são muitos os benefícios da inteligência artificial (IA) e das plataformas de design: aceleram processos, possibilitam o teste de ideias e, no geral, melhoram a execução criativa. Essas ferramentas ampliam a capacidade de busca e de prototipagem, potencializando a fase de concepção ao fornecer diversas possibilidades de maneira rápida. Ou seja, são muito úteis, especialmente na fase inicial do processo.

Nada disso mata a originalidade das ideias. Ao contrário, pode alimentar a criatividade com novos estímulos. Mas, para evitar o risco de um profissional se tornar refém de soluções prontas, é importante entender que o julgamento das ideias geradas pela IA exige repertório. É apenas com conhecimento, experiência e senso crítico que avaliamos se as sugestões tecnológicas fazem sentido, se traduzem corretamente a essência da marca e se têm potencial para impactar o público de forma autêntica.

O diferencial trazido pelo olhar humano e experiente se manifesta principalmente na etapa de refinamento e execução final, quando as limitações da tecnologia podem resultar em falhas anatômicas ou outras anomalias. Por exemplo: quando o cliente solicita ajustes muito específicos, o ideal é encaminhar o projeto para profissionais de arte, como ilustradores, designers 3D ou fotógrafos.

Desafios variados
Na fase de ajustes finos, a IA não oferece um controle minucioso de cada detalhe. E essa é apenas uma das limitações que a tecnologia apresenta aos profissionais. Outro desafio é filtrar a imensa variedade de informações e ferramentas disponíveis. Sem um direcionamento claro, o profissional corre o risco de se perder em tantas possibilidades, atrasando o processo criativo e comprometendo a qualidade final.

Outro ponto essencial é compreender bem as ferramentas, para que não sejam utilizadas de forma superficial ou repetitiva. Além disso, é preciso equilibrar velocidade e profundidade. Embora a tecnologia agilize certas etapas, uma ideia sólida continua dependendo de análise cuidadosa e tempo de maturação.

Gerenciar a velocidade de produção, sem comprometer a qualidade criativa, demanda cuidado. Atualmente, com as mesmas ferramentas disponíveis a todos, ideias rasas se tornam genéricas e fáceis de replicar, e assim perdem qualquer diferencial. Por isso, mesmo com o apoio tecnológico, é fundamental reservar tempo para aprofundar o conceito, refinar cada peça e garantir sua relevância, evitando um mar de conteúdos descartáveis que não agregam valor à marca.

Por outro lado, abusar da IA, transformá-la em muleta, representa uma tentação e um risco. A popularização dos “prompts prontos”, por exemplo, dilui a força criativa e resulta em soluções genéricas. Profissionais experientes aprimoram e personalizam esses prompts, muitas vezes recorrendo a outras ferramentas, para chegar a algo verdadeiramente original e significativo.

Tudo que é criado de forma essencialmente genérica acaba perdendo valor de mercado com rapidez e se limita a uma tendência passageira, sem sustentar relevância ou impacto a longo prazo. Quem vai se diferenciar no mercado é aquela pessoa – ou agência – que preserva a coerência e a identidade de cada marca, evitando resultados genéricos e garantindo propostas realmente diferenciadas.

Preserve a originalidade
É possível fugir das soluções genéricas, sem perder o que a tecnologia tem de melhor a oferecer. O grande diferencial está em captar profissionais que saibam o que estão buscando: “saber perguntar” é a habilidade mais importante, seguida de “saber julgar”. Quem domina essas duas capacidades consegue usar a tecnologia (especialmente a IA) de forma inteligente, evitando que se torne apenas um ruído ou distração. Em vez de simplesmente confiar no que a ferramenta oferece, é preciso avaliar criticamente o resultado e adaptá-lo à visão estratégica e criativa do projeto.

Assim é possível identificar nuances que uma ferramenta automatizada não consegue captar, além de interpretar tendências e contextos específicos para cada projeto ou público. É nessa interseção entre tecnologia e humanidade que surgem as ideias mais originais, aquelas capazes de se conectar com as pessoas de forma genuína e duradoura, com base em qualidades humanas como curiosidade, empatia e olhar cultural.

Além da experiência profissional, é importante que os criativos valorizem a diversidade de seus repertórios individuais. Ler, viajar, observar pessoas, participar de eventos culturais ou simplesmente estar aberto a conversas fora da zona de conforto são atitudes que enriquecem a bagagem de cada um. Em outras palavras, nunca foi tão importante valorizar o olhar humano, pois é a soma dessas experiências que alimenta a criatividade e torna as propostas verdadeiramente únicas.

Samuel Werczler é diretor de criação na Innova