Quando Gutenberg imprimiu o primeiro livro no Ocidente, uma bíblia em latim, a prensa de tipos móveis como invenção abria as portas para um horizonte de democratização e acesso à informação via textos e livros. Séculos depois, a vinda do rádio, da televisão e da internet provocou uma série de abalos sísmicos comunicacionais que, com o tempo, revelaram segmentos ou novas plataformas que ainda se valem do texto como algo essencial e presente em meio ao turbilhão de informações ao qual estamos submetidos atualmente.
Passados quase 600 anos, devido à quarta revolução industrial, uma nova prensa (tecnologia revolucionária) destinada a mudar o curso da história nasce a cada ano com promessas de milagres acompanhadas da ameaça de substituição do homem pela máquina, queda de empregos e fim de indústrias.
O Chat GPT (Generative Pre-Trained Transformer; algo como Transformador Generativo Pré-treinado de Bate-papo) do laboratório sem fins lucrativos OpenAI é a bola da vez. Lançado no final de 2022, o algoritmo baseado em Inteligência Artificial obteve investimentos de Elon Musk e dos cofundadores do Paypal, Peter Thiel, e do LinkedIn, Reid Hoffman. Basicamente, com instruções de usuários, textos são elaborados a partir do cruzamento de informações, tendo a internet como base de dados.
O tema ganhou repercussão recentemente, pois, em questão de dois meses de lançamento, o Chat GPT teria condições reais de passar em provas de medicina, advocacia e pós-graduação nos EUA, conforme testes realizados por cientistas. Universidades europeias e norte-americanas baniram o uso do recurso alegando que facilitaria plágio e fraude entre estudantes. No Brasil, a Robotizia passou a oferecer em janeiro um assistente de redação digital para textos em inglês e português que usa o algoritmo.
Atendo-se aos fatos, mesmo diante de uma ferramenta poderosa que já impacta o mercado e a sociedade, a tecnologia em si é proveniente da ação e trabalho de mentes humanas. Portanto, cabe a nós mantermos o recurso como instrumento de aprimoramento em vez de algo a nos tornar obsoletos. As intervenções da IA existem por meio da interação com pessoas, ou seja, são resultados de um processo dialético que não exclui nossa presença.
O que está em curso é a uma revolução comunicacional que de fato transforma funções para gerar outras, mas esse movimento cíclico é o motor que impulsiona uma sociedade calcada em tecnologia. Isto é, se guinadas tecnológicas são cada vez mais constantes, o que podemos dizer sobre a constância da humanidade em se manter original e seguir produzindo? Antes de pregar o apocalipse do texto e dos redatores feito por pessoas, vejamos a gênese e a capacidade da potencialização da criatividade humana alçada pelo Chat GPT e as possibilidades que traz.
Por um lado, o recurso mecaniza algo tão artesanal quanto a cristalização de letras, palavras e textos. Por outro, ele valoriza a habilidade de uma pessoa que desenvolve a escrita sem o auxílio de máquinas, de forma original, espontânea, com improvisação.
O diferencial está no repertório de nossas vivências sem a tela como intermediadora, que serão mais e mais valorizadas no futuro. Se o ouro deste século é a informação, como humanos, jamais pararemos de gerá-la, independente de algoritmos. Em suma, diante do cenário de inovação galopante catapultado por tecnologias, tenho que pedir licença ao leitor. Primeiramente, por não ter a pretensão de ser um guru no tema. No entanto, como atuo no ecossistema de inovação e economia criativa há mais de uma década, é necessário demonstrar ceticismo frente à euforia dos grupos de discussão e tendências. Minha experiência humana mostra que é preciso distanciamento temporal para decretar se o burburinho de uma tecnologia disruptiva veio para ficar. Feito ou não por máquinas, o resultado, que transcende a binário bom ou ruim, tem que ser avaliado por quem é de carne e osso.
Lucas Foster é idealizador do Dia Mundial da Criatividade e do Prêmio Brasil Criativo