Dia 11 de outubro eu, minha mulher e minha filha de 4 anos lançamos uma coleção de livros para crianças em fase de alfabetização: a ‘Coleção estórias sem sentido que fazem todo o sentido’. A vida é feita dos improváveis que a gente inventa, eu acredito nisso. Já fiz uma exposição sobre fotos proibidas de uma viagem à Coreia do Norte, fiz um episódio do Canal Off sobre atletas amadores profissionais em pagar mico, me dediquei a longas e curtas nunca produzidos, criei um movimento pelo Rio Pinheiros que só ajudou a “monetizar” as margens - já as águas continuam podres. Contudo, essa experiência está sendo, sem dúvida, a mais intensa.

Criar para crianças talvez seja o desafio mais complexo para um criativo e redator publicitário. Se, nas redes sociais, a atenção se perde em 3 segundos, para uma criança o interesse por uma ideia burocrática dura 2 segundos ou menos. Espero que elas terminem os nossos livrinhos e depois repitam, como sempre fazem. Aviso que passaram como “blockbuster” no “disaster check” da família, só para não deixar de usar os “jargões publicitários”. Escrevendo livros para a meninada, me senti falando com a próxima geração de cidadãos. Divertir seres que pensam com mais agilidade e menos amarras do que nós foi complexo. Mas o legal é tentar criar uma narrativa criativa, desconstruída, imaginativa e livre, construída a partir de elementos do universo infantil. Sem leitura não se cria pensamento crítico, mata-se o critério, imbeciliza-se a todos, criam-se negacionistas rasos.

Adoramos odiar as redes sociais e as plataformas digitais em público, mas não vivemos sem elas na vida privada. A abundância criativa que as pessoas produzem no TikTok, no reels e no shorts é fascinante. É viciante. Até a fantasia orgiástica do sucesso coletivo do LinkedIn é divertida de se ver. Somos seres interessantíssimos. Sejamos francos, nada supera a produção das pessoas. Não é à toa que a publicidade como entretenimento entre entretenimentos perdeu relevância.

Pedimos desculpas, o tempo todo, para entrar na conversa de múltiplas plataformas dentro do celular, do desktop, da futura TV digital e, tomara que não, de tolos protótipos de óculos com display.

Culpamos as redes pela nossa incapacidade, como pais, de dar exemplos offline, de apresentar assuntos interessantes, instigantes, novos como, por exemplo, livros, histórias,  jogos, música e brincadeiras. Ou, quem sabe, por apenas estar em companhia dando atenção aos pequenos. Ou seja, dá para tirá-los das redes, sim, basta criatividade ou, na maioria das vezes, a coragem de um sonoro “não” bem anos 1980. Taí o porquê de esse projeto ser o mais desafiador, ingênuo e arrogante da minha vida. Livro chato na mão de criança vira caderno. A ‘Arte da jubarte’, sobre a descoberta de nossos talentos, e ‘A bola que joga o menino’, que fala a respeito de compartilhar, são os dois primeiros, ilustrados por dois talentos, o publicitário Nando Zenari e o artista Daniel Gnattali. Mais dois já estão ficando prontos, um sobre a relação com a deficiência visual e outro sobre sonhos genuínos que se transformam em bullying. Agradeço a minha filha, por ter me obrigado a inventar estórias todas as noites quando os livros físicos se esgotaram. E a Juliana, minha mulher, por dar vida, junto com a pequena Elis, a esses delicados personagens. E era uma vez, um pai que resolveu...

Marcelo Reis é fundador da Alegria