No início de março, fiz o lançamento de um novo negócio, focado em cursos, palestras e mentoria de comunicação. A primeira ação do empreendimento seria um ciclo de palestras de profissionais de comunicação. Convidados confirmados, local definido, evento anunciado, passagens emitidas, hotel reservado, ingressos sendo vendidos e… vem a proibição, por conta da pandemia do novo coronavírus, de aglomerações no período que incluía a data das palestras.

Passado o baque, iniciei a trabalhosa e angustiante tarefa de juntar os cacos. Começo pela tentativa de cancelamento dos bilhetes aéreos. Impossível! As páginas de cancelamento nos sites das companhias estão indisponíveis e as chamadas por telefone são recebidas com gravações, pedindo que se ligue outra hora por conta do congestionamento.

Certa manhã, recorro ao atendimento online. Sou o 427º da fila. Fico tão abalado que acabo levantando e deixando o acesso ativo. Na madrugada seguinte, com insônia, descubro, sem querer, que já sou o segundo. Aguardo e resolvo o problema, aliás com a valorosa colaboração de alguém muito competente do outro lado.

Com o agravamento da crise, vou me acalmando e administrando melhor a frustração causada pelo impedimento de alguma coisa em que depositava muito otimismo e correspondia lindamente.

E percebendo que, de fato, diante de tragédias que atingem a todos, as perdas individuais ficam minimizadas. É diferente, por exemplo, perder um ente querido num acidente de carro e no afundamento de um navio de cruzeiro lotado. Parece que um sentimento de perda compartilhado se torna mais suportável. Nesse momento, todos sabemos que vai haver uma recessão econômica grave. Não aquele tipo de crise setorial ou situação que permita que cada um se vire por conta própria e os mais espertos se safem. Não!

Agora o único jeito vai ser, sim, cada um pensar nos outros. Tarefa difícil para quem foi forjado na competição exacerbada e na falta de limites na luta para vencer.

Mas o alvo saiu de vista, a meta derreteu e o objetivo mais importante está bem ao lado, ao alcance de um apoio moral, de uma palavra de conforto, de um socorro financeiro, de um perdão de dívida, de um prazo para se refazer, enfim, como nunca antes, a nossa competência para o voluntarismo estará à prova.

Porque a saída dessa encrenca em que, igualmente, estaremos todos enredados será dada pela capacidade de cada um pegar o seu pedacinho da meada e buscar o fio do interesse de todos.

Isso vai exigir um grande sacrifício, do ponto de vista das nossas ambições materiais. Mas também vai oferecer a chance de exercitarmos alguma coisa adormecida e de grande valor ético: o espírito de solidariedade.

Não aquela solidariedade que abate no Imposto de Renda ou que nos alivia a consciência. Mas parte vivente da nossa alma. Vai ser ela quem terá de inspirar e guiar nossas atitudes. Para que retomemos a consciência, às vezes anestesiada pela ambição, de que aquilo a que chamamos de mercado não pode ser apenas um recorte da humanidade. Mas a humanidade inteira.

Stalimir Vieira é diretor da Base Marketing (stalimircom@gmail.com)