É a segunda vez que venho ao festival SXSW, e assim que pisei aqui já me veio aquele mesmo pensamento da primeira, tenho que voltar todo ano, é um absurdo a quantidade de assuntos que a gente "não pode deixar de entender ". Logo no avião já senta ao meu lado o espaçoso e velho inimigo FOMO, fear of missing out, e assim que aterrizo já descubro que a expressão foi atualizada para FOMA, fear of missing anything, pela incrível futurista Amy Webb, que esteve novamente em um dos palcos mais disputados do festival. E sim, você vai ouvir isso da maioria das pessoas que estiveram por aqui, afinal essa sensação é uma das grandes vilãs de estarmos conectados o tempo todo - “we are all freaking out about so much connection”, tá no meu notes em caps lock, de um palco que não me lembro qual agora e não anotei porque já estava conectada no assunto seguinte.
Nas salas os celulares não param de subir para fotografar os telões com as tendências, previsões, ideias disruptivas, e claro, o assunto presente na maioria esmagadora dos palcos mais importantes, o que vai ser da IA em diferentes segmentos. Eu que ainda nem engatinhando nesse tema, mal cortei o cordão umbilical com o google, saio com aquela sensação de que se eu não correr pra dar conta, serei atropelada certamente. Mas o que me chamou atenção foi o consenso entre a maioria das pessoas no assunto, a importância das conexões humanas em meio a todos esses avanços tecnológicos.
Alguns highlights: "Nos próximos anos, veremos uma valorização das habilidades humanas que a IA não pode replicar: criatividade, intuição e conexão genuína”, disse o provocador Scott Galloway, que também destacou que empresas que colocarem pessoas no centro de suas estratégias, ao invés de dependerem cegamente da tecnologia, serão as que prosperarão. Amy Webb, diz que estamos entrando em um ciclo onde a IA pode ser tanto um catalisador para a conexão humana quanto uma ferramenta de alienação massiva. "Não se trata apenas do que a IA pode fazer, mas de como escolhemos usá-la". Ela apontou exemplos de assistentes de IA que já estão ajudando na saúde mental, personalizando terapias e oferecendo suporte emocional, porém alertou para os perigos de uma sociedade que delega empatia a máquinas.
Esther Perel teve um papo excelente com Amy Webb no dia seguinte em outro palco disputadíssimo, convidando o público a imaginar como as grandes mudanças atuais moldarão nossos relacionamentos no futuro. Co-fundadora da Mozi, Molly DeWolf diz que a rede social foi concebida para resgatar a verdadeira essência das interações sociais, incentivando os usuários a se conectarem além do ambiente digital. A plataforma busca promover encontros presenciais e experiências compartilhadas no mundo real, contrariando a tendência das redes atuais que frequentemente priorizam o engajamento online superficial. E por aí vai. Aí acaba o dia, a gente sai do Convention Center e começam as mensagens de onde vai ser o primeiro bourbon.
O melhor da música pode estar acontecendo no bar da esquina, o que será que eu não posso perder. Vou de um para o outro, adoro esse clima, deixa a vida e a música boa me levar. Mas no fundo quero mesmo é correr para outro tipo de revolução, a que acontece nas pistas de dança dos lendários saloons de Austin, como o Broken Spoke, White Horse e tantos outros que devem existir e eu só penso em poder descobrir no próximo ano. Nesses oásis da dança texana, diferentes gerações se encontram para compartilhar algo que nenhuma IA jamais conseguirá replicar: a verdadeira conexão humana. Casais deslizam pelo chão de madeira ao som do country e do honky-tonk, sem precisar de um algoritmo para indicar o próximo passo. Jovens dançam com idosos, estranhos se tornam parceiros, e todos se conectam pelo ritmo, pelo toque e pelo olhar. Aí penso que a dança é uma forma pura de comunicação, uma linguagem universal que passa por gerações sem perder seu significado.
A IA pode criar músicas, sugerir playlists e até gerar coreografias, mas nunca sentirá o frio na barriga do primeiro giro, a troca de energia de um baile lotado ou o riso compartilhado ao errar um passo. Assim como a humanização da tecnologia foi um dos temas centrais do SXSW 2025, Austin me faz lembrar o tempo todo que a verdadeira essência humana é o que nos torna insubstituíveis.
Giovana Grigolin é produtora-executiva da Magma