Não é de hoje que o Brasil se inspira — e se influencia — pelas práticas empresariais e mercadológicas dos EUA. Desde os primeiros manuais de administração até os mais modernos conceitos de marketing digital, o vocabulário dos negócios brasileiros está repleto de expressões como branding, briefing, insights, lead, pitch, follow-up e tantas outras que já fazem parte do nosso dia a dia corporativo.
O inglês, nesse contexto, deixou de ser apenas um idioma estrangeiro para se tornar uma espécie de “língua franca” dos negócios. Mas agora, um novo e inesperado capítulo pode colocar essa relação em xeque. Enquanto escrevo este artigo, está para ser sancionada uma medida unilateral do governo dos EUA que impõe uma taxa de 50% sobre produtos brasileiros exportados para o país.
Trata-se de uma decisão dura, com forte impacto sobre a nossa balança comercial e, possivelmente, sobre o clima diplomático entre as duas nações. Ainda que o governo brasileiro esteja buscando canais diplomáticos para contestar a medida, as chances de reversão são, ao que tudo indica, remotas.
Nesse cenário, surgem algumas questões importantes, que vão além da economia e da geopolítica: como essa crise comercial afetará a percepção cultural e simbólica que os brasileiros têm dos Estados Unidos? O incômodo posicionamento negacionista e anti-ESG do governo americano, por exemplo. Haverá reflexos no mundo dos negócios e do marketing, áreas historicamente influenciadas pela escola americana?
É razoável pensar que a imposição de tarifas tão severas gere um sentimento de animosidade ou, no mínimo, de frustração por parte de empresários, exportadores e até mesmo consumidores.
Num país em que a influência cultural dos EUA sempre foi forte — seja no cinema, na música, na tecnologia ou na linguagem corporativa — é possível que comecemos a questionar até que ponto essa referência ainda faz sentido.
No campo simbólico, os termos em inglês podem se tornar, para alguns, um sinal de submissão cultural indesejada. Já há quem defenda um “resgate” do vocabulário em português, em nome da valorização da nossa identidade e soberania. Afinal, se o país que nos espelhamos está disposto a dificultar nossa inserção no seu mercado, por que deveríamos continuar consumindo seus conceitos sem filtros? Mas a realidade é mais complexa.
O uso de termos em inglês (que vai além dos EUA) no marketing e nos negócios não é apenas uma escolha estética ou cultural — é também uma questão de integração global. O mercado é internacional, e a linguagem dos negócios acompanha essa lógica.
Muitos dos conceitos centrais do marketing contemporâneo nasceram em solo americano, mas foram rapidamente apropriados por profissionais do mundo inteiro.
O que chamamos de benchmarking ou ROI, por exemplo, é compreendido em qualquer mercado competitivo, do Brasil ao Japão. Mais do que uma questão de idioma, trata-se de acesso a uma gramática comum do mundo corporativo.
Renegar isso por conta de uma tensão geopolítica específica pode significar um isolamento contraproducente, sobretudo para empresas brasileiras que buscam expandir sua atuação internacionalmente. Mas isso não significa que não devamos refletir.
O momento talvez seja oportuno para uma revisão crítica: estamos apenas importando conceitos e jargões ou os estamos customizando à luz da nossa realidade?
Estamos aplicando estratégias baseadas em contextos estrangeiros ou construindo modelos genuinamente brasileiros de marketing e gestão?
Em resumo, o mal-estar gerado pela nova barreira comercial pode, sim, abrir espaço para um debate mais profundo sobre nossa dependência cultural — inclusive no vocabulário dos negócios. Não se trata de abolir termos em inglês, mas de entender melhor por que os usamos, como os usamos e se há alternativas igualmente eficazes em nossa língua.
E o nosso borogodó? Nosso jogo de cintura e malemolência... Mais do que nunca, é hora de repensar o quanto somos influenciados — e o quanto podemos influenciar.
Alexis Thuller Pagliarini é sócio-fundador da ESG4
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