A decisão de Mark Zuckerberg de se alinhar a Elon Musk e desencanar da preocupação com a reputação de suas redes não deixa de ser uma boa notícia. Afinal, o mundo digital que, desde a sua concepção, revelou-se campo minado para as marcas, lugar inseguro para crianças e jovens, território fértil para as piores práticas, andava disfarçando toda essa ameaça real com um discursinho fajuto, de controle, fiscalização e outras iniciativas que sempre se mostraram inócuas.
Agora, pelo menos, os donos da parada tiraram as máscaras e resolveram substituir a hipocrisia pelo descaramento. Ao entregar aos usuários a ocupação de avaliar a veracidade do que é publicado, radicalizaram na proposta de que as redes sejam, de fato, o ambiente do “cada um por si”. Quem acredita, confirma; quem desacredita, nega. E pronto.
Na falta de um julgamento isento e independente, a verdade e a mentira passam a ser conceitos relativos, sujeitos a opiniões, que deverão impor-se de acordo com a capacidade profissional com que forem manipulados e não mais à luz de critérios normativos.
Essa espécie de autorregulamentação do fim do mundo foi engendrada, na prática, muito mais por interesse econômico do que por coerência ideológica, no sentido de salvaguardar fundamentos democráticos.
Os negócios de Zuck e Musk são moldados para faturar e não existe mercado mais apetitoso do que o da libertinagem. Lembro-me do sucesso que faziam as noites de “Ladies first” em algumas baladas, quando os homens eram impedidos de entrar até certa hora, período em que as mulheres eram servidas de bebidas alcoólicas, sem custo.
Foi o estupro de uma filha de juiz que pôs fim à “criativa” promoção. Regimes autoritários, que exageram na tutela de suas populações, servem para alimentar e tornar convincente o discurso desses pretensos paladinos da liberdade de expressão, e consequentemente fornecem de mão beijada mais fregueses para os negócios deles.
A acelerada penetração do gigante chinês no mundo da comunicação internacional, com seus padrões rígidos na administração de uma informação sempre devidamente calculada, não deixa, na verdade, a esses dois expoentes da comunicação-produto-de-mercado, muitas alternativas.
Ou usam a força do inimigo como alavanca para crescer na mão inversa, estabelecendo a “ditadura do capital” como contraponto à “ditadura comunista”, ou a fragilidade de uma democracia sensata, baseada em ordenamentos jurídicos talhados ao longo de séculos, que acabará por fazer minguar seus negócios.
Elon Musk não chegou onde chegou por virtudes éticas, mas por haver somado ao talento e à obstinação, uma evidente bruteza moral. Qualquer semelhança com Donald Trump, aliás, não será mera coincidência. E a ela, Zuk se terá, finalmente, rendido.
Sim, sou ingênuo o suficiente para acreditar que o fundador do Facebook é um ser humano ligeiramente melhor. Daqui para a frente, portanto, a menos que ocorra um verdadeiro levante mundial (com a China operando nos bastidores, é claro), empunhando a bandeira anticaos, vamos ver surgir das entranhas da web, o grande monstro devorador de civilizações que ela
carregava.
Tim Berners-Lee não tem culpa. Como Albert Einstein, em 1945, também não teve.
Stalimir Vieira é diretor da Base de Marketing
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