O mercado de produção de filmes publicitários no país absorve cerca de 10% dos investimentos dos anunciantes nas TVs abertas e por assinatura. O meio, segundo a pesquisa do Kantar Ibope Media, teve faturamento bruto em 2015 de aproximadamente R$ 90 bilhões. Porém, a partir de agora, as produtoras não vão mais fetuar pagamento de comissão às agências, expediente conhecido como BVs (Bonificações de Volume). A decisão é da Apro (Associação Brasileira de Produção de Obras Audiovisuais), que conta com adesão de 81 empresas associadas. O problema relacionado às BVs ficou em evidência após o envolvimento da O2 Filmes na Operação Lava Jato – ela seguiu orientação da FCB Brasil e depositou a comissão na conta do ex-deputado Andre Vargas, um dos protagonistas do escândalo de desvio de verbas da Petrobras. A própria 02 é signatária do documento aprovado pela assembleia geral da Apro.

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A instituição, como detalha seu presidente, Paulo Schmidt, sócio da Academia de Filmes, está elaborando um Código de Conduta que terá normas de compliance com o propósito de estabelecer o que mercado define como boas práticas. O comissionamento por meio de BVs terá de ser abolido pelas produtoras que, caso infrinjam o acordo coletivo de posicionamento institucional, poderão ser excluídas dos quadros após sindicância para apurar se realmente o pagamento foi configurado. Francesco Civita, da Pródigo Filmes, esclarece que não será algo policialesco.

“O plano é fortalecer cada produtora com um plano de vigilância com base na ética comercial. Não pode rolar denúncia vazia; tem de estar embasada por regras jurídicas para se estabelecer uma quebra de compromisso com os parâmetros do Código de Conduta. A prática da bonificação não pode ser um instrumento de marketing das produtoras para estabelecer relacionamento das agências para garantir trabalhos”, explica Civita. “Na verdade, as produtoras já trabalham com margens muito apertadas e deixam claro isso. Como vão pagar BVs? É contraditório”, prosseguiu Eduardo Tibiriçá, sócio da BossaNovaFilms.

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A ABA (Associação Brasileira de Anunciantes) já manifestara descontentamento com as BVs das produtoras às agências. As áreas de compras dos anunciantes apertam cada vez mais os orçamentos e não escondem descontentamento com o repasse. Quando a Lei 4.680 foi promulgada, em 1965, ela contemplava o pagamento de 20% de comissão às agências sobre os investimentos em mídia e 15% de produção, ambos pagos pelos clientes. Orlando Marques, presidente da Abap (Associação Brasileira das Agências de Publicidade), afirma que a entidade apoia “integralmente” o projeto da Apro.

“Só posso dizer que as BVs são um plano de incentivo entre as agências e os veículos de comunicação. As produtoras devem se relacionar, do ponto de vista financeiro, apenas com os anunciantes. As agências não podem e não devem contemplar essa prática nas suas receitas”, afirmou Marques.

Civita destaca o bom relacionamento das produtoras com os departamentos de RTVC (Rádio, Televisão e Cinema) das agências. “Tudo é baseado na técnica e na capacidade individual de cada produtora, dos diretores e demais profissionais. Com as BVs também pode-se incorrer na bitributação que não faz o menor sentido do ponto de vista econômico, afinal já somos impactados por uma cadeia de impostos muito elevada”, explicou. Tibiriçá prossegue: “A maioria dos grupos globais de comunicação exige que seus fornecedores estejam engajados nas normas de compliance. Sem isso não são credenciados, porque não querem ter nenhum tipo de problema jurídico”.

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O protocolo da Apro está aberto às demais associadas da instituição, que tem um volume de aproximadamente 120 empresas cadastradas. “Desde o ano passado, estamos nos posicionando de formas pública e organizada em relação a esse tema. É uma reivindicação das associadas que consideram as BVs predatórias e não acrescentam absolutamente nada ao negócio. A Apro enxerga como atitude fundamental essa tomada de posição. Quem não estiver de acordo, não poderá mais integrar o quadro associativo”, observa Schmidt.

Outro ponto nevrálgico para as produtoras é o prazo de pagamento dos seus trabalhos, que muitas vezes se arrastam por cerca de quatro meses. Em um país com a economia debilitada, como destacam Schmidt e Carlos Betti, da O2 Filmes, causa instabilidade no trade que costuma trabalhar com fornecedores de pequeno e médio portes que dependem da remuneração em dia para manter os níveis de exigências. Esse será um dos temas que vão integrar o 4º Fórum de Produção, que está articulado para o próximo mês de novembro. “Durante uma produção lidamos com uma grande quantidade de desembolsos imediatos; prazos mais céleres são cruciais para a saúde financeira das produtoras”, finaliza o presidente da Apro.