Profissionais das agências brasileiras mais premiadas neste ano falam sobre suas impressões e indicam os cases mais significativos da edição

O retorno do Festival de Criatividade Cannes Lions à Riviera Francesa após dois anos foi marcado por um misto de celebração, protestos e por uma busca por encontrar caminhos para lidar com um momento histórico em que a sociedade demanda posturas mais ativas, engajadas e conscientes das marcas e dos agentes do mercado de comunicação.

Um cenário de inquietude representado também nos Leões e GPs distribuídos, muitos dos quais conectados com realidades que precisam ser transformadas urgentemente, como a inclusão social. Entre os profissionais das agências brasileiras mais premiadas no festival deste ano ouvidos pelo PROPMARK, a percepção é de que a força do propósito entrou de vez nas estratégias de comunicação das marcas e deve ser cada vez mais ativada.

Confira abaixo as impressões sobre a edição e os cases que ganharam Leões mais significativos, a partir da ótica desses criativos.

“Cannes 2022 deixa duas lições centrais. A primeira é sobre o quanto o encontro presencial é inspirador para a indústria criativa. Trocar em um ambiente informal, com clientes e pares de diferentes países e culturas, é uma experiência que impacta diretamente na nossa visão de mundo e, consequentemente, no nosso trabalho, além de fortalecer um senso de comunidade muito importante para o mercado. A segunda lição é sobre o papel cada vez mais ativista das marcas em relação a diferentes causas. Neste ano, a sustentabilidade liderou os debates, mas já vimos isso ocorrer também com foco nas questões de gênero e raciais, por exemplo. Acho que o GP de Glass, criado pela DDB México para a WeCapital, responde a uma questão que se tornou ainda mais urgente durante a pandemia: a inclusão financeira de mulheres. Esse trabalho reforça a importância de as marcas agirem em prol das questões que afligem as comunidades em que estão inseridas de maneira consistente e duradoura. Do Brasil, não posso deixar de citar o nosso case Los Santos +3º C para o Greenpeace. Ele foi o case brasileiro mais premiado do ano e abordou o tema central do evento, a sustentabilidade, traduzindo para o ambiente dos games os impactos que o efeito estufa pode causar e convocando as novas gerações" Rafael Pitanguy, CCO da VMLY&R
“O principal aprendizado de Cannes para 2022 é colocar ação antes de comunicação. O festival tem valorizado ideias que materializam propósito com ações práticas que causam impacto e, de alguma forma, colaboram com a solução de problemas da sociedade. Inevitável não citar nosso Ouro com Presas nos 80. É um projeto que sintetiza muitos valores da Soko como agência. Da porta para fora, um projeto que traz earned media como o centro da nossa história e o impacto social como uma forma de conectar com as pessoas e fazer essa história ir adiante. Da porta para dentro, um projeto que partiu de um briefing de verdade e comprova globalmente nossa visão de que é possível fazer um trabalho criativo, relevante e plural sem replicar as práticas tóxicas do mercado de comunicação.” Rafael Ziggy, ECD da Soko
“A principal mensagem que Cannes deixa para a indústria é que, mais uma vez, o poder da criatividade resiste, e como uma ideia pode transformar uma cultura de um país, e possibilitar conversas jamais pensadas que seriam possíveis, e também reconstruir um país inteiro. Cannes nos mostrou que as pessoas não estão sozinhas, através do poder coletivo. O poder do coletivo e do inclusivo, que fazem as ideias serem cada vez mais exponenciais. Backup Ukraine (da Virtue Worldwide, de Nova York, criada para Polycam/Unesco), para mim, foi um case marcante e um dos GPs de Cannes (Digital Craft). Através da tecnologia, uma simples ideia pode ajudar a reconstruir um país.” Sergio Mugnaini, CCO da Ogilvy
“O festival deixa uma mensagem de transformação. É interessante perceber como Cannes tem tentado ser mais inclusivo e acompanhar o caminho do mercado como um todo. Esse fato está refletido em tudo, desde as peças premiadas, passando pela programação do evento até os rostos que a gente viu pelo Palais. Tivemos vários GPS entregues para mercados menores e não tradicionais, como cinco GPs indo para a Índia, além de México, Bélgica, Emirados Árabes e Portugal. Tivemos a presença de criativos pretos no festival de maneira supermobilizada, por exemplo, a partir de uma programação incrível criada pelo Black Creative Group, na praia da Inkwell. E até a entrega do Leão de São Marcos para Colleen DeCourcy, profissional que é reconhecida não só por ser indiscutivelmente criativa, mas também por todo o valor que agrega à indústria. The Unfiltered History, da Dentsu Bengaluru, da Índia, para a Vice Media, é um insight universal, para uma causa super-relevante, comum a todos os países colonizados. Tão relevante que era impossível não ser impactado por ela. Não à toa levou três GPs.” Tiago Abreu, diretor de criação da GUT SP
“A mensagem que Cannes 22 deixa é a criatividade com propósito. Vimos esse valor presente nos GPs dessa edição e também em premiações anteriores do mercado, com cases que usam a criatividade para contribuir na solução de problemas latentes atualmente, como sustentabilidade, democracia, diversidade e inclusão, por exemplo. Nesses projetos, as marcas deixam de ser observadoras ou contadoras de histórias, e assumem um papel mais ativo e fundamental como agentes da transformação. The Elections Edition é um exemplo muito potente do uso da criatividade com propósito. Numa tentativa de desencorajar as eleições nacionais no Líbano, o governo alegou que a falta de papel e tinta poderia cancelar as votações de maio. Para apoiar a democracia do país, o jornal AnNahar interrompeu a produção da sua edição impressa por um dia, a primeira vez em 88 anos, e doou a tinta e o papel para serem usados nas cédulas de votação.” Matias Menendez, ECD da AKQA
“Minha impressão sobre o Festival de Cannes deste ano se resume a essa equação matemática: diversidade traz mais riqueza para qualquer ambiente e, especialmente na nossa indústria, significa potencialização criativa. Ideias mais originais e criativas geram mais impacto positivo. E aqui vem uma variável importante: impacto positivo para as marcas e para o mundo! Definitivamente não bastam ideias que ajudem a vender mais produtos ou serviços, elas precisam ajudar a atender às necessidades mais urgentes das pessoas e do planeta! Ficou mais do que claro, algo que, modéstia à parte, eu falo há, pelo menos, 10 anos, que as marcas são os principais agentes de transformação da sociedade, com mais poder de construção de um futuro desejável do que governos! Destaque para todos os Grand Prix conectados a impacto positivo. Mas não dá para deixar de ser coruja e falar da identidade do Rio Carnaval, que ajuda a preservar e valorizar uma das maiores expressões da nossa cultura representando toda a comunidade do samba e ainda faturando dois Leões de Ouro!” Fred Gelli, CEO da Tátil Design