Um vídeo do Bradesco com as irmãs Mariana, Maria Carolina e Maria Clara, influenciadoras conhecidas como Verdes Marias que falam sobre sustentabilidade, foi prato cheio para provocar a ira de ruralistas. Isso porque elas convidavam as pessoas a aderirem ao movimento “Segunda sem Carne” como forma de passarem a ter hábitos mais sustentáveis.

Em protesto, empresários e entidades do agronegócio organizaram nesta segunda-feira (03) a ação “Segunda com Carne”. Foram distribuídos gratuitamente ao público cerca de dois mil espetos de churrasco em frente às agências do Bradesco em Presidente Prudente, no interior de São Paulo. Sindicalistas do Mato Grosso e Paraná, embalados pela hashtag #adeusbradesco, também manifestaram o seu repúdio ao Bradesco que, em nota, se coloca como o “maior banco privado do agronegócio”.

A comunicação, que foi retirada das redes sociais da marca no dia 23 de dezembro, criticava a criação de gado, que “contribui para a emissão dos gases do efeito estufa”, dizia o filme, que ao final promovia um aplicativo do banco voltado para o cálculo de pegadas de carbono. Com a assinatura “Bradesco. Transforme o Futuro”, a campanha que lançou a iniciativa foi idealizada pela Leo Burnett Tailor Made. A veiculação ocorreu em novembro de 2021 incluindo peças digitais, nas redes sociais como Facebook, Instagram e Tik Tok, impressos, OOH e spot de rádio.

Foto: Reprodução / União das Entidades de Presidente Prudente

“O Bradesco reitera seu apoio e crença irrestrita ao setor agropecuário. Há décadas é o maior banco privado do agronegócio. Foram a Pecplan e a Fundação Bradesco, com o apoio de seus técnicos, que implantaram e capacitaram milhares de agropecuaristas a fazer inseminação artificial. Com isso, contribuiu decisivamente para a pecuária alcançar o atual e reconhecido nível de excelência mundial”, diz o bando em comunicado.

Em carta aberta ao agronegócio brasileiro, publicada ainda em dezembro, o banco declarou que: “Ao longo de seus quase 79 anos de história o Bradesco apoiou de forma plena o segmento do agronegócio brasileiro, estabelecendo parcerias sólidas e produtivas. Tal opção é baseada em sua crença indelével nesse segmento enquanto vetor de desenvolvimento social e econômico do país”.

Na carta, o Bradesco ainda tenta se desvencilhar de sua autoria sobre o vídeo. “Contudo, nos últimos dias lamentavelmente vimos uma posição descabida de influenciadores digitais em relação ao consumo de carne bovina, associadas à nossa marca. Importante dizer que tal posição não representa a visão desta casa em relação ao consumo da carne bovina. Pelo contrário. O Bradesco acredita e promove direta e indiretamente a pecuária brasileira e por conseguinte o consumo de carne bovina. Diante do ocorrido, medidas foram imediatamente tomadas incluindo a remoção do conteúdo de ambiente público, e, além disso, ações administrativas internas severas. Dessa forma, reiteramos nossa lamentação pelo ocorrido e reforçamos mais uma vez nossa crença irrestrita na pecuária brasileira”.

Procurada, a Leo Burnett Tailor Made respondeu que “não temos autorização para comentar o assunto”.

Mas para Roberto Kanter, especialista em marketing dos MBAs da FGV, o imbróglio é resultado de uma falha de comunicação compartilhada entre agência e marca.

“É preciso tomar cuidado com a transferência de voz da empresa para influenciadores digitais. Por um lado, os influenciadores querem preservar a autenticidade de sua linguagem com a sua audiência, mas a agência é a responsável por barrar qualquer abordagem que viole os interesses corporativos do seu cliente”, esclarece.

“Temos aqui um caso típico de propaganda controlada, mas com cara de publicidade espontânea”, frisa o professor. Segundo ele, essa discussão resvala na “dificuldade do marketing em enxergar o quadro ampliado, e ter uma equipe verdadeiramente diversa e madura o suficiente para garantir uma visão holística e prever riscos”, resume.

Segundo ele, houve um desalinhamento da comunicação com o interesse corporativo do banco. “Fica o alerta na hora de se colocar terceiros falando pela marca”, insiste. Kanter acredita que uma abordagem com foco em saudabilidade poderia ter evitado a polêmica. Mas o professor também reflete sobre o outro lado da moeda. “A polaridade que vivemos no país, infelizmente mostra o quanto estamos intolerantes”, finaliza.