Samantha transformou ausência em potência, traçando história inspiradora
O que é diversidade? Uma mulher negra de origem periférica pode ser diversa em um ambiente majoritariamente masculino. Mas nos espaços que emergem das comunidades, o homem branco é que será minoria. Perspectiva e contexto desmascaram o conceito que permeia o discurso das marcas. O olhar provocativo proposto por Samantha Almeida, apontada pelo PROPMARK como uma das lideranças femininas de destaque no mercado da propaganda, é um convite à reflexão.
Única brasileira a presidir um júri no Cannes Lions 2023, na categoria de Social & Influencer Lions, a diretora de diversidade e inovação da Globo reverencia a história da publicidade brasileira. Mas lembra que o seto ganhou fama internacional a partir de trabalhos criados por lideranças criativas cultivadas “por um pedaço da população branca, masculina, e vinda da classe média”. Samantha indica o salto que o Brasil pode dar se souber entender o contexto da diversidade.
“Estamos em vantagem em escala mundial”, crava. As chances de premiação no Cannes Lions virão de projetos que saibam mostrar o papel da influência e as escolhas feitas para preencher desejos coletivos. “Processos que combinam técnica, vivência e profundidade nas experiências funcionam”, orienta.
Autenticidade pressupõe identidade. Marcas precisam saber com quem, como e onde falam, para depois trazer uma voz que se encaixe e apresente essa estrutura a novas comunidades. “Essa é a função do influenciador, um cara maneiro, que te apresenta a um grupo novo numa festa, mas quem produz a festa é você, marca”, diferencia Samantha, que destaca o trabalho de curadoria feito ao longo de sua carreira.
Em 2017, ela participou de um clube com 40 influencers promissores, como Tasha & Tracie. “O que mais me orgulha é de ter sido combustível para aquilo que só precisa de alcance”, relembra. Para Samantha, a curadoria passa por encontrar as vozes certas, no tempo certo. “Talvez, essa seja a nossa missão”, constata.
Com Avon, a executiva ajudou a reforçar o movimento de inclusão. Já no Twitter, coordenou uma carteira de 150 clientes, que demandavam decisões rápidas. “Sabemos a importância de construir debate público saudável e justo”, frisa. Da experiência em agências, Samantha extrai a velocidade de aprendizado.
Hoje, na Globo, ela comprova o poder de um dos maiores grupos de mídia do mundo. “Um discurso, produto, episódio de BBB ou novela com fala forte reverbera no Brasil”, reconhece. A sensação é de que a responsabilidade dobrou, mas “tenho jornada protegida pelos Orixás”, assegura.
Os sonhos vão longe. Carioca criada na comunidade da Rocinha (RJ), Samantha, veio para São Paulo aos 13 anos com sua família em busca de estudo e uma nova realidade. Mas cansou de ter a sua origem associada a ausências por não viajar, ter cursos ou falar inglês. “Você não tem, não é, não foi, não fez. Diziam que eu precisava recuperar o tempo, que estaria sempre atrasada”, desabafa.
Hoje, aos 42 anos, Samantha constata que o lugar de ausência virou potência. A sua trajetória traça um caminho moldado por inteligências emocionais e relações cognitivas desenvolvidas para superar os obstáculos impostos por uma vida com menos oportunidades. “Tudo que eu sou, não é apesar de ser uma menina de favela. É justamente porque eu sou uma menina de favela”, atesta.
Samantha ainda se depara com a estranheza de pessoas que insistem em questionar como ela se sente sendo uma mulher negra no ambiente corporativo. “A pergunta deveria ser como as outras pessoas se sentem. Porque para elas, eu sou o novo. Mas para mim, esse lugar, de ser o estranho, de ser o único, é comum”, compara.
Da migração de uma realidade social para outra, e de ser mulher em espaços majoritariamente masculinos, estão indícios de uma vida pautada em “bons confrontos”, garante Samantha. A esperança é por um futuro no qual todos possam partir de um mesmo lugar, tenham a mesma voz e o mesmo peso na tomada de decisão.