Frases e expressões em comerciais que caíam no gosto popular e se tornaram clássicas são cada vez mais raras na propaganda brasileira

Os bordões saíram de moda na publicidade? Primeiramente, vale esclarecer que o bordão nada mais é do que uma frase ou expressão que caiu no gosto popular. Mas a impressão que se tem é que o bordão na propaganda “tomou Doril... e sumiu”. Ao longo de décadas, os criativos brasileiros criaram bordões a partir de paródias de expressões populares que se tornaram clássicos. Quem não se lembra de frases e expressões que marcaram época como “Não é assim uma Brastemp”, “Bonita camisa, Fernandinho”, “51, uma boa ideia”, “Skol desce redondo”, “1001 utilidades”, entre tantas outras guardadas na memória popular que hoje quase não se ouve mais na mídia? Essas frases marcantes tinham alta capacidade de se fixar na mente das pessoas e aumentar o share of mind da marca ou produto.

O bordão geralmente aparecia em comerciais nos canais de TV aberta, em spots de rádio e em anúncios impressos, ou seja, seu espaço era a mídia tradicional. Agora, na era das redes sociais, as marcas, agências e profissionais de social media monitoram os assuntos mais discutidos no Twitter para bolar posts de oportunidade que gerem os famosos “likes” e compartilhamentos, ou virar um meme replicado  via internet.

“O bordão tem sido cada vez menos utilizado por conta, em grande parte, das mudanças no nosso comportamento e na forma como consumimos mídia. Com o aumento da disponibilidade de informações e o acesso à internet, passamos a ter mais opções e nos tornamos mais críticos e refinados em relação à publicidade. As mensagens de marketing precisam ser mais sutis e menos invasivas para captar nossa atenção. Além disso, as redes sociais e as plataformas digitais oferecem novas formas de interação com as marcas, que podem ser mais eficazes do que um simples bordão”, diz Ricardo Miller, diretor de criação da Oliver.  

“Com uma distribuição mais dividida de mídia, a construção de um bordão leva mais tempo e esforço. Importante também é a consistência e continuidade das marcas ano após ano na mesma direção”, completa Laura Esteves, VP de criação da DM9.

Washington Olivetto, um dos mais famosos publicitários brasileiros e craque no assunto bordões, não resume a questão à fragmentação digital e põe o dedo numa ferida da publicidade atual ao comentar o sumiço das frases antológicas nos comerciais: “existiam grandes bordões quando existiam grandes conceitos, criados e trabalhados por grandes talentos. Sem grandes talentos, não existem grandes conceitos, muito menos grandes bordões. O resto é algoritmo”.

“Houve um combinado de evolução de comunicação, meios e direcionamentos diferentes. Estamos menos off e mais multicanal, e quando falamos digital, não falamos de internet apenas, temos inclusive a chegada massiva de streaming – dos mais diversos assuntos. Tudo isso, aliado à mudança de comportamento do consumidor, exige um tipo de comunicação diferente das agências. A comunicação precisa ser mais assertiva e menos massiva, ou seja, direcionada para o público correto com linguagem mais específica e clara. Falando com a pessoa certa, no momento correto, a jornada se intensifica. Estamos em um cenário atual que este consumidor precisa mais de uma experiência do que a comunicação massiva, e tudo tem seu momento. Os próprios canais de mídia offline, como a TV, estão se reinventando, podemos ver as mudanças nos intervalos comerciais, que estão com comunicações mais assertivas e menos publicitária focando na informação precisa e na verdade do consumidor, do que o comercial mais plástico com bordões.” Felipe Andrade, diretor-executivo de criação da Cheil
“É um conjunto de coisas. A fragmentação de mídia certamente é uma delas, assim como a fragmentação de público feita de maneira pouco consistente, sem o cuidado de construir marca. Para acentuar, cada vez mais as empresas focam seus investimentos na parte de baixo do funil, onde é mais difícil construir mensagem. Estamos numa era perigosa, com muitos olhares voltados apenas para resultado de vendas e só! Claro que ele importa, mas tem de haver um equilíbrio de mensagens para que a marca não perca seu valor ao longo dos anos.” Fernanda Cepollini, CCO e CSO da Execution

Veja os outros depoimentos na matéria completa desta semana