Fusão, que ainda depende de autorização de órgãos reguladores, foi anunciada semana passada e movimentou o mercado de games
A Microsoft anunciou na semana passada que está adquirindo a Activision Blizzard, empresa desenvolvedora de games como Diablo, Call of Duty e Candy Crush. Segundo a empresa, a aquisição deverá acelerar o crescimento do negócio de jogos da Microsoft em celulares, PC, console, além de auxiliar no metaverso.
A transação está avaliada em US$ 68,7 bilhões, o equivalente a quase R$ 380 bi. A Microsoft afirmou que, quando a aquisição for concluída, se tornará “a terceira maior empresa de jogos do mundo em receita, atrás da Tencent e da Sony”.
A fusão ainda depende da aprovação de órgãos reguladores, mas, se for aprovada, o negócio coloca a Microsoft na terceira posição entre as maiores companhias de games do mundo, atrás da Tencent e da Sony. A Microsoft divulgou a aquisição como uma forma de avançar na agenda do metaverso por meio do mundo dos games.
O fato é que o anúncio da transação balançou o mercado e mostra o quanto esse segmento mexe com os negócios. Para Willian Pesenti, diretor do SBT Games, esse movimento de compra e fusão é uma tendência que “começou há muito tempo”. “Grandes marcas adquirindo mais e mais publishers ou fazendo parcerias bilionárias. Os games sempre foram uma grande fatia do mercado de entretenimento, agora ganhamos força com o avanço da conectividade e tecnologia”, avalia o executivo.
Já para Alexandre Doria, gerente de planejamento da Talent Marcel, essa mudança da indústria está relacionada diretamente com a história da cultura nerd. “Se olharmos para os anos 1990, os nerds, aqueles que jogavam videogames e D&D, eram marginalizados e sofriam muito preconceito. Isso criou uma comunidade que buscou sua sobrevivência, se autossustentando, se autopromovendo e se tornando extremamente unida”, recorda.
Conforme ele, essa relação fica ainda mais clara quando se olha para a faixa etária mais presente nesse universo. “Segundo a Pesquisa Games Brasil 2021, a maior quantidade de gamers está entre 20 e 34 anos de idade, ou seja, justamente esses nerds que nasceram nos anos 1990, que, agora, são o centro da economia mundial e, com dinheiro, podem consumir o que quiserem desse mundo”, analisa.
Doria cita outra pesquisa, da Visa no Brasil, para ilustrar sua opinião que diz que “eles perceberam que gamers têm movimentado 60% a mais do que a média dos consumidores brasileiros portadores de cartão”. “É por isso que esses mesmos nerds são reverenciados pela cultura pop, foram de nerds à atletas, cineastas, gamers”.
Ele lembra que esse público é “extremamente engajado e disposto a gastar seu dinheiro, e a indústria cresceu para além de hardware, mas também entretenimento, streaming e acima de tudo mobile”. “Estar na mão de qualquer pessoa no mundo foi a maior revolução que essa indústria poderia conseguir, aqui no Brasil chamamos de ‘Efeito Free Fire’, isso porque o ‘Free Fire’ é jogo de mobile mais jogado no Brasil e no mundo. Somado a tudo isso tivemos ainda a pandemia no meio dessa história, que fez o mercado crescer mais rápido que o esperado, as pessoas ficando em casa sem nada para ver, sem esportes ao vivo na TV, recorreram aos games e pessoas que nunca pensaram entrar nesse mundo foram de cabeça”, comenta Doria. Para ele, não é à toa que, em 2005, a indústria de jogos teve receitas de US$ 10,5 bilhões e foi dominada por fabricantes de hardware e consoles portáteis. “Em 2020, apenas 15 anos depois, o setor se transformou em uma potência multiplataforma com receita de US$ 155 bilhões”.
Par Marcelo Soares, diretor de tecnologia da WMcCann, o negócio realizado na semana passada não representa exatamente uma tendência. Para ele, hoje é um movimento esperado, de grandes grupos comprando empresas, estas com alto potencial ou já de reconhecido sucesso e, como nesse caso, em áreas que elas não dominam. “A indústria de games está assumindo o local que era de direito. Antigamente, jogar algum console ou game era tido como vício e perda de tempo; hoje é qualidade de vida, esporte, emprego formal e oportunidade para as marcas”.
Edson Sueyoshi, VP de tecnologia & produção da R/GA, afirma que o mercado de games já vinha em crescimento constante e com a pandemia isso foi acelerado. “Pessoas mais reclusas, estudando e trabalhando remotamente, com menos eventos sociais, reverteu em um crescimento ainda maior do mercado de games, não se restringindo às crianças e adolescentes. A pesquisa Games Brasil de 2021 mostrou que a principal faixa etária é de 25 a 34 anos, 86% preferem jogar pelo celular e as mulheres já são 53,8% deste público”, conta.
Sobre as mudanças que se avizinham com a aquisição da Microsoft, o diretor do SBT Games acredita que isso mostra um pouco do quanto gira de dinheiro dentro do universo de games. “Antes, eu somente ouvia falar em valores gigantescos em prêmios do ‘show do milhão’ e venda de jogadores de futebol. Ver nos games é motivo de orgulho com misto de ansiedade”.
Já Doria fala que a indústria de videogames sempre foi sobre inovação. Para ele, novas tecnologias, novos controles e novas experiências são esperadas. “À medida que o mundo se move cada vez mais e mais tempo é gasto em celulares, serviços de streaming e jogos para celular se tornarão uma arena importante para receitas, grandes empresas de tecnologia procurarão alavancar sua estrutura atual para se envolver. Videogame não é mais só sobre jogos, é sobre entretenimento”.
Segundo Doria, talvez, por isso, a mudança mais interessante na indústria de videogames seja a “expansão demográfica dos jogadores”. “Com mais pessoas jogando, criando demanda por entretenimento mais imersivo e procurando maneiras mais fáceis de acessar jogos, o futuro da indústria de videogames parece ser intrínseco a essas empresas”, prevê.
Ele revela ainda um dado importante para entender a evolução dos negócios envolvendo games: “Cada ano que passa, mais empresas não tradicionais em jogos, como Meta, Apple e Google, estão entrando no setor. A indústria de tecnologia está procurando maneiras de tornar o streaming de videogame tão natural quanto o streaming de uma música no Spotify ou de um filme no Netflix”.
Doria recorda que a Microsoft já está nessa indústria há muito mais tempo por meio de seu popular console Xbox. Em 2019, lançou o Project xCloud, um serviço de streaming de videogame que permite aos usuários transmitir os jogos do Xbox da Microsoft para PCs ou outros dispositivos. “O serviço tornou-se totalmente funcional em setembro de 2020 e pode ser acessado por assinantes do Xbox Game Pass Ultimate. Na Activision Blizzard, a Microsoft adquiriu uma potência de conteúdo responsável por alguns dos maiores sucessos do setor. A empresa também é líder em jogos para celular por meio da aquisição da King Digital Entertainment, fabricante do Candy Crush, uma das maiores receitas no ecossistema móvel”.
Para ele, dada a biblioteca de conteúdo da Activision Blizzard, as apostas de direitos são ainda maiores desta vez. “O conteúdo exclusivo deve atrair mais usuários para as plataformas da Microsoft. Devemos ver no futuro muitas novidades, não só em jogos, mas serviço e sobretudo diferentes tipos de entretenimento”, acredita ele.
O diretor de tecnologia da McCann vê a integração de especialistas e de conhecimento de sucesso como uma área que vai desenvolver experiências mais relevantes. “A gigante de tec não é reconhecida hoje pela criação de games em si, mas sim em consoles. Agora, fecha o ciclo, e eles devem ainda usar esse conhecimento em suas próprias iniciativas no metaverso”, diz Soares.
Para Sueyoshi, o recado é claro a cerca das mudanças que estão por vir. “É uma forte mensagem de como a Microsoft visa aumentar a participação do Xbox no mercado de games, alavancar o Game Pass (serviço de assinatura), ganhando terreno em dispositivos mobile com a força do Candy Crush Saga”. Segundo ele, a Microsoft se aproveitou também do momento de crise de gestão da Activision Blizzard e a queda de suas ações. “Ela traz a expectativa da evolução na qualidade dos games e o lançamento de mais títulos. E como o metaverso é o assunto do momento, a Microsoft se posiciona mais forte nesse contexto”, explica.
E como a publicidade se encaixa neste cenário? A resposta do diretor do SBT Games é clara: “A publicidade vem contribuindo e tentando entender melhor esse caminho. Cada vez mais vejo marcas realizando e apoiando campeonatos e influencers da área. O encaixe está feito, basta executarmos mais e mais projetos que façam real sentido para a comunidade gamer”, orienta.
Já para Doria o marketing no metaverso trará novas ideias criativas, não apenas em torno da publicidade, mas também mudará completamente o mundo experiencial e de eventos. “As marcas precisarão se destacar criando conteúdo e produtos relevantes com base na plataforma de jogos escolhida para alcançar as maiores taxas de engajamento. Podemos até ver as equipes de marketing começarem a pensar com ‘virtual’ primeiro na publicidade de jogos, em vez de replicar produtos”.
Segundo ele, as marcas estão mostrando mais interesse em anúncios dinâmicos no jogo, que são anúncios colocados em um game como um outdoor ou na camisa de um personagem. “O Burger King, por exemplo, ganhou um Grand Prix na categoria Direct no Cannes Lions pelo patrocínio real de um clube de futebol britânico pouco conhecido com o propósito expresso de colocar sua marca (e uniformes com seu logotipo) no jogo Fifa 2020”, lembra ele, acrescentando: “As marcas, porém, não devem pensar em entrar no espaço simplesmente para conectar patrocínios em um jogo e encerrar o dia, mesmo que isso possa fazer parte de uma estratégia geral. Para ter sucesso na comunidade de jogos, as marcas devem se concentrar em trazer experiências autênticas ao público que não distraiam o jogo em si”.
Para Soares, a publicidade deve ser diferente do usual, com inserções pontuais. “Deveríamos fazer parte da jornada como um todo, criando experiências relevantes e que agreguem de fato algo ao público”.
O VP de tecnologia & produção da R/GA acha que com a atenção dos consumidores dispersa em muitos pontos de contato digitais e com o crescimento do mercado de games, os jogos se tornam também plataformas para as marcas entrarem em contato com os consumidores. “Existem soluções que trazem anúncios adaptados à tela na forma de banners, mas as soluções mais impactantes e interessantes quando as marcas entendem a plataforma em si para fazer parte é estar presente sem interromper a experiência do jogador”, alerta.
E com isso tudo o metaverso tem um só caminho: avançar. Conforme Pesenti, por exemplo, “a corrida para o metaverso chegou”. “Todo mundo buscará o seu espaço dentro dessa nova ‘realidade’. Quem joga já vive isso de alguma forma. Comprar skins é um exemplo de aquisições virtuais que acontece há muito tempo”.
Doria resgata o que o CEO da Microsoft, Satya Nadella, disse como parte do anúncio da compra da Activision Blizzard: “Nos jogos, vemos o metaverso como uma coleção de comunidades e identidades individuais ancoradas em fortes franquias de conteúdo acessíveis em todos os dispositivos”. Para Doria, o complicado é como a ideia de uma “plataforma de jogo” está evoluindo.
“O Xbox por si só já é uma plataforma de hardware; esse é o uso tradicional da palavra. Mas o Game Pass é uma plataforma que abrange vários tipos de hardware — consoles Xbox, PCs, dispositivos móveis habilitados para nuvem e muito mais. Além disso, os jogos (Minecraft, Call of Duty, World of Warcraft, etc) podem ser as próprias plataformas — talvez, no jargão atual da Microsoft, ‘plataformas metaverso’.
Ele acha que essa é uma indicação clara de que a Microsoft acredita que uma abordagem monolítica irá falhar. E o ponto da Microsoft parece ser que ‘coisas legais de videogame para todos em todos os dispositivos’ é o caminho a seguir. Soares tem certeza que o metaverso nesta nova configuração começou sua jornada e ainda está longe de atingir o potencial e a usabilidade que farão com que seja o padrão de uso.
Sueyoshi aponta que as plataformas de games são uma porta de entrada ao metaverso ou ao ambiente experimental ao qual ele se propõe, sendo ambientes mais afinados para essa evolução. “Estamos vendo uma corrida dos grandes players de tecnologia para tentar sair na frente e ter uma ‘fatia’ maior do metaverso, inclusive para ditar modelo e padrões que os concorrentes devem seguir. A interoperabilidade (capacidade de ligação e funcionamento de sistemas) entre games dentro de um mesmo guarda-chuva será esperado nessa aquisição, como acumular pontos para o seu ranking global Xbox ou poder levar assets para outros games dentro da Microsoft”. Segundo ele, quanto maior essa capacidade e abrangência em ambientes diferentes, maiores as chances de definir o modelo do metaverso. “E estamos presenciando essa corrida de como esse modelo vai funcionar: um consórcio de empresas? Uma empresa será a líder?”, questiona.
Enfim, a pergunta que não quer calar: quais surpresas esperar? Pesenti diz acreditar muito que tudo vai mudar para muita gente que esteve fora de tecnologia e games. “Para quem joga há muitos anos, finalmente estamos vendo o nosso sonho se tornar real. Todo mundo já sonhou em ter um poder maior de imersão em seus jogos e o metaverso vai proporcionar isso”, avalia.
Para Doria o modelo de jogos de assinatura ficará ainda mais competitivo depois dessa aquisição da Microsoft. “Desde 2017, ela tem sido uma exceção no setor com sua assinatura do Xbox Game Pass. Esse não será o caso em 2022. A Nintendo já começou a reforçar sua assinatura do Switch Online com complementos extras e outras vantagens, e os jogos por assinatura já estão se mostrando um mecanismo de entrega útil para novos serviços, como jogos na nuvem”.
E Soares acha que os clientes ficarão ainda mais exigentes em relação a experiências relevantes e significativas com os consumidores.
Já o VP de Tecnologia & Produção da R/GA aposta em novas aquisições e joint ventures entre empresas de tecnologia que tenham ou não um braço no mercado dos games – a Microsoft tem o Xbox – com empresas especializadas no desenvolvimento de games ou produtoras que trabalhem nesse mercado (vídeo, áudio, 3D, AR/VR). “E também as marcas entrando cada vez mais nas plataformas de games e tentando capturar a audiência para converter ou fidelizar os consumidores”.
OLHO NO RITMO
Kaléo Costa, head de social e performance da Ogilvy LATAM, diz que já acompanhava o crescimento da indústria do entretenimento, que vinha em um ritmo de duplo dígito há alguns anos, e que ganhou mais tração durante a pandemia, já que mais pessoas estiveram dentro de casas, “ávidas por conteúdos e experiências que lhes proporcionassem um pouco de tranquilidade frente ao que temos vivido”. “O crescimento explosivo da indústria de jogos e seus derivados aparece nesse contexto de maior acesso geral à tecnologia, de novas soluções de entretenimento (cloud gaming) e de novas interações virtussociais inerentes do contexto pandêmico, onde jogar deixa de ser um luxo e passa a ser um fato social, algo que tem inspirado adultos a se tornarem exploradores, e jovens a se tornarem profissionais. O sonho do eSports se tornou o novo sonho do futebol”, avalia.
Para ele, com um investimento duas vezes maior do que aquele feito na aquisição do LinkedIn, “a Microsoft deixa mais uma vez claro que – com o perdão do trocadilho – não estão brincando no quesito entretenimento e games”. “A dona do Xbox, do Minecraft e uma das pioneiras do serviço de cloud gaming (serviço de emulação de jogos em nuvem que dispensa o usuário da aquisição de hardware robusto para rodar jogos avançados) traz uma das empresas pioneiras na atuação em MMORPG (Massive Multiplayer Online Role-Playing Game, ou RPG online em massa para múltiplos jogadores) para o seu portfólio de produtos, aumentando o alcance da Microsoft no universo de jogadores (amadores e profissionais), enquanto reforçam seu modelo de negócio de Game as a Service (ou GaaS) já existente hoje com seus produtos de assinatura”.
Segundo ele, para os usuários finais, a robustez de uma Microsoft por trás desses produtos confere segurança de mais inovação, atualizações mais frequentes e mais estabilidade nos servidores, além de uma possível e necessária mudança de cultura nos escritórios da gigante de games. “Para a indústria, temos uma maior consolidação de serviços e produtos oferecidos por um conglomerado de tecnologia e mídia global, que assegura aos anunciantes, agências e desenvolvedoras um suporte mais próximo e mais flexível às necessidades de cada mercado e segmento.
Arthur Ribas, especialista de games da Execution, lembra a indústria dos games se tornou o maior mercado de entretenimento e hoje fatura mais do que a indústria de cinema e música juntos. “A cada ano esse mercado está mais acessível (muitos jogos grandes são gratuitos), com mais investimentos de produção, maior repercussão, e o fato da popularização dos smartphones colocou literalmente o mundo dos games na mão de muitos novos jogadores que não tinham, antes dos celulares, o hábito de jogar”.
Para ele, com a compra da Activision Blizzard, a Microsoft vai ter uma vantagem comercial muito grande porque a aquisição vem com 400 milhões de usuários ativos, além de um catálogo de jogos que a Microsoft pode utilizar como venda exclusiva (retirando a opção de venda pela sua rival Sony) ou até inserindo os jogos em seu catálogo da Xbox Game Pass (uma espécie de Netflix dos games com 25 milhões de jogadores que a Microsoft distribuiu através do Xbox e do PC).
Ribas olha um pouco para o passado e lembra que há 15 anos o mercado brasileiro não era prioridade para as grandes desenvolvedoras de jogos, um exemplo é a dublagem dos games em português que simplesmente não existia na época do Playstation 3 e, agora, na geração do Playstation 5 quase todos os jogos grandes são localizados em português do Brasil. “Esse maior investimento no nosso mercado abriu a porta para games realizarem grandes campanhas de lançamento no território nacional”.
Ele acredita ainda que o metaverso ainda é um assunto que tanto pode ser o futuro da interação social, como também pode morrer na praia, dependendo da aceitação do público e da facilidade de soluções para o dia a dia que ele pode trazer.
“Ouvi alguns lugares relacionarem a compra da Activision Blizzard com o metaverso, mas acho que não tem relação. Um bom exemplo é que o jogo World of Warcraft da Blizzard é praticamente um metaverso medieval que funciona perfeitamente desde 2004”, afirma ele, acrescentando: “Levando em conta que o metaverso seria um ambiente virtual que substituiria a nossa realidade, isso já foi testado no jogo Second Life, lançado em 2003. Nesse jogo você podia trabalhar, comprar terreno, construir sua casa e conhecer, e ele simplesmente não vingou. O que eu tenho ouvido falar sobre metaverso me parece a esperança de tornar viável o Second Life”.
O que mais o especialista em games é o salto de qualidade visual dos jogos a cada nova geração. “Alguns games você tem que olhar duas vezes para saber se é uma imagem 3D ou se é filmagem real. A tecnologia da vez é chamada de Ray Tracing, que calcula a iluminação dinâmica do jogo para deixar um visual muito mais real”, detalha. Segundo ele, isso tudo é possível porque o processamento dos computadores e dos videogames continuam aumentando em larga escala. “Se continuarmos evoluindo nesse ritmo, nem consigo imaginar o que teremos de tecnologia de games daqui a 20 anos”.
Ivan Cavalheiro, gerente de arquitetura de soluções da Hogarth Brasil, analisa que a indústria de jogos já era maior que a de Hollywood muito antes da pandemia. Agora, por causa do isolamento social as pessoas tieram mais tempo disponível, por isso, cresceu como nunca. “Jogos são apenas uma das várias formas de entretenimento, mas, ao contrário das mais tradicionais – como filmes e música –, com eles temos um nível de interatividade muito maior e por muito mais tempo, com formas de monetizar o produto que vão muito além do ticket de compra”.
Segundo avaliação de Cavalheiro, a aquisição também acontece com um timing impecável: “do lado da Microsoft, se tem uma empresa gigante com vários títulos famosos, mas com pouca capacidade produtiva na área de jogos; do outro, da Activision Blizzard, uma empresa com um portfólio invejável e anos de experiência na indústria, mas que está passando por um dos seus piores momentos depois dos escândalos de assédio. Tudo isso inflado pelo recente boom do metaverso”.
Para ele, o negócio realizado semana passada fortalece ainda mais a posição da Microsoft como plataforma de jogos – ainda que outra gigante, a Steam, “esteja investindo em plataformas alternativas, como o Linux, no seu mais novo produto: Steam Deck – e abre uma vantagem enorme para o Xbox Game Pass, com um portfólio imbatível”. “Isso também representa uma clara indicação de que a Microsoft quer investir em novos títulos e expandir suas propriedades intelectuais (IPs), e provavelmente isso deve incluir planos para o metaverso”, declara.
No quesito propaganda, segundo ele, o mercado de jogos é uma nova plataforma para publicidade, cujos “usuários têm uma interação muito maior com o produto e com anúncios”. O importante é entender as diferenças que essa mídia traz se comparada a meios mais tradicionais, como a televisão e o rádio. Jogos são uma mídia muito mais conectada, que gira muito rápido e se refaz em dias. Seu público é bem mais engajado e fiel, consumindo muito conteúdo relativo aos seus jogos favoritos. Plataformas inteiras nasceram nesse mercado graças a tal comportamento, como o Discord e o Twitch”, explica.
Para ele, o metaverso veio para ficar, mas “provavelmente vai sofrer muitas alterações no seu formato nos próximos anos”. “A Meta tem investido fortemente no metaverso VR (realidade virtual), com a compra da Oculus e o seu mais novo lançamento, o Quest 2, a um preço muito mais acessível. Provavelmente esse tipo de interação vai ser mais voltada a jogos e experiências imersivas. Já a Microsoft, com seu Hololens, tem investido em um metaverso ligeiramente diferente, com interações AR (realidade aumentada) muito mais fortes. AR provavelmente vai ser o meio de acesso ao metaverso mais utilizado pelo mercado em alguns anos”, conclui.
Gustavo Scaranello, analista de monitoramento da Peppery, prevê que a compra da Activision pela Microsoft mostra como serão as coisas daqui para frente; grandes empresas se unindo para salvar outras gigantes. “Levando em consideração que a Activision perdeu muito espaço no mundo dos consoles, ainda domina, mas não como dominava antes, a aquisição mostra o poder e influência que o mercado de games possui atualmente.
Para ele, as principais mudanças com o negócio consolidado seriam o aumento de visibilidade que a Activision terá, levando em consideração que foi comprada por uma gigante da tecnologia conhecida mundialmente. “Creio que também haverá uma exclusividade para games da Activision, sendo removidos de outras plataformas no futuro”, opina.
Ainda segundo Scaranello, a publicidade será uma parceira importante nessa nova jornada da Microsoft, pois pode se encaixar na divulgação dos produtos e ser bem apelativa com relação aos seus consumidores. “Acredite, ser bem apelativo com o público gamer é uma ótima ideia”. Ele acredita também que o metaverso vai evoluir cada vez mais, “ainda mais no mundo dos games e poderá torná-lo mais conhecido e relevante para o grande público”.