Entre os anos 1980 e 1990, fui algumas vezes jurado em sessões de julgamento no Tribunal de São Paulo. A grande maioria dos réus, com notórias evidências dos seus crimes apresentadas ao corpo do júri pela Promotoria, havia negado seus delitos na fase do inquérito policial.
Seus advogados, inclusive os dativos, conforme o caso, procuravam seguir pelo mesmo caminho da negação, com o cuidado profissional de não exagerar se os autos do processo eram claros quanto à autoria.
A prática é decorrência de uma técnica jurídica exercida pela defesa, que aposta na máxima “em dúvida, pró réu”.
Nas artes políticas, ficou consagrado o princípio exaustivamente exercido pelo ministro da Propaganda de Hitler, Joseph Goebbels, cujo enunciado é “uma mentira mil vezes repetida vira verdade”.
Se vira verdade, ou não, nem sempre acontece. Mas, é uma prática provocante para alguns governos de linha totalitária, ainda que sob a égide democrática.
Foi o que vimos e prosseguimos vendo no caso específico do impeachment de Dilma Rousseff, que acaba de ser afastada por até 180 dias, para que o Senado da República julgue os seus crimes de responsabilidade (que são diferentes dos previstos no Código Penal), podendo afastá-la de forma definitiva se 2/3 dos parlamentares assim decidirem.
Para maior garantia desse julgamento, que ocorrerá em diversas sessões, a presidência (sem direito a voto) caberá ao ministro presidente do STF, que, entre outros cuidados, poderá dirimir dúvidas surgidas nas diversas etapas do julgamento com relação às questões que serão interpostas.
É bom lembrar que esse mesmo Senado já acolheu o julgamento do impeachment, afastando em consequência e provisoriamente a presidente da República por até 180 dias, prazo em que terá de chegar ao fim da apreciação do caso.
O país inteiro e boa parte do mundo ocidental assistiram ao julgamento do acolhimento do pedido de impeachment, já aprovado pela Câmara Federal e enviado ao Senado.
Todo esse trâmite legal não foi suficiente, todavia, para convencer a presidente afastada Dilma Rousseff de que não existe golpe.
Mas, tanto ela quanto os seus partidários prosseguem obedecendo a uma cansativa narrativa que em muito lembra o comportamento daqueles réus aos quais acima me referi, em busca de estabelecer dúvidas no corpo de jurados para lhes favorecer.
Duvidamos de nossa parte que os senadores, experientes políticos com carreiras bastante percorridas na vida pública, se deixem levar por esse caminho. Quando muito, os integrantes do Senado que pertencem à parte da coligação partidária que ainda oferece apoio a Dilma Rousseff, votarão fechados ao seu favor, porque em sua essência trata-se de um julgamento político.
Nenhum deles, porém, em sã consciência, acredita na sua inocência diante do que está sendo acusada. A menos que não concordem com os dispositivos legais que a responsabilizam, mas aí já é demais…
O resultado de toda essa confusão proposital – porque a lei é clara – tem seus dividendos: se não os senadores, gente presumivelmente mais esclarecida sobre o significado de cada dispositivo que integra o arcabouço jurídico brasileiro, há entre a população quem fique em dúvida, primeiro por não possuir conhecimento suficiente do emaranhado das leis do país e suas abrangências. Segundo, porque a técnica da repetição de que é golpe acaba convencendo, de uma forma ou de outra, quem ainda acredita no governo de Dilma Rousseff e através do benefício da dúvida se satisfaz.
Claro que para a grande maioria da população brasileira não deve haver dúvida alguma sobre a responsabilidade da presidente afastada.
Mas, para os seus partidários e simpatizantes, ainda que hoje em número significativamente menor em relação ao total de votos que ela obteve nas eleições de 2014, trata-se do suficiente para continuarem por ela torcendo.
Muito parecido com o comportamento dos torcedores de futebol, que comemoram um gol através de um pênalti claramente inexistente.
A paixão é apaixonante.
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O ferramental da comunicação do marketing será de grande importância para a recuperação da economia brasileira.
Os anunciantes têm consciência disso, as agências sabem que têm de ser assim, a mídia aguarda que assim seja e os consumidores adorarão o retorno da propaganda aos meios, ocupando 100% dos espaços e tempo a ela destinados.
Se no início de cada período crítico a publicidade é a primeira a ser cortada, como costuma ocorrer (por ser o investimento mais fácil de ser brecado pelas empresas-anunciantes), a recíproca tem de ser verdadeira e o mercado vai provar isso já a partir desta semana: também deve ser a primeira (a publicidade) a voltar, iniciada a luta pela extinção ou ainda que apenas diminuição da crise.
Ela é a mola propulsora da economia e seus negócios. Sempre foi e sempre será nos regimes verdadeiramente democráticos.
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Os sentimentos da equipe PROPMARK à família Salles, pelo prematuro falecimento do querido e já saudoso Paulo Salles.
Armando Ferrentini é diretor-presidente da Editora Referência, que edita o PROPMARK e as revistas Propaganda e Marketing