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Cresci vendo meu pai desenhar. Lembro-me que ele chegava da agência de propaganda onde trabalhava como diretor de arte e, depois do jantar, ia para a prancheta e lá ficava desenhando até altas horas enquanto eu ficava ali, no cantinho da mesa, observando. Na maioria das vezes era algum trabalho de freelancer que ajudava bastante no orçamento de casa, outras vezes era só para curtir as cores e os traços sem nenhum motivo aparente. Aquele cenário me inspirava. Ele adorava desenhar para mim e, no meio dos desenhos, iam nascendo histórias. Nessa época, comecei a estudar piano e minhas maiores inspirações eram Bach, Beethoven, Brahms e Chopin, meus compositores preferidos. Formei-me em Piano quase que ao mesmo tempo em que me formei em Propaganda. Nessa época, eu já trabalhava em uma agência e meus heróis passaram a ser também os publicitários.

Com pouco mais de 20 anos resolvi dar uma volta pelas agências de propaganda na Europa. Além de agências, visitei uma enormidade de museus. Fiquei chocado com as exposições, desde o museu Picasso, o Georges Pompidou (com uma deslumbrante retrospectiva do pintor Francis Bacon) ao recém-aberto Rainha Sofia de Madrid (com uma incrível mostra das pinturas de Giacometti, que era escultor, mas pintava igualmente bem).

Voltei para o Rio, arrumei as malas e parti para São Paulo, indo trabalhar numa agência. Além do trabalho como diretor de arte, comecei a pintar. Aquelas visitas aos museus mexeram profundamente comigo. Anos depois, expus em São Paulo, Nova York, Miami e Paris.

Eu sempre fui um “observador” de pessoas. Não paro de reparar em hábitos, trejeitos e manias. Chego até a imitar quem tem alguma peculiaridade, algum traço diferente. Incorporo mesmo. Usei muito disso no meu dia a dia como publicitário, criando campanhas e personagens.

Um dia, em casa, num café da manhã, meu filho de 7 anos, me trouxe um desenho. Era de um menino chutando uma bola. Naquele momento eu tive um insight: e se eu animasse esse desenho, com uma história bacana e a locução fosse feita só por crianças? Daí nasceu o projeto De criança para Criança.

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Saí da agência em que estava e resolvi apostar na nova ideia. Chamei dois amigos que viraram sócios, o Gilberto Barroso, que trabalhava com canais internacionais de TV paga, e o Gian Carlo Rocchiccioli, que era sócio de uma agência de propaganda. Montamos uma produtora e produzimos uma primeira temporada com 24 episódios, todos feitos com desenhos e locuções de crianças, que será lançado ainda este ano.

Nesse meio tempo, entendendo que o projeto não deveria ficar restrito a umas poucas crianças desenhando para um número X de episódios, criamos uma plataforma colaborativa (www.decriancaparacrianca.com.br) onde crianças do mundo inteiro podem participar contando histórias, desenhando e fazendo locuções. Foi aí que nasceu o Criando Juntos, que faz parte do projeto De Criança para Criança. Com esse material disponibilizado na plataforma, começamos a desenvolver muitas animações.

Estamos implementando o Criando Juntos em 20 escolas, com a perspectiva de chegarmos a 40 ainda este ano. Temos um número incrível de crianças desenhando, escrevendo histórias e fazendo locuções. Nossa plataforma colaborativa está a todo vapor.

Percebi hoje que a minha maior inspiração estava bem na minha frente, começou com o meu pai e continuou com o meu filho. Entendi que a inspiração veio de alguma maneira para construir algo diferente, relevante para mim e também para muitas crianças.

Vitor Azambuja é diretor de criação do projeto De Criança Para Criança