A Abap (Associação Brasileira de Agências de Publicidade) reuniu, na última sexta-feira (12), lideranças do mercado no Rio de Janeiro. Orlando Marques, presidente nacional da entidade, fez duras críticas à divulgação, semana passada, da restrição à propaganda de bebidas alcoólicas – em especial cervejas e vinhos (veja na página 33) – pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, no Rio Grande do Sul.
Ele foi enfático: “A entidade se posiciona fortemente contra”, disse Marques, argumentando que não é da competência do Rio Grande do Sul legislar sobre isso, que é de âmbito federal. “Respeitamos a lei e decisões da Justiça. Não compete ao governo do Rio Grande do Sul legislar sobre propaganda de cervejas. Quem deve anunciar, que segmentos e como é responsabilidade federal, está na Constituição. Nós vamos recorrer e temos certeza de que isso vai subir para outro nível. É no Congresso e no Executivo que isso vai se resolver. Em segundo lugar, o Conar já cuida disso muito bem”, disse.
Outro ponto polêmico debatido durante a reunião foi a restrição à publicidade infantil. A presidente da Associação Brasileira de Licenciamento (Abral), Marici Ferreira, apresentou a campanha “#EduqueSemMedo”, projeto de comunicação que tem como objetivo debater a educação e seus desdobramentos, em especial no que se refere à publicidade dirigida ao público infantil. A Abral entende que, no lugar de restringir a publicidade infantil, é preciso ajudar pais e famílias a educar e impor limites necessários sem perder o controle.
“Perdemos o controle quando passamos a necessitar da aprovação dos nossos filhos e não eles da nossa”, diz uma das peças de divulgação do projeto, um vídeo desenvolvido produtora Dogs can Fly. O projeto já tem uma página no Facebook, um blog e perfil no Instagram. Marques disse que no ano que vem a Abap terá um reforço em Brasília para cuidar do assunto.
Sobre a recente resolução divulgada pelo Conanda, que sugere a proibição da publicidade dirigida ao público infantil (veja reportagem na página 18 sobre os prejuízos que as restrições podem gerar), o presidente da Abap enfatizou que o assunto deve ser tratado com projetos de lei devidamente enviados ao Congresso. “O Conanda (Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente) não tem poder para modificar a lei. Se houver uma lei, de fato, iremos respeitar. Não existe lei, ainda. Não se deve fazer terrorismo, dizendo que há um desrespeito à lei porque ela não existe, e sim uma resolução do Conanda”, conclui.
Previsão
Marques afirmou, ainda durante o encontro, que o mercado publicitário deve crescer entre 6% e 8% este ano. O encontro também discutiu assuntos relativos às eleições gerais da entidade para o biênio 2015-2017. Embora venha sendo ventilada a possibilidade de uma reeleição de Marques, o executivo prefere não confirmar sua permanência, avisando que haverá uma nova reunião nacional em março do ano que vem.
“Não foi um ano bom e poucas agências fecharam acima do ano passado. E no ano que vem, pelo menos no primeiro semestre, não será fácil. Como sou otimista, acredito no Brasil, um país grande e cheio de possibilidades, com mercado competitivo, onde sem boas agências não se constróem grandes marcas. Mas haverá uma reorganização da economia e o primeiro semestre tende a ser fraco. Se conseguirmos trabalhar bem no primeiro semestre talvez possamos fazer um segundo melhor e terminar o ano bem”, disse.
Alguns diretores da entidade presentes na reunião concordaram com a previsão. Muitos acham que o primeiro semestre servirá para “arrumar a casa” depois de um ano bastante movimentado e atípico devido à Copa do Mundo e às eleições.
Antonio Freitas, presidente da Master, concordou que o início de ano será bem difícil. Queiroz Filho, presidente da Ampla, sediada em Recife, afirmou estar um pouco mais otimista, pois, segundo ele, o Nordeste não sentiu os efeitos da crise como a região Sudeste. Mesmo assim, as perspectivas não são tão animadoras. “Continuamos crescendo, mas sinto que os clientes estão querendo puxar o freio de mão”, afirmou.
Renato Tourinho, que preside a Abap na Bahia e é presidente da Agência Única, de Salvador, disse que o Estado continua perdendo anunciantes – cuja administração vem se transferindo para a região Sudeste, e isso é preocupante, pois as contas publicitárias tendem a se transferir do âmbito regional. “Precisamos focar em transformar anunciantes médios em grandes anunciantes, atendidos por nossas agências locais”, disse.
Clóvis Speroni, presidente da Agência3, do Rio de Janeiro, sugeriu a realização de uma campanha publicitária ressaltando os benefícios da publicidade para as marcas. Marques considerou a possibilidade, embora acredite que os altos custos inviabilizariam, por hora, o projeto.
O presidente do Cenp, Caio Barsotti, anunciou a criação de um novo processo de certificação das agências, que será totalmente eletrônico. “É uma ferramenta que tornará tudo mais fácil, rápido e confiável porque é à prova de adulterações”, disse Barsotti, que também anunciou a veiculação, no início do ano, de uma campanha sobre o comitê de mídia da entidade que incentiva as melhores práticas no setor.
Interior
Renato Meirelles, presidente do instituto Data Popular, foi convidado pela Abap para falar sobre o potencial do mercado do interior no Brasil e afirmou que houve, nos últimos anos, uma mudança importante na classe média, em especial no interior: a geração de empregos formais. “Mais do que o Bolsa Família, o que tem feito a diferença no país, movimentando o crédito e o setor de turismo, por exemplo, é o aumento do índice de carteiras assinadas”, disse.
Hoje, 53% dos trabalhadores têm carteira assinada no Brasil, sendo 37% no interior. Meirelles também declarou que a cada R$ 100 do crescimento de renda no Brasil, o interior contribui com R$ 62. Por mais que a renda tenha crescido, a distribuição permanece desigual e apenas 5% dos brasileiros têm renda mensal acima de R$ 2.005. Segundo os dados apresentados por Meirelles, metade dos brasileiros têm renda domiciliar per capita de até R$ 550 por mês.
Hoje são 96 milhões de pessoas no interior do país. Segundo o executivo, o interior contribuiu com 64% para expansão da classe média brasileira, onde ela cresceu mais do que nas regiões metropolitanas – onde, por outro lado, mercados antes invisíveis, como as favelas, ganharam força. Hoje a renda anual das favelas é de cerca de R$ 64,5 bilhões por mês. “O que é importante é que se mude o senso comum da imagem da classe C. Ela movimenta uma massa de renda de R$ 1,21 trilhão. No interior, famílias de classe média movimentam R$ 27 bilhões por ano. E há uma geração de jovens da classe C, entre 18 e 30 anos, que movimenta mais dinheiro do que os jovens da elite”, disse Meirelles.
Secom
Roberto Messias, secretário-executivo do SCOM/PF marcou presença na reunião da Abap anunciando alguns números e novidades acerca de gestão que “recomeça” com a continuidade do governo de Dilma Roussef. Formada por 45 anunciantes, atendidos por 40 agências, a Secretaria investiu R$ 2,26 bilhões em 2013 em três categorias de publicidade: institucional, de utilidade pública e mercadológica. Os esforços regionais abrangem 27 Estados e 3 mil municípios, sendo que há alguns investimentos bem específicos como a “Seca no semiárido”, a regularização do registro civil de nascimento e a operação Ágata em regiões fronteiriças.
Messias destacou as normas licitatórias da Lei 12.232, que trouxeram algumas vantagens para os processos, como maior preocupação com sua subjetividade, a inversão das fases que permitem análise da proposta técnica, pré-habilitação e a escolha de agência por definição específica, o que não permite que a mesma forneça serviços de outras áreas como relações públicas, por exemplo.
A Secretaria também conta hoje com um Comitê de Negociação de Mídia, criado para fazer negócios em condições melhores de compra de espaços e melhores práticas junto aos 30 grandes grupos de comunicação brasileiros. O cadastro de veiculos do Secom conta hoje com 10.304 veículos, de 2.040 municípios. São, por exemplo, 3.063 rádios e 2.779 jornais. Na mídia digital a Secom se sofistica, buscando aprimorar critérios de mensuração e métricas de avaliação. “Hoje temos uma ‘pseudoagência online’, que é a Leo Burnett”, afirmou.
Entre os projetos para o ano que vem estão a instituição de novas instruções normativas de publicidade, patrocínio e internet; a padronização de editais; a uniformização de procedimentos de execução contratual e a institucionalização do Cadastro de Veículos (Mídia Card).
Propaganda de cerveja
O Tribunal Regional Federal da 4ª Região acaba de determinar uma série de restrições à publicidade de bebidas alcoólicas com teor acima de 0,5%: suas mensagens somente poderão ser veiculadas entre 21 horas e 6 horas da manhã, sendo que, entre 21 e 23 horas, apenas nos intervalos de programas não recomendados para menores de 18 anos.
A decisão da Justiça Federal confirma proibições anteriores, como não associar bebidas alcoólicas ao esporte olímpico, ou de competição, ao desempenho saudável de qualquer atividade, à direção de veículos automotores e à ideia de maior êxito ou sexualidade.
Cabem recursos previstos em lei dessa decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, porém a Associação Brasileira da Indústria da Cerveja informou que somente irá se pronunciar após os fabricantes serem notificados oficialmente da decisão judicial.