Cannes é um prato de digestão lenta. A gente consome em cinco dias mas leva meses até absorver tudo, fuçando o Cannes Archive. Lá vão, portanto, alguns pensamentos aleatórios que tive de bate-pronto.
Em primeiro lugar, me chamou atenção o tema ambiental voltando ao topo da criatividade mundial e, curiosamente, sempre pelo viés jurídico/regulatório. Palau Pledge e Trash Isles, GPs, e Nature Represented, dois ouros, buscam, cada um a seu modo, defender a natureza através da força de um contrato ou de uma lei. Coincidência? Talvez. Mas curioso, não?
Mudando de pato pra ganso: as mudanças no sistema de pontuação prejudicam latino-americanos, asiáticos e periféricos em geral – como se supunha – e favorecem EUA e Europa. Claro, lá estão os grandes budgets e as grandes marcas, trazendo a fina flor do craft. Apple Home e Nike “How to be a Londoner” são excelentes exemplos. Disputando um jogo da criatividade impecavelmente aplicada, anglo-saxões trazem mais GPs e ouros, que agora valem muito mais do que antes. Resultado? Agency of the Year para adam&eveDDB (Londres), seguida de BBDO NY e AMV BBDO (Londres).
Desempenho brasileiro: olha, dá pra dizer que o resultado foi bastante bom. São dois leões a mais do que ano passado, mesmo inscrevendo 29% menos. Uma taxa de conversão boa – 4,73% versus a tradicional média de 3% do festival – e motivo de orgulho pra todos nós.
Por fim, o tal FOMO foi multiplicado por 1000. Uma palestra tem que ser muito legal para não dar aquela sensação de “Puxa, por que eu tô aqui e não ali, ou lá?”.
Por sorte, assisti a algumas palestras geniais, como “David Schwimmer The Rainbow”, com o Ross de “Friends” contando o backstage da campanha de Skittles “Marcos the Rainbow” (dá um Google lá), o tenso painel “Sir Martin Sorrell in Conversation with Ken Auletta”, onde ambos se alfinetaram sem cerimônia, e a comovente “The Lion of St. Mark Interview: The Pandey Brothers”, uma conversa emocionante com os lendários irmãos que revelaram a publicidade indiana para o mundo e receberam merecida reverência da comunidade criativa global.
Entre euforia, ressaca, exaustão, reflexão, angústia e mais uns 100 sentimentos diferentes, despeço-me.
Que venha Cannes 2019.
Adriano Matos é VP de criação da Grey