A masculinidade de muitos brasileiros é, aparentemente, bem frágil. No Jogo do Bicho, o veado – animal cujo nome se tornou termo pejorativo para designar gays – é representado pelo número 24. Por isso, muitos “homens” temem o numeral.

Há pouco tempo, por exemplo, o Senado retomou o gabinete 24. A numeração exposta nas portas, conforme relatou a Folha, começava no 1 e seguia a sequência numérica lógica até chegar ao 23. Daí, sem explicação, pulava para o 25. Tudo porque ninguém queria o 24.

Com a morte de Kobe Bryant, houve quem ficasse bastante confuso sobre a numeração do astro do basquete norte-americano:

No futebol, esporte sabidamente homofóbico, há o mesmo problema: ninguém quer a camisa 24 de um time. Mas isso começou a mudar recentemente, depois que a vestimenta de um Rei ganhou a numeração:

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Em meados de janeiro, a Champions LiGay, liga de futebol voltada à participação de jogadores LGBTQIA+, promoveu o #FutebolSemPreconceito, movimento contra a homofobia em campo e nas arquibancadas. O grupo realizou ação, assinada pela AlmapBBDO, em que a icônica estátua de Pelé, em Santos, amanheceu vestida com a camiseta 24.

A LiGay reúne 28 times de futebol espalhados pelo Brasil inteiro, contando com um total de 60 times cadastrados. Realiza campeonatos nacionais e também regionais.

“É incrível ver uma iniciativa como a do #FutebolSemPreconceito, lançada pela LiGay na ocasião em que vestiu a estátua do Pelé em Santos, reverberar e inspirar outras ações semelhantes para outros times de futebol, a favor da diversidade em campo. Quando os esforços se somam, os resultados concretos logo aparecem. Futebol e sociedade só têm a ganhar com essas movimentações”, afirma Luiz Sanches, CCO & Chairman da AlmapBBDO.

Para Josué Machado, presidente da LiGay, “como qualquer outro indivíduo, uma pessoa LGBTQIA+ gosta de futebol, tem a paixão por seu time e ama esse esporte. Mas, infelizmente, muitos têm o direito de ir ao estádio tolhido por um ambiente preconceituoso”.

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Na última terça-feira (28), o volante Flávio, do Bahia, entrou em campo vestindo a 24. A ação agora recebe o apoio da Cervejaria Brahma, que convidou mais clubes a também vestirem o que a marca chama de #NúmeroDoRespeito. Botafogo, Fluminense, Santos e Flamengo foram os primeiros a aderir. Este último, inclusive, dará a famigerada peça com o numeral para o seu maior nome: Gabigol.

Criada pela agência Africa, a ação esteve entre os assuntos mais falados na mídia na semana passada. Flávio já declarou que, a partir de agora, passa a vestir a camisa 24 definitivamente.

“O preconceito em torno do número 24 é uma grande bobagem que já passou da hora de ser ultrapassada. Precisamos desmistificar isso e aproveitar para debater a intolerância no futebol”, destacou o meio-campista.

“Essa é uma campanha a favor do respeito a todos e todas que queiram viver o futebol sem barreiras. Brahma é parceira do futebol brasileiro e de grandes clubes do país e se associa ao Bahia nessa luta para que todos clubes também vejam neste movimento um passo definitivo para acabar com o tabu em torno do número 24”, disse Gustavo Castro, diretor de marketing de Brahma.

“O futebol é um canal que pode servir para acentuar o que há de pior na nossa sociedade, como o racismo, as agressões, a violência e a intolerância, mas também pode servir de uma forma diferente – para espalhar cultura, afeto, sensibilidade, melhoria das relações humanas. Por isso é importante ter um parceiro tão identificado com o futebol, como Brahma, para ampliar essa mensagem. Achamos que os clubes têm de escolher se serão canais de amor ou ódio. Escolhemos o amor”, afirma Guilherme Bellintani, presidente do Bahia.

Vale ressaltar que o movimento ganhou força após declaração de Duílio Monteiro Alves, diretor do Corinthians que, durante a apresentação do colombiano Cantillo, disse que no clube não se usa o 24. Posteriormente, o jogador carregou a numeração nas costas e o diretor pediu desculpas.