Muitos de meus amigos estão mudando para Portugal. Outros tantos têm ido para lá como quando eu era paulista a turma ia pra Santos. Deve ter mais português nas ruas do Rio de Janeiro do que em Lisboa, onde a maioria das pessoas que transitam por lá é de brasileiros. Eu, infelizmente, há muito tempo não vou à terrinha, embora tenha engordado só pelas fotos que meus amigos me enviam via Facebook. Acho uma maldade das piores esse hábito.

O costume é a gente receber selfies com praias ou monumentos ao fundo. No meu caso não, no meu caso a preferência dos meus amigos é me mandarem fotos do que estão comendo. No sentido gastronômico. Imensos bacalhaus, leitãozinhos de todos os tipos, cozidos, quase pornográficos. Já que falei em pornografia, para os que confiam na minha opinião gastronômica e me consultam sobre quais as especialidades típicas portuguesas que eu recomendo, tenho um menu arrasador, que vale pelo gosto e justifica um bom papo na volta.

É uma ajuda para os viajadores que só acreditam que estão em algum lugar quando enviam a foto para o grupo. Vamos lá. Como início, eu recomendo sempre uma Punheta de Bacalhau. Não há nada melhor para começar do que uma boa punhetinha, devidamente untada de bom azeite extravirgem. E tem uma vantagem: em caso de uma rapidinha, a punheta substitui o prato principal e é uma solução alternativa que acalma a sofreguidão. Como entrada, podemos ter uma Sopa de Grelos ou uma sopa seca que se Agarra às Costas. Ambas são respeitáveis entradas, sendo que a Agarra às Costas é a mais simples e mais fácil, pois é apenas feijão e pão, evidentemente temperada conforme os costumes locais. O prato principal pode ser um Arroz de Pica, uma especialidade do Entre-Douro e Minho. É feito com frango e toucinho e equivale a… um Arroz de Pica, ora pois. Para acompanhar, aconselho caralhotas, pequenos pães da região do Almerim. E que se beba algum vinho como um Monte das Abertas do Alentejo ou um Dão Quinta das Peladas.

Se você estiver no Ribatejo, pode pedir sem susto uma garrafa de Rapadas. E para macho que é macho e está disposto a enfrentar algo mais pesado, o Douro oferece o incrível Três Bagos. Na sobremesa, podemos pedir Mamadinhas de Tentúgal ou Espera-Marido à Transmontana. O Espera-Marido parece simples, pois é feito de açúcar, ovos e canela em pó. Mas o resultado é maravilhoso. Já a Mamadinha é uma especialidade Transmontana, feita por freiras nos conventos, mas hoje disseminado por quase toda região.

Como digestivo podemos recomendar um Licor de Merda, bebida na região de Catanhende, feita à base de leite, baunilha, cacau, canela e frutas cítricas. Esse licor se encontra também no Brasil no restaurante Metrô, na Cinelândia do Rio de Janeiro. A melhor água mineral que se pode encontrar é a Penacova, “uma pureza da Serra do Buçaco”, conforme diz seu anúncio. Por falar em vinho, eu tenho um amigo proprietário de um olival no Chile. Tentando ajudá-lo, mandei email para a dona da vinícola que produz o vinho Monte dos Cabaços, no Alentejo, sondando a possibilidade de uma franquia para a marca, pensando num produto que se chamaria “Azeite Extravirgem Monte dos Cabaços”. Não me responderam.

Uma história que tem tudo a ver com Portugal e restaurantes aconteceu com um amigo na Póvoa do Varzim, uma cidade perto do Porto que tem um importante evento literário. No cardápio, um bacalhau cozido muito recomendado e as tais Punhetas de Bacalhau. Querendo experimentar os dois, fez o pedido ao dono da casa e ouviu em resposta: “não vou lhe servir ambos, pois comes a Punheta e perdes a fome, deixas o bacalhau à mesa, e os fregueses vão pensar que és um frouxo ou meu bacalhau uma merda. Como não quero que isso aconteça, ficas sem a Punheta e esperas com calma o bacalhau”. Não é uma obra-prima?

Lula Vieira é publicitário, diretor do Grupo Mesa e da Approach Comunicação, radialista, escritor, editor e professor (lulavieira@grupomesa.com.br)