Grandes marcas nos Estados Unidos e no Brasil resolveram entrar na conversa social sobre racismo, deflagrada após o assassinato de George Floyd, um homem negro sufocado por um policial que se ajoelhou sobre seu pescoço por pelo menos sete minutos, enquanto ele estava algemado e deitado de bruços. A tragédia vem causando uma série de protestos nos EUA, além de uma comoção que cruzou as fronteiras norte-americanas.

Ricardo Silvestre, fundador da Black Influence (Divulgação)

O movimento Black Lives Matter (“Vidas Negras Importam”) ganhou força com os protestos e grandes players do mercado da comunicação estão se posicionando. Para Ricardo Silvestre, fundador da Black Influence, agência que conecta empresas a consumidores através de influenciadores negros ou periféricos, as marcas precisam entender sobre a problemática que é se apropriar de uma causa como esta. Geralmente, a empresa não apoia esse tipo de movimento com “atitudes concretas” ao longo do ano. “O próprio consumidor muitas vezes é quem vai alertá-la sobre isso nas redes sociais e inevitavelmente criar uma situação embaraçosa, e que poderia ter sido evitada”, alerta.

Para o especialista, essas empresas fazem parte do processo de formação de opinião de seus consumidores e por isso têm um papel importante e crucial na sociedade. “Agora mais do que nunca, é necessário se posicionar sobre assuntos que são pauta, mas fazer isso do jeito certo para que não haja qualquer tipo de interpretação errada”, afirma.

“O movimento internacional #BlackLivesMatter não nasceu hoje. Ele é fruto da luta contra a violência, discriminação, brutalidade e desigualdade racial no mundo e não apenas nos Estados Unidos. No Brasil, por exemplo, a comunidade negra segue sendo invisibilizada nas comunicações e propagandas de diversas marcas, que agora aparecem na rede social como apoiadoras da causa. Será que as vidas negras realmente importam?”, questiona.

“Existe também uma necessidade de se posicionar localmente, de acordo com a realidade do país onde a marca está contextualizada. Não basta apenas traduzir o posicionamento global. No Brasil não tínhamos George Floyd. Tínhamos Agatha, João Pedro, Marcos Vinicius, Cleiton, Carlos, Roberto, Wesley, Wilton e tantos outros”, contextualiza o profissional.

Silvia Nascimento, fundadora do portal de notícias Mundo Negro (Divulgação)

Na avaliação de Silvia Nascimento, fundadora do portal de notícias Mundo Negro, as marcas não serão oportunistas quando envolverem a comunidade negra na tomada de decisões sobre essas ações pró-vidas negras e deslocar verba para projetos para esse público. “Só fazer hashtag, mudar logo, compartilhar frases do Martin Luther King, não é eficiente. Quais marcas estão fazendo publicidade com mídia negra e influenciadores negros? Quanto tempo e dinheiro essas marcas investem para mapear e investir em quem realmente está próximo da comunidade negra? Não acho que as empresas brasileiras de hoje tenham sinceridade de realmente querer sentar, conversar ouvir e incluir a comunidade negra em seus projetos”, afirma.

Silvestre também deixa um conselho para as companhias. “O maior e mais valioso conselho que eu deixo para essas empresas é: se aproximem, se associem e acima de tudo contratem e deem oportunidades para iniciativas que já existem com o objetivo de facilitar essa comunicação entre marcas e comunidade. A roda não precisa ser reinventada”, indica.

Luana Génot, diretora-executiva do ID_BR (Divulgação)

Para Luana Génot, diretora-executiva do Instituto Identidades do Brasil (ID_BR), um posicionamento de marca ele deve ser algo contínuo. “O oportunismo é muito associado ao fato de você não ter práticas contínuas em relação a temática. Você só emergir quando o assunto está em voga na mídia, quando virou trending topic. As empresas no Brasil ainda precisam aprender muito a ter um posicionamento contínuo sobre a temática, entendendo que a questão racial no Brasil é crucial”, analisa.

“Costumo dizer que mais do que reagir a um cenário, as empresas precisam agir. O oportunismo vem muito de reações cirúrgicas sobre temas que as empresas querem passar um posicionamento de boazinhas, mas na hora H, que é todo dia, elas sequer têm uma política de promoção da igualdade social, lideranças negras ou tratam o tópico da igualdade racial com prioridade”, comenta Luana.

Veja abaixo algumas das publicações das marcas:

Nike

A Nike fez um vídeo para tomar um lado e incentivar que outras pessoas façam o mesmo. “Desta vez, não faça. Não finja que não há um problema na América”, diz a empresa, que já havia apoiado Colin Kaepernick em 2018. O jogador de futebol-americano ficou famoso ao se ajoelhar durante o hino nacional dos EUA para protestar contra o racismo. Pela primeira vez, a marca transforma o “Just Do It” em “Don’t Do It”. A criação é da Wieden+Kennedy de Portland.

Adidas

A maior rival ratificou o discurso da concorrente dando retweet no vídeo da Nike.

Netflix

Dona de títulos como “Olhos Que Condenam”, que trata justamente do racismo e da violência policial, a Netflix também se posicionou. O perfil brasileiro, inclusive, mencionou nomes de negros brasileiros assassinados pela polícia: David Nascimento, João Pedro e João Vitor. A rede foi questionada.

GloboPlay

Mencionando outras plataformas de streaming, como a própria Netflix, a GloboPlay também demonstrou seu apoio à causa.

Prime Video

A Prime Video da Amazon também se manifestou após a publicação da Netflix.

Disney

A Disney demonstrou apoio aos seus funcionários negros e toda a comunidade negra.

YouTube

O YouTube saiu em solidariedade contra as vítimas do racismo e prometeu doar US$ 1 milhão para a luta contra a injustiça social.

ViacomCBS

A Viacom exaltou seus criadores negros e disse condenar qualquer ato de violência.

Warner Bros.

A Warner Bros. utilizou uma frase do ativista Bryan Stevenson para mostrar seu posicionamento: “alguém precisa ficar de pé quando outros estão sentados. Alguém tem que falar quando outros estão quietos”.

HBO

Assim como outros perfis, a HBO mudou seu nome para #BlackLivesMatter (hashtag que, aliás, ganhou um emoji especial do Twitter). Assim como a Warner, o canal utilizou uma frase para defender seu ponto. Dessa vez, o nome escolhido foi do escritor James Baldwin.

Amazon

A Amazon reiterou que a violência com que o povo negro é tratado nos EUA “precisa parar”. Já o perfil brasileiro retuitou a Netflix e afirmou: “ficar em silêncio é ser cúmplice”.

Spotify

A plataforma de música também ressaltou que agora não é hora de ficar em silêncio.

Cartoon Network Brasil

O Cartoon Network se manifestou sobre os males da violência racial. “Suas vozes e suas histórias importam”, disse a empresa.

TikTok

O TikTok também se manifestou sobre o apoio à comunidade negra.