Excesso de burocracias, poucas empresas comandando o mercado, serviço de atendimento ao consumidor deficiente: por que há tantos consumidores clamando pelo respeito a seus direitos no setor aéreo? A resposta certamente passa pela maneira como este mercado é gerido. Quando cerca de 20 milhões de passageiros são afetados a cada ano por algum tipo de inconveniência na hora de embarcar e desembarcar no Brasil a razão é preciso reconhecer que o sistema de gestão de voos e de atenção aos passageiros que se pratica no país está longe do ideal.

Empresas de tecnologia que atuam no setor auxiliando pessoas comuns a terem seus direitos respeitados não podem ser consideradas como agentes que judicializam determinado mercado, tampouco serem relegadas à condição de “advogados de portão de desembarque”. Essas cenas não existem e só habitam o imaginário de quem está mais preocupado em garantir reservas de mercado para a obtenção de direitos aos passageiros do que em tentar melhorar a aviação civil de verdade no país.

O número de passageiros aéreos que, de alguma forma, sofreram com voos cancelados, remarcados ou atrasados não parou de aumentar nos últimos anos pois o atendimento, o esforço e a vontade para a resolução dos problemas destes consumidores não melhoraram por parte das companhias aéreas. Segundo a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), 17 milhões de passageiros tiveram voos interrompidos por atraso ou cancelamento no Brasil em 2018. E, de lá para cá, a situação tem se agravado ainda mais.

Em 2019, após a falência da Avianca, os preços das passagens aéreas aumentaram em 22,39% em março e abril na comparação com os primeiros meses do ano, quando a companhia aérea colombiana ainda atuava no país. 

O fato de os preços das passagens aéreas serem determinados pelas três maiores companhias que operam no país não dão muitas alternativas aos consumidores e faz com que o Brasil seja o 12º colocado na lista das 43 nações com as passagens aéreas mais caras do mundo, como aponta levantamento realizado pelo sistema Go Euro, que compila e compara os bilhetes de transportes ao redor do mundo.

Essa mesma inflação de preços nas passagens decorrentes da falta de concorrência no setor também abriu as portas para a chegada das low-costs no país, que viram um mercado promissor nos céus brasileiros e em nenhum momento se sentiram ameaçadas pela existência das startups que atuam no setor aéreo em auxílio ao consumidor. Pelo contrário, novas low-costs estão chegando ao Brasil. A mais recente delas é a Nella, que iniciou suas operações no país após o início da pandemia e está sediada no aeroporto internacional de Brasília.

 A comparação com os EUA vale a pena?

Nos EUA, existe o conceito de punitive damages, que está definido na lei do país e pune o réu de ação quando sua conduta reflita um desprezo consciente em relação aos direitos e interesses da pessoa que se sentiu lesada. Caso um júri utilize esta lei para conferir ganho de causa a um passageiro aéreo querelente, o valor da indenização a ser paga pode ser bastante alto.

Entretanto, diferente do caso brasileiro, o número de empresas atuantes no mercado estadunidense é bem maior o que faz com que a maioria das companhias aéreas pensem duas vezes antes de adotarem a mesma ineficiência no atendimento ou no serviço prestado aos consumidores que perpassa ao simples descaso e é o mote principal da judicialização existente no Brasil.

Gabriel Zanette Koehlert é membro da Associação de Defesa dos Direitos dos Passageiros Aéreos (ADDPA).  Possui bacharelado em Direito pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) e é especializado em Gestão de Pessoas e Liderança e Estratégia em Marketing, ambos pelo INSPER-SP. É um dos fundadores da LiberFly e o atual CCO – Chief Commercial Officer da startup.