O consumidor – nós – ganhou em 1994 um CDC – Código de Defesa do Consumidor. Já o cidadão – nós, de novo –, xongas.
Minha sensação é que até a promotoria pública acabou se acostumando ao Estado e esqueceu-se de defender os interesses sociais e individuais. Como quem paga os promotores é o Estado – com o dinheiro dos cidadãos –, essa obrigação de cuidar de nossos interesses perdeu-se pelo caminho. Durante três ou quatro décadas nós ignoramos o Estado, mesmo ele aspirando, arrebatando, confiscando, tomando, vampirizando quase a metade de tudo o que produzíamos e ganhávamos de forma direta e indireta. Homeopaticamente fomos nos acostumando, nem percebendo o aumento da carga tributária e deixando pra lá, achando que era assim mesmo.
Leio, estarrecido, no caderno Cotidiano, da Folha, do dia 10 de março de 2016, que o número de assaltos nos semáforos cresceu 798% de um ano para o outro. E, pasmem, nada a ver com os ladrões! É o gordo, corrupto, incompetente e irresponsável Estado, através de um de seus mais lamentáveis tentáculos, conhecido como Prefeitura/CET, gestão FH. Assaltos todos praticados de forma sofisticada, silenciosa, sem violência e sangue, através de radares.
Durante anos, as pessoas foram orientadas a não parar nos sinais de madrugada para evitar assaltos. De alguma forma, passaram a se comportar dessa maneira. Chegavam aos cruzamentos, com todo o cuidado, davam uma olhadinha e seguiam em frente, temendo o perigo. As que incorporaram esse comportamento no correr dos últimos meses foram assaltadas pelos radares infinitas vezes. Isso é grave, gravíssimo. Mas o pior, cruel, brutal, canalha em todos os sentidos, é a técnica de colocar armadilhas em infinitas ruas e avenidas da cidade de São Paulo. Tirando proveito, covarde e criminosamente, do comportamento natural dos motoristas, após anos e anos de cultura automobilística. E todos – eu disse todos, sem exceção – acabam caindo na arapuca.
A referência da velocidade já é parte integrante das pessoas. E a gestão CET/FH, covarde e criminosamente, repito, muda de um dia para outro os limites de velocidade permitidos. Mesmo lendo nos jornais, ou ouvindo nas rádios, os motoristas vão levar meses ou anos para se acostumarem com as novas regras. E quase todos os dias, quando se dão conta, já passaram com a velocidade de sempre em lugares onde existe um novo limite de velocidade. Onde se plantou uma armadilha.
Parabéns, FH/CET. Vocês conseguiram!
Quebraram todos os recordes de arrecadação através da multiplicação das multas, ainda que de forma covarde, indecorosa, criminosa. E se o consumidor tem como se defender, nós, cidadãos, estamos na roça. Acho que até os próprios promotores esqueceram-se que são cidadãos. E aceitam as multas que levam resignadamente. Em 2015, a técnica das arapucas da Prefeitura de São Paulo revelou-se espetacularmente vitoriosa. Foram 4,3 milhões de multas por excesso de velocidade, 54% a mais do que em 2014. Óbvio, mais óbvio, duzentas vezes óbvio, que não foram os cidadãos motoristas que ficaram mais criminosos em 54%. Foi a covardia criminosa da mudança absurda das regras que produziu esse resultado. Imagino que em algum lugar do passado a gestão pública preocupava-se em ensinar e orientar os cidadãos e só recorria a punições em caráter excepcional.
É para isso, dentre outras coisas, que pagamos o Estado!
Mas hoje, não. Eu, você, nós, todos sem exceção, somos, na cabeça dos gestores públicos, pagos com o nosso dinheiro, criminosos irrecuperáveis, que precisam sangrar até morrer. Ou, perderem o juízo, e acabarem dando umas porradas nos irresponsáveis e sádicos que tomaram conta do Estado. Está mais que na hora de recolocarmos tudo em seu devido lugar. Precisamos, urgentemente, de um novo país, de uma nova democracia; precisamos nos reencontrar com a cidadania perdida. Se é que em algum momento a tivemos, de verdade.
Francisco A. Madia de Souza é consultor de marketing, sócio e presidente da MadiaMundoMarketing