Divulgação

Mais um dia da Consciência Negra se passou, e o tema racismo segue como uma grande sombra – sem que evoluam de maneira significativa as estatísticas de inclusão de negros em cargos de liderança nas 500 maiores empresas, ou que o mercado publicitário realize mudanças efetivas para tornar ambientes de trabalho mais inclusivos e diversos. Patrícia Santos, criadora da EmpregueAfro, consultoria de RH especializada em diversidade étnico-racial, fala que é gritante a falta de representatividade negra nas empresas, em contraste à realidade da sociedade. “A J. Walter Thompson foi a primeira agência que me contatou”. Veja a seguir principais trechos desta entrevista.

O começo
O projeto começou com a minha inquietude, ao ver a falta de candidatos negros nos processos seletivos que eu fazia há 18 anos. Porém, somente em 2005 criei a EmpregueAfro. Nos sete primeiros anos como um projeto, e nos últimos cinco anos nos posicionamos como consultoria. A minha própria vivência em RH, a rotina de processos seletivos e de análise de candidatos foram motivadores para uma ação afirmativa de inclusão, que é a EmpregueAfro. Somos uma consultoria de recursos humanos com foco em diversidade étnico-racial. Fazemos serviços de treinamento sobre a temática, recrutamento, seleção e desenvolvimento de profissionais negros.

Cenário
Ainda não dá para comemorar. Nos últimos dez anos, as estatísticas mudaram muito pouco. De acordo com pesquisa do Instituto Ethos, as estatísticas de representatividade negra em cargos de liderança nas 500 maiores empresas do país, por exemplo, não subiram mais que dois pontos percentuais. Atualmente executivos negros são 4%. Temos muito o que fazer.

Diversidade
A J. Walter Thompson foi a primeira agência que me contatou. Mesmo depois de 12 anos falando para grandes empresas, o mercado publicitário ainda não se atentava para essa questão e a JWT foi pioneira. O problema era a baixa quantidade de profissionais negros no core business da agência. Endereçamos com a criação conjunta do Programa Thompson 20/20 de forma top down, começamos pelo programa de estágio com vagas exclusivas e seleção “às cegas”. Fazemos também, com frequência, treinamentos sobre a temática para toda a agência e ainda desenvolvimento de competências envolvendo todos os profissionais negros contratados por meio de coaching tanto em grupo quanto individual. Depois da JWT, outras nove agências me procuraram. Mas eu só consegui fechar com a Mutato e a iCherry e Mirum, que são do mesmo grupo da JWT. A principal demanda é treinamento interno sobre a temática, hunting e recrutamento. O maior problema nas agências passa, com toda certeza, pelo viés inconsciente, a contratação de iguais e a dificuldade de engajamento interno para conscientização sobre a temática.

Ensino
Nosso pacote de seleção envolve parceria com as áreas de comunicação, RH e toda a liderança para que a marca seja inclusiva, ou seja, vista pelo público de forma a mostrar profissionais negros em vídeos e artes, para assim atrair esse público para os processos seletivos. Assim, recebemos os currículos, em paralelo buscamos profissionais no nosso banco de talentos, entrevistamos as pessoas e enviamos para as empresas-clientes os currículos com um parecer do nosso consultor/headhunter especializado.

Encontro
Eu sempre admirei a Fátima Bernardes (TV Globo). Quando soube que ela estava indo para o entretenimento, acompanhei todos os primeiros programas. E quando vi que havia muitas pautas que valorizam a diversidade, decidi escrever um e-mail para a produção pedindo para contar minha história. E, em abril de 2017, fui, pela primeira vez, participar como personagem. E a Fátima e a direção gostaram e me pediram para ser parceira. Sim, estar na Fátima Bernardes mudou completamente a minha vida! Tenho visto um maior reconhecimento das empresas sobre o meu trabalho e muito carinho das pessoas através das redes sociais. A cada programa, a experiência tem sido fantástica!

Desafios
Temos ainda muito mais trabalho para fazer, temos de reverter as estatísticas, precisamos ter mais negros na liderança principalmente. Hoje, só temos uma CEO negra de uma empresa multinacional (Rachel Maia, na Lacoste Brasil). Precisamos de mais representatividade.

Foco
Por enquanto meu foco é só a questão racial mesmo. Até porque, quando a gente fala de raça, há uma interseccionalidade direta com gênero e pessoas com deficiência, por exemplo.

Publicidade
Ainda existe muito racismo pelos próprios papéis da maioria dos negros como personagens tanto na publicidade, como na dramaturgia. Não tenho nenhuma emissora ainda no meu portfólio de clientes.

Cotas
Acredito que as cotas devem continuar na educação para que haja mais inclusão nas faculdades, e as empresas devem trabalhar com metas de contratação para que possam refletir nossa sociedade brasileira e um mundo mais justo e igualitário para todos.